postado em 18/11/2019 04:14
Há dois fortes motivos para defender uma reforma tributária urgente no Brasil: um deles é o fato de a tributação do consumo ser, hoje, ferramenta indutora de atraso; o outro, tão importante quanto, é a busca pela redução da profunda desigualdade que separa ricos e pobres no país. E a raiz do problema não está somente na regressividade dos impostos, que exige mais de quem tem menos. Há outro fator igualmente perverso: quem paga não sabe quanto paga e não sabe que paga. É o que acontece com a tributação do consumo, que responde por mais da metade da receita tributária produzida no país.
Em qualquer lugar do mundo, a tributação do consumo é regressiva. Os impostos que incidem sobre essa base são, em sua maioria, arrecadatórios e a correção dos problemas distributivos fica por conta dos impostos diretos que incidem sobre propriedade e renda. No Brasil, os benefícios que deveriam mitigar o problema da regressividade acabaram por abrir as portas para uma acirrada competição entre os três níveis da Federação, que brigam por espaço na exploração dessa base de tributação; entre os setores produtivos, que disputam entre regalias; e, finalmente, entre os próprios contribuintes de um mesmo setor, que cobram dos governos tratamento que os beneficie em relação aos concorrentes. Disso resultou a inacreditável confusão que tornou a tributação do consumo brasileira possivelmente a pior do mundo.
Se o país está condenado à instabilidade jurídica, ao atraso e à perda de competitividade, isso é, em parte, graças a esse modelo de tributação do consumo que contribui para a criação de uma legião de desempregados e de miseráveis. Diante desse cenário caótico, por que não defender uma reforma ampla que alcance os tributos que possam contribuir com a redução da desigualdade fazendo com que os que mais têm ou mais recebem contribuam mais?
Os motivos são dois. A introdução de uma pauta distributiva pode atrasar a aprovação de uma reforma tributária da base do consumo, com danos maiores e talvez irremediáveis à nossa debilitada economia e para nosso país, já repleto de deformidades. Além disso, a paralisia da economia e a situação financeira dos entes federativos ; com poucas exceções quase sempre provocadas pelas próprias deformações do sistema ; não permitem o luxo do adiamento. Mas defender uma reforma dos impostos que incidam apenas sobre a base do consumo não significa renunciar ao tratamento da questão distributiva, muito pelo contrário.
Durante os anos em que o Brasil mergulhava em problemas, foram gerados dois produtos que hoje permitem encontrar uma solução simples e eficiente: o Cadastro Único, que identifica as famílias de baixa renda que, de outra forma, estariam fora dos radares sociais e uma base informatizada, ampla e sofisticada, que tem como centro a Nota Fiscal Eletrônica.
Com esses dois produtos, é possível identificar os consumidores por faixas de renda, além de ter a exata dimensão do consumo e dos impostos pagos por consumidor, rico ou pobre. Isso permite que os benefícios fiscais, como os que são dados sobre a cesta básica ; que hoje, a pretexto de favorecerem os pobres, privilegiam de fato e em valores absolutos os mais ricos ; sejam concedidos diretamente a quem é de direito. Ironicamente, esses dois produtos fazem do Brasil um dos poucos países onde a experiência da isenção personalizada é possível.
Com a isenção personalizada ; IVA Personalizado ou IBS Personalizado, como sugerem as duas propostas que tramitam no Congresso ; será possível neutralizar a regressividade do novo imposto, devolvendo parte do imposto às camadas mais pobres da população, o que pode ocorrer com a diminuição do volume das renúncias fiscais hoje concedidas. Sem prejuízo para a simplicidade do novo imposto, para sua neutralidade ou qualquer de suas características desejáveis, o IBS Personalizado permitirá saldar parcela da dívida que nossa sociedade tem em relação aos mais pobres. Se uma parcela maior ou menor, isso é questão que ficará aberta para o debate público.