Carlos Alberto Wanderley Nobrega*
postado em 27/09/2019 09:00
Há alguns meses, a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) prepara um novo Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto de Santos (PDZ), instrumento que define os parâmetros para a ocupação de diversas áreas do porto organizado e de sua infraestrutura. O PDZ anunciado na semana passada é, como ressalta o próprio texto divulgado, uma versão preliminar do estudo ainda em execução, somente alterando poucos pontos do antigo Plano, de 2006.O PDZ é um instrumento de fundamental importância para a atividade econômica do Brasil ; afinal, por Santos passa aproximadamente um terço das trocas comerciais do país com o exterior ; e de extrema relevância para o desenvolvimento econômico e social da Baixada Santista, que depende do complexo portuário para a criação de empregos.
Santos é o principal terminal portuário do Brasil e da América do Sul, 39; lugar no ranking mundial da Lloyds List, que relaciona os principais portos em movimentação de contêineres com produtos industrializados no comércio internacional. Também é verdade que é o principal exportador do complexo de soja e milho no Brasil. Responde por 20% das exportações de soja e 40% das de milho, com origem principalmente nos Estados de Mato Grosso e Goiás.
Com grande influência territorial e alta diversidade de produtos movimentados, como deverá ser planejado o desenvolvimento futuro do porto? Qual a importância dos principais grupos de carga ; granéis e carga geral em contêineres ; para planejar a configuração futura dos terminais?
O plano mestre é o instrumento que orienta as decisões de investimentos na infraestrutura e as ações estratégicas a serem definidas para o desenvolvimento do porto. O Plano Mestre do Complexo Portuário de Santos, publicado em fevereiro de 2019, prevê um crescimento anual de movimentação de grãos e outros granéis sólidos de 1,5% ao ano até 2035. Isso significa que o volume movimentado passaria de 43 milhões de toneladas em 2018 para 56 milhões em 2035. E esse aumento de produção agrícola teria origem, sobretudo, nas regiões Centro-Norte e Leste do estado do Mato Grosso.
As projeções, entretanto, parecem não considerar uma eventual redução da movimentação desses produtos no porto de Santos, ditada principalmente pela conclusão do asfaltamento da rodovia Cuiabá-Santarém, previsto para 2020. Mesmo com a entrada em operação do novo trecho da Ferrovia Norte-Sul (FNS), a rodovia terá inegável impacto na redução imediata dos custos de transporte de Mato Grosso para os portos do Arco Norte, atualmente 30% inferiores, em média, aos praticados para Santos. E isso, apesar dos altos fretes rodoviários praticados, decorrente das precárias condições da rodovia, com cerca de 200 quilômetros de terra e pontes de madeira em sua extensão.
O sistema portuário tem crescido de forma rápida na Amazônia. Segundo o anuário da Antaq de 2018, o número de terminais marítimos privados na Região Norte passou de três, em 2010, para 10 em 2018, além de contar com outros três terminais públicos. Esse sistema portuário respondeu pela exportação de 17 milhões de toneladas no último ano, ou 12% das exportações nacionais de soja e milho. Isso sem se levar em conta as instalações portuárias do Maranhão, que também se beneficiarão da inauguração do trecho final da Ferrovia Norte-Sul, além de outras ferrovias projetadas, como a Ferrogrão e a Fico, todas atendendo à principal área de produção de grãos no Brasil.
Pesa bastante nessa estratégia de operação, além da redução dos fretes internos, a proximidade maior com o Canal do Panamá para as rotas marítimas com destinos à Ásia. Em contraponto à movimentação de granéis, a previsão é de um crescimento maior para as cargas movimentadas em contêineres em Santos, segundo o mesmo Plano Mestre, ou seja, 2,5% ao ano, em média, até 2035, cerca de 70 milhões de toneladas nesse ano.
O complexo portuário de Santos é o de maior concentração de contêineres no sistema portuário brasileiro. Em 2018, foi responsável por cerca de 38% da movimentação nacional. As cargas movimentadas são, em geral, industrializadas, com maior valor em relação aos granéis. Em 2017, segundo dados do Sistema Comex Stat do Ministério da Economia, as cargas em contêineres representaram cerca de US$ 42 bilhões, 40% do total movimentado em Santos e cerca de 11% do total do comércio exterior brasileiro.
Em 2017, o estado de São Paulo respondeu, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por cerca de 36% do valor bruto da produção industrial brasileira. Cerca de 90% da base industrial do estado situa-se a menos de 200km do porto, o que confere a Santos uma localização privilegiada ante os maiores centros consumidores e produtores de produtos industrializados do País.
O Porto de Santos deve continuar a ter uma pauta diversificada de movimentação de cargas, mantendo a sua característica de instalação portuária de influência nacional. Mas o seu planejamento estratégico deve considerar a concorrência cada vez mais acirrada dos demais portos brasileiros, principalmente do Arco Norte, no escoamento de grãos vegetais produzidos na Região Centro Oeste.
A carga geral, especialmente em contêineres, deve cada vez mais ter participação preponderante na operação do porto. O desenvolvimento industrial de São Paulo e de outros estados ; como Minas e Goiás, por exemplo ; bem como o atendimento às necessidades de consumo dos grandes centros populacionais de sua área de influência dependem, diretamente, de o porto ter uma infraestrutura com capacidade e eficiência operacional para movimentar contêineres e mercadorias industrializadas neles contidas.
*Ex-presidente da Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes (Geipot) e ex-diretor geral da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq)