postado em 02/11/2019 04:05
Em 1962, a bióloga americana Rachel Carson publicou um livro que mudaria a história do movimentos ambientalista no mundo. Depois de mais de quatro anos de pesquisa sobre os efeitos na saúde das pessoas e no meio ambiente provocados pela utilização do DDT nas lavouras, o barulho provocado pelo livro Primavera Silenciosa provocou a proibição do uso do inseticida, em 1972.
A frenética aprovação do uso de agrotóxicos na atual administração federal tem sido tema de discussão desde o início do ano. Até outubro, foram mais de 380 novas autorizações pelo Ministério da Agricultura. Uma dessas substâncias tem ocupado o noticiário continuamente: o glifosato.
Estudos relacionam o pesticida a depressão, autismo, infertilidade, Alzheimer, Parkinson e a vários tipos de câncer. Em 2015, uma análises da Agência Internacional para Pesquisa sobre Câncer (Iarc) da Organização Mundial da Saúde (OMS) concluiu que o glifosato é ;provavelmente cancerígeno;.
O glifosato é usado em 130 países, e questionado em vários. Nos Estados Unidos, é alvo de milhares de ações judiciais. No ano passado, a Monsanto, a fabricante, foi condenada a pagar US$ 289 milhões ao jardineiro Dewayne Johson e este ano, U$ 80 milhões ao trabalhador Edwin Hardeman, pelo desenvolvimento da doença. Na Europa, o debate avança. A Áustria baniu, a França prometeu proibir até 2020 e a Alemanha, até 2023.
No Brasil, em fevereiro, a Anvisa abriu consulta pública sobre o tema e recebeu mais de quatro mil participações, a maioria contra o uso. No final de agosto, porém, publicou o ato n; 58, que reclassificou a toxicidade dos produtos. Esta semana, a Agência Pública divulgou levantamento que conduziu dando conta de que 93 produtos formulados à base de glifosato tiveram a classificação de toxicidade reduzida. Antes 24 eram considerados extremamente tóxicos. Agora, nenhum. Isso muda as instruções nas embalagens.
O Rio Grande do Sul é o estado com maior taxa de mortalidade relacionada ao câncer, e há grandes chances de isso estar relacionado ao uso de agrotóxicos. Sem assistência para o manuseio, pode piorar. No Brasil, apenas 20% dos produtores rurais recebem assistência técnica e extensão rural, e o orçamento de 2020 prevê corte de 57% para a secretaria que cuida desse trabalho.
Enquanto não adotarmos manejo integrado (rotação de culturas e métodos biológicos para usar pesticidas apenas quando necessário), com assistência e treinamento, interesses econômicos farão crescer o uso de agrotóxicos. Levou uma década para o esforço de Carson culminar na proibição do DDT, em 1972. Em 1974, o glifosato foi sintetizado. Aquela foi uma longa briga. Esta também. Outras virão enquanto para nos alimentar tivermos que envenenar até calar a primavera.