Opinião

Artigo: A hora é agora

Os movimentos de reestruturação econômica ocorridos até este momento ainda carecem de catalisador

Luís Henrique Guimarães*
postado em 11/12/2019 09:00
[FOTO1]É notório o quanto as reformas estruturais que se encaminham são sinal positivo para o Brasil. Elas alavancam expectativas que vinham estranguladas por longo período de irresponsabilidade fiscal e reacendem a possibilidade de investimentos que impulsionem o desenvolvimento econômico, há tempos estagnado. Os avanços significativos representados pelas reformas previdenciária ; depois de longa maturação até sua consequente promulgação no Congresso ; e administrativa ; após os caminhos que ainda têm a percorrer na Câmara e no Senado ; devem ser valorizados.

Os movimentos de reestruturação econômica ocorridos até este momento, entretanto, ainda carecem de catalisador. Ainda falta um dínamo para ativar os benefícios que os ajustes na estrutura das aposentadorias e o novo pacto federativo podem promover de impacto positivo no resgate do crescimento do país.
Por isso é muito importante acionar o senso de urgência para avançar o quanto antes na formatação definitiva da reforma tributária. É ela que vai dar consistência ao alívio que a reestruturação na Previdência oferecerá à máquina pública. Vai ser ela também a sustentação ao equilíbrio de forças para a relação entre União, estados e municípios que o pacto federativo propõe.

Uma reforma que dê sustentação a médio e longo prazo aos desafios fiscais que se avolumam e se desenham no horizonte e que, antes de tudo, ofereça saídas para um sistema que é caótico, cheio de exceções que sufocam estados e municípios, dão força à sonegação e travam o poder de investimento no Brasil.

Os exemplos de uma cadeia de tributação calcada em desorganização, burocracia e falta de transparência que causam distorções e injustiças são fartos. Estudo da E, por exemplo, revela que, desde a Constituição de 1988, já foram editadas mais de 290 mil novas regras envolvendo o sistema de arrecadação brasileiro, em todas as esferas. É algo como 30 modificações por dia, uma a cada 1,3 hora. Não há planejamento e competitividade que deem conta.

Apesar de envolver cálculos, taxas, percentuais e todo um arcabouço contábil e fiscal, a estrutura tributária brasileira, no fim das contas, está longe de parecer uma ciência exata, com critérios subjetivos e pouco transparentes. É preciso perseguir um modelo que preze pela simplificação, pela previsibilidade e a consequente segurança jurídica, tirando a força de casuísmos e, principalmente, da sonegação.

Por falta de regras claras, fiscalização séria e punição contundente, a sonegação representou, apenas em 2018, rombo de R$ 345 bi na arrecadação, de acordo com um cálculo realizado pelo Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz). O cenário exige providências factíveis e sem ilusões simplistas. É preciso responsabilidade e pés no chão, com atenção ao timing e às possibilidades que não podem ser desperdiçadas.

E o momento pós-aprovação da reforma da Previdência e a abertura das discussões referentes ao impacto do novo pacto federativo para dar mais eficiência ao poder público é, de fato, favorável. A tributária é a ponte, o suporte para os avanços estruturais conquistados até aqui. Uma via que garantirá o óbvio, como saber o quanto será gasto para se definir o quanto será necessário arrecadar.

Só a reestruturação da arrecadação vai gerar confiança para o setor privado planejar e investir. São necessários marcos regulatórios transparentes e que gerem segurança para embalarmos em um círculo virtuoso de estabilidade fiscal que, hoje, não é uma realidade no poder público. Estados sofrendo de incapacidade crônica de honrar com seus servidores revelam apenas a ponta de um iceberg. Aproveitar o alívio fiscal que o pacto federativo pode representar é parte do processo, mas mirar no objetivo de acabar com o vale-tudo que impera na atual configuração tributária brasileira é urgente.

Chegamos a um estágio em que o valor das disputas tributárias entre contribuintes (pessoas física e jurídica) e o Estado (União, estados e municípios) chegaram a R$ 5 tri, segundo levantamento dos pesquisadores Breno Vasconcelos, Lorreine Messias e Larissa Longo. Cifra que equivale a 73% do PIB nacional e 14% maior que o valor de mercado de todas as empresas listadas na Bolsa de Valores de São Paulo. Estamos falando de cerca de 300 companhias.

São deturpações visíveis a olho nu, uma gigantesca pirâmide de complexidades que envolve o sistema tributário e suscita questões óbvias: por que o Brasil adota cinco tributos para bens e serviços em vez de um único (IVA), como praticado em o 168 países? Faz sentido a área tributária de uma empresa ser maior que o departamento de marketing ; e como achar racional serem necessárias 1.500 horas anuais de trabalho desse pessoal para o pagamento dos impostos? Os dados acima, da Endeavor Brasil, deixam claro que simplificar é preciso. Só assim aproveitaremos o embalo positivo das reformas destravadas em 2019 para sermos mais produtivos, competitivos e justos.

*Presidente da Raízen

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