Correio Braziliense
postado em 03/01/2020 04:05
Ainda está longe de terminar a novela sobre a definição da prisão após condenação em segunda instância. Para quem não conseguiu acompanhar o vaivém sobre o tema, vale relembrar cada passo a respeito desse assunto, que tem mobilizado a sociedade, os gabinetes e corredores do Congresso Nacional nos últimos dias.O assunto já era discutido no Parlamento antes da fatídica decisão da Suprema Corte, e, depois dela, também foram apresentadas várias propostas para estabelecer a prisão em segunda instância, a exemplo da PEC nº 5, de 2019, do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), que insere o inciso XVI no art. 93 da Constituição Federal, e da PEC 199/2019, do Deputado Alex Manente (Cidadania-SP)
Ainda antes da votação final no Supremo Tribunal Federal (STF), um grupo de 43 senadores entregou um manifesto ao presidente do órgão, Dias Toffoli, manifestando apoio à PEC nº 5, de 2019, numa sinalização clara de que a maioria da Casa era favorável à manutenção do entendimento em vigor desde 2016. O resultado, porém, foi outro, como se sabe.
Após a decisão, que modificou pela terceira vez em 10 anos o entendimento da Corte a respeito do tema, cresceu sobremaneira a pressão da sociedade para que o Parlamento desse uma solução definitiva para a questão. O fato é que a péssima notícia impulsionou a tramitação das matérias sobre o assunto nas duas Casas do Congresso.
Entretanto, no início de novembro, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, se colocou contrário à proposta, pois entendia que era uma afronta ao artigo 5º da Constituição, em razão de ser cláusula pétrea, e sua aprovação poderia ter sua constitucionalidade questionada. A alternativa sugerida e construída com apoio do próprio Alcolumbre foi a elaboração de um texto que fizesse alterações no Código de Processo Penal (CPP).
Diante disso, os senadores optaram por sobrestar o andamento da PEC nº 5, e passaram a articular a aprovação do Projeto de Lei do Senado (PLS) 166, de 2018, de autoria do senador Lasier Martins (Podemos-RS). O texto sugerido teve colaborações de vários senadores em sua redação, e também a preciosa cooperação do ministro da Justiça, Sergio Moro, e estava em condições de ser votado em 20 de novembro de 2019. O parecer da senadora Selma Arruda (Podemos-MT) chegou a ser lido na Comissão de Constituição e Justiça CCJ), porém, a oposição pediu vistas da matéria, jogando a votação para a semana seguinte.
No entanto, após reunião ocorrida na casa do presidente do Senado, em 26 de novembro de 2019, uma parte dos líderes das duas Casas decidiu que todos deveriam aguardar a tramitação da PEC 199/2019, de autoria do deputado Alex Manente (Cidadania-SP), que acabava de ser aprovada na CCJC da Câmara.
Como se sabe, o andamento de uma PEC na Câmara dos Deputados tem um procedimento mais lento. Depois da CCJC, ainda é necessária a análise por uma Comissão Especial, que segundo o Regimento Interno da Casa, prevê um prazo de 40 sessões para votação da matéria. É improvável que haja definição nessa Comissão em prazo menor, sem um acordo com a oposição.
Cientes de que isso não passava de uma manobra protelatória, essa maioria de 43 senadores, agora também apoiada por amplas manifestações populares, se articulou novamente, e solicitou à senadora Simone Tebet (MDB-MS), presidente da CCJ, que mantivesse o andamento do PLS 166/2018, que já fazia as devidas inserções sobre o tema no CPP.
Assim, o projeto foi aprovado definitivamente na Comissão de Constituição e Justiça do Senado em 11 de dezembro de 2019 e poderá ser apreciado no Plenário em caso de interposição de recurso, o que ocorrerá. O projeto, portanto, ficou para 2020, e caberá ao presidente do Senado pautá-lo a partir daí.
Restou evidente a incoerência do presidente do Senado ao afirmar que, agora, o melhor caminho seria uma PEC, sendo que, poucos dias antes, ele próprio defendia que fosse feita uma alteração no CPP, e não na Constituição. Se houve, de fato, uma mudança de entendimento, o apoio natural deveria ser dado à PEC 5/2019, que também teria, se fosse o caso, o texto ajustado da mesma forma que a PEC 199/2019.
Não parece lógico optar por uma matéria que ainda terá um longo caminho a percorrer na Câmara, e que depois também tramitará no Senado Federal. Não há qualquer entrave técnico ou jurídico para que as duas propostas avancem concomitantemente. Há um entendimento claro de que elas se complementam, pois, uma alteração na Constituição, certamente também exigiria uma modificação no Código de Processo Penal. O país aguarda, ansioso, as cenas do próximo capítulo dessa novela.
*Cientista Político e Assessor Legislativo
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