Opinião

Artigo: Eu, professora

"Eu, professor, felicito os professores que, como eu, buscam constantemente aperfeiçoamentos, valorizam a profissão e vivem a educação"

Júlia Passarinho*
postado em 15/10/2019 04:16

Até bem pouco tempo, tornar-se professor era um caminho escolhido por afirmarmos vocações, dons e encantamento pela tarefa de ensinar ; fosse por tradição familiar, fosse pelo desejo despertado nas lembranças afetivas do período de aluno, fosse por se descobrir professor. Penso que qualquer motivo que tenha para fazer a escolha profissional, hoje, mais do que nunca, é preciso que você, professor, tenha a clareza do porquê de ter-se tornado professor. Por que fez essa opção profissional. Seus porquês é que lhe garantirão manter-se ou não nesse lugar, nessa função.


Sabemos que tudo na vida são escolhas e que elas, sejam quais forem, vão nos exigir uma postura, uma atuação, uma responsabilidade, um fazer profissional sustentável na consciência vocacional. Mas será que essa consciência tem nos sustentado o exercício, a tarefa, a função de ensinar? Com tantas definições para nossa profissão, os modismos que nos impõe, influenciando social e politicamente as ações do bom professor? Ou de um bom facilitador? Ou um bom mediador? Ou um bom educador, estimulador dos protagonistas dos seus processos de educação?

Isso tudo sem falarmos na intensa divulgação de verdadeiros despautérios de violências e desrespeito sofridos pelos professores. É fato que estamos vivendo numa sociedade em que todos nós, famílias e professores, nos defrontamos e lidamos com muitas crianças e jovens que revelam inconsistências de valores éticos, morais, falta de limites e de respeito nas inter-relações sociais, além de imediatismo, intolerância e negação às frustrações presentes no nosso conviver atual.

As famílias sofrem por não saberem ser os adultos e os responsáveis pelos filhos. Os filhos sofrem as angústias de se confirmarem verdadeiros déspotas dos pais. E nós, professores, entramos em sofrimento se não soubermos lidar com esses fatos. Mas é preciso deixar claro que não estou generalizando nem crucificando as famílias. Aliás, cada uma sabe dos seus valores, das suas condições e posicionamentos educacionais com os filhos, e isso não está em julgamento. Refiro-me a fatos notórios com os quais somos invadidos frequentemente. Como também não coloco os professores como vítima dos alunos ou da sociedade.

Sinceramente, fico pensando como seria mais prático, honesto e fiel aos princípios profissionais, se eu, professor, procurasse me manter encantado com minha escolha profissional e assumisse minha função com responsabilidade pelas minhas escolhas; atuasse olhando com respeito para meus alunos, para seus limites; acreditando na capacidade de cada um; na compreensão das suas diferenças, no acolhimento dos seus receios; no estímulo dos seus dons.

Se eu, professor, qualificasse as inter-relações, fortalecendo as competências emocionais e sociais dos meus alunos; se definisse, com eles, os limites necessários do respeito nas relações entre todos; se pudesse suportar as frustrações dos alunos sustentando-os e fortalecendo-os com a aprendizagem possível dessas situações. Se eu, professor, oferecesse o meu melhor e despertasse o melhor deles, daqueles que dependem de mim mesmo sem que eles tenham me escolhido, mas com a consciência de que eu escolhi estar com eles.

Poucas certezas podemos ter na vida. Uma delas, para mim, é a de que ser professor é uma escolha consciente das responsabilidades profissionais e, como tal, poder tomar decisões convicta de que promovemos experiências significativas que substanciarão atitudes transformadoras na construção de uma sociedade mais justa e um mundo mais humanizado.

Eu, professor, felicito os professores que, como eu, buscam constantemente aperfeiçoamentos, valorizam a profissão e vivem a educação.

*Professora e diretora do Instituto Natural de Desenvolvimento Infantil ; Indi

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