Opinião

Artigo: Setembro Amarelo

Com a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, temos um primeiro instrumento no Brasil para a prevenção do suicídio em nosso país

Humberto Correa*
postado em 14/09/2019 09:00
Rosto de homem fragmentadoO suicídio é um dos principais problemas de saúde pública atuais e suas repercussões são graves tanto em nível social quanto familiar. Para cada suicídio, pelo menos cinco pessoas são profunda e duradouramente impactadas. Cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio todos os anos no mundo, mais do que todas as mortes provocadas por guerras e homicídios. E mais grave ainda: é a segunda causa de morte entre jovens com idade de 15 e 29 anos. No Brasil, estima-se cerca de 12 mil suicídios a cada ano (número certamente subestimado) com taxas crescentes particularmente em homens jovens onde se observou um aumento de 30% nas últimas duas décadas. Entre os homens, no Brasil, o suicídio é a terceira causa de morte na faixa etária que vai de 15 a 29 anos, seguida dos homicídios e dos acidentes automobilísticos.

Vivemos em um país muito violento!

Sabemos hoje que praticamente 100% dos suicidas têm um transtorno psiquiátrico que, muitas vezes, não fora diagnosticado ou corretamente tratado. O sofrimento causado pela doença psiquiátrica, aliado a outros fatores, pode levar a pessoa a pensar em se matar.

Identificar rapidamente pessoas com transtornos psiquiátricos, principalmente depressão, pessoas que falam em se matar, e sugerir a elas um tratamento adequado, o mais rapidamente possível, é algo que todos podemos e devemos fazer. Pressionar o poder público para estabelecer campanhas e estratégias de prevenção, com um serviço de saúde mental eficaz e acompanhamento efetivo de todas as pessoas que fizerem tentativas graves de suicídio, todos nós devemos fazer. Investir em mais estudos e pesquisas sobre o tema nos permitirá melhor compreendê-lo e prevenir o ato.

O suicídio é, entretanto, cercado de um tabu milenar. Todos nós conhecemos alguém próximo que morreu por suicídio, ou fez uma tentativa grave. A despeito disso, não falamos no assunto, ou o fazemos à boca pequena. É um assunto proibido. Não temos grande cobertura por parte da mídia, que, na maioria dos casos, acredita, erroneamente, que abordar o assunto incentivaria a prática. Falar sobre o tema, de forma repetida exaustiva, quando algum famoso se suicida, não ajuda em nada. Temos que discuti-lo sim, mas de forma tecnicamente correta, evitando sensacionalismos, exercendo o papel social que cabe a todos, na prevenção desse problema.

A prevenção do suicídio não cabe apenas aos médicos, psiquiatras e outros profissionais de saúde. Aliás, médicos e particularmente as médicas, são grupo de risco para suicídio. É uma responsabilidade de toda sociedade: poder público, jornalistas, escolas, igrejas, famílias...

Pensando nisso, desde 2003, a International Association for Suicide Prevention (IASP) em parceria com a Organização Mundial da Saúde (OMS) instituiu a data de 10 de setembro como o Dia Mundial da Prevenção do Suicídio. O objetivo é conscientizar e mobilizar a sociedade para a tomada de ação no enfrentamento a esse problema.

A OMS também convidou seus países membros para uma ação visando à redução do número de suicídios. O Brasil, signatário desse compromisso, viu, entretanto, por falta de políticas públicas minimamente adequadas, suas taxas aumentando nas últimas décadas. Vários países conseguiram construir eficazes estratégias de prevenção do suicídio e reduziram essas mortes. O Brasil não!

Desde 2015, por iniciativa da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Conselho Federal de Medicina (CFM) e Centro de Valorização da Vida (CVV), foi instituído o Setembro Amarelo. Imediatamente, várias entidades se engajaram nessa luta, que se tornou uma campanha da sociedade brasileira. Não temos agora apenas o dia 10 para abordar o tema, mas todo o mês de setembro. Essa campanha, vitoriosa, mobiliza todo o país. Vemos prédios e monumentos iluminados, caminhadas, eventos científicos, discussões em cada um dos 5.570 municípios brasileiros. É a mobilização da sociedade que pressiona o poder público a fazer a sua parte, assumir a sua responsabilidade.

Em 26 de abril de 2019, foi publicada a Lei n; 1.3819 que, finalmente, institui a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, a ser implementada pela União, pelos estados, pelos municípios e pelo Distrito Federal. Uma grande vitória! Temos um primeiro instrumento no Brasil para a efetiva implementação de uma política voltada à prevenção do suicídio em nosso país. Para que não se torne letra morta, devemos manter nossa mobilização pela prevenção do suicídio. O suicídio pode ser prevenido!

*Humberto Correa é presidente da Associação Mineira de Psiquiatria, da Associação Brasileira para o Estudo e Prevenção do Suicídio e da Associação Latino-Americana para a Prevenção do Suicídio

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