Orlando Thomé Cordeiro*
postado em 15/11/2019 04:05
[FOTO1]Hoje se completam 130 anos da proclamação da República. A Constituição de 1891, a primeira do novo regime, no art. 1;, estabelece que ;A Nação brasileira adota como forma de governo, sob o regime representativo, a República Federativa, proclamada a 15 de novembro de 1889, e constitui-se, por união perpétua e indissolúvel das suas antigas Províncias, em Estados Unidos do Brasil;. Essa denominação prevaleceu até 1967, quando passamos a República Federativa do Brasil, sendo mantida na Constituição a partir de 1988 ao definir, no art. 1;, que ;A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal...;.E como as constituições republicanas tratam a autonomia dos municípios? Na de 1891, o art. 68 tem a seguinte redação: ;Os Estados organizar-se-ão de forma que fique assegurada a autonomia dos Municípios em tudo quanto respeite ao seu peculiar interesse;. E na de 1988, o art. 18 prevê que ;A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição;.
Verifica-se que há 128 anos nosso país declara ser uma Federação, além de reafirmar o princípio da autonomia de seus entes administrativos. Porém, a realidade não é bem assim. Temos presenciado, há muitos anos, um cenário em que estados e, principalmente, municípios são cada vez mais dependentes da União. Nesse contexto, o governo enviou ao Senado Federal a PEC 188/2019, também conhecida como ;PEC do Pacto Federativo;, baseada em três eixos: desobrigar, desindexar e desvincular. Vale a pena uma breve análise sobre cada um deles do ponto de vista municipal.
O destaque no primeiro eixo é a possibilidade de os municípios poderem tratar de forma agregada os mínimos estabelecidos para saúde e educação. Sem alterar os percentuais, será permitido a gestores e gestoras administrarem conjuntamente esses limites, podendo compensar gastos de uma área na outra. Considero um avanço, mesmo que ainda aquém da necessidade de eliminarmos de vez a vinculação obrigatória de recursos orçamentários, como tratei no artigo Vinculação de recursos premia má gestão, publicado aqui em 1; de junho. Outra boa medida é o repasse integral para estados e municípios dos valores arrecadados com o salário-educação e acompanhada da autonomia na destinação desses recursos.
O segundo eixo traz como princípio básico a ideia de conferir flexibilidade orçamentária em situações de emergência fiscal, quando será possível desindexar as despesas obrigatórias. De certa forma, aqui se buscam meios de garantir melhores condições para o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal. Afinal, situações emergenciais exigem medidas excepcionais, mas é fundamental serem criados os instrumentos legais que definam alcance ou limites de tais medidas.
No terceiro eixo, a principal medida é permitir a vedação de vinculação de qualquer receita pública a órgão, fundo ou despesa. Atualmente, tal vedação é prevista apenas no caso da receita de impostos. Porém, a alteração proposta não se aplica nos casos de taxas, doações, FPM, FPE e vinculações constitucionais (olha elas aí de novo).
Na justificativa que acompanha a PEC, está escrito: ;Olhando para a sustentabilidade fiscal de longo prazo, o projeto busca um compromisso que o Brasil está firmando para que a geração atual não onere as gerações futuras. Uma das novas medidas propostas, por exemplo, impedirá que leis sejam implementadas sem a devida previsão orçamentária;. Sem dúvida, esse princípio precisa ser cada vez mais valorizado em nosso país.
Por isso, considero sensato estabelecer que, no caso de um município com até 5 mil habitantes, até junho de 2023, não demonstrar uma arrecadação dos impostos municipais correspondente ao mínimo de 10% da receita total, seja incorporado, a partir de 1; de janeiro de 2025, ao município limítrofe com melhor sustentabilidade financeira. Temos hoje 5.570 municípios, dos quais 1.191 (21,38% do total) foram criados a partir de 1989. Assim, é igualmente louvável que a PEC aponte na direção de ampliar as restrições legais para criação de municípios. Por fim, para nos tornarmos uma Federação de verdade, precisamos avançar muito em nosso aprendizado como sociedade, passando a praticar o binômio autonomia-responsabilidade, combinado com o indispensável fortalecimento contínuo do município como principal ente federativo. Afinal, é nas cidades que vivemos.
*Consultor em estratégia