postado em 02/11/2019 04:06
[FOTO1]Finalmente, a semana acaba e as pessoas sextam em torno do happy hour ao fim da tarde. É um começo de noite alegre, música, bebidinha gelada, amigos e felicidade, pois ninguém é plástico. Na mesma sexta-feira, no mesmo horário, quase no mesmo endereço, uma família chega em casa planejando um fim de semana tranquilo, para tomar vinho, enquanto vê filmes na tevê.
Já bem tarde da noite, o destino dos personagens dessas duas situações tem um encontro marcado. A família que queria ver filmes e tomar vinho fica incomodada pelo ruído musical e gargalhadas dos que sextavam, enquanto os alegres da noite têm a alegria interrompida pela visita da polícia, que acaba com a festa. Agora, um terceiro elemento, que não tinha entrado na ciranda, paga a conta da noite. O comerciante, dono do bar da alegria, tem que pagar multa de R$ 25 mil por ter infringido a Lei do Silêncio.
Todos concordam que uma metrópole como Brasília precisa respirar arte e diversão para ter turismo e desenvolvimento; muitos reconhecem que alguns moradores podem ter os direitos prejudicados pelo ruído. Mas o que a totalidade da população precisa saber é que o preço desse equilíbrio de interesses quem está pagando é o comércio e os empreendedores do Distrito Federal. É verdade que parlamentares acreditam que as atuais limitações acabam por coibir a produção musical e a vida cultural da cidade.
Hoje, o Bar Pinella é a vítima da vez e suas proprietárias, investidoras exemplares, sofrem com a inércia de governantes e legisladores. Mas isso não é questão de safra de governos. Há anos diversas administrações vivem e convivem com esse problema que sempre é pago pelos empresários.
Em 2014, o não cumprimento do tratamento acústico foi a razão para fechar o bar Balaio Café. O Instituto Brasília Ambiental (Ibram) multou o bar em R$ 5 mil e proibiu a música mecânica e ao vivo. Houve reincidência e a punição chegou a R$ 20 mil, e as atividades do comércio foram suspensas por completo.
Passaram-se 11 anos, e hoje, em 2019, uma lei que conciliasse interesses de moradores, do desenvolvimento de Brasília e do brutal prejuízo dos empresários do setor de bares e restaurantes ainda não foi resolvida. Tramita um projeto de Lei do Silêncio que pede o socorro de legisladores e assessores governamentais. Existem algumas arestas que o bom senso poderia contornar.
Por exemplo, a definição de ;poluição sonora; e de ;ruído; estão descritas na atual Lei do Silêncio no rol de conceitos relacionados à emissão de sons, mas o termo ;música; não aparece. Com o projeto de lei a ser votado este conceito deverá a ser esclarecido.
Há preciosidades que pretendem controlar até o ruído dos carros que passam em disparada pelas ruas. Pela norma em vigor, são passíveis de fiscalização: obras de construção civil, competições esportivas, espetáculos, festas, eventos de diversão, feiras e mercados. Até o barulho do trânsito pode ser regulado pela Lei do Silêncio.
;Quando o nível de pressão sonora proveniente do tráfego ultrapassar os padrões fixados por esta lei, caberá ao órgão responsável pela via buscar, com a cooperação dos demais órgãos competentes, os meios para controlar o ruído e eliminar o distúrbio;, diz a Lei do Silêncio.
Ao colocar o problema na mesa, tomam-se diversos cuidados, menos os que deveriam proteger o patrimônio dos investidores da alegria das noites e dos que pensam em fazer de Brasília uma metrópole hospitaleira ao turismo adulto e financeiramente generoso. O novo texto é preciso em minudências que interessam apenas aos moradores. Prevê que os níveis de ruídos sejam medidos, alternadamente, dentro do imóvel de quem fez a reclamação e próximo da fonte emissora. No projeto, no entanto, não consta a distância onde será feita a medição. A aferição poderá ser realizada a uma distância de 1,5 metro do ruído.
O projeto vai permitir música ao vivo ou gravada tocada em áreas internas ou externas de bares, restaurantes, cafés e lanchonetes. As penalidades seriam a multa de R$ 200 a R$ 20 mil, interdição parcial ou total do estabelecimento, e cassação do alvará de funcionamento. O grave é que estamos ficando cada vez mais ruidosos. O barulho do trânsito, segundo pesquisas, é o maior vilão.
Se é preciso trocar o silêncio pela alegria, é fundamental ouvir a música da vida em qualquer lugar. Sem a música, a existência não teria nenhum sentido, ensinava Nietzche, até porque, ainda há pessoas que preferem algumas notas que criam dissonâncias na melodia.