Correio Braziliense
postado em 07/01/2020 04:35
Governos dos Estados Unidos, de qualquer presidente, partido ou orientação ideológica, utilizam a mesma fórmula para superar crises internas. Inventam uma crise externa, mandam soldados para o teatro do conflito e induzem jornalistas a produzir reportagens chocantes para serem exibidas no noticiário do horário nobre de televisão, de costa a costa. Ações desse porte reativam o sentimento patriótico, aumentam as vendas de material bélico e melhoram o mercado de trabalho. O fato de massacrar civis é secundário. Ninguém chora a morte dos nativos no Afeganistão ou no Iraque.É política devastadora para muitos países, em especial para os do Oriente Médio. A morte do general Qassem Suleimani, comandante da poderosa Guarda Revolucionária do Irã, vai provocar retaliações que provocarão outras retaliações. Esse é ótimo argumento para venda de material bélico. Hoje, na guerra moderna, militares vão do conforto do lar para o trabalho, acionam seus formidáveis mísseis por controle remoto e retornam a tempo de fazer o dever de casa dos filhos. As vítimas são os civis no país atacado.
Foi o caso de Suleimani. Ele tornou-se alvo de dois mísseis hellfire, com precisão absurda (acertaram apenas dois carros do comboio), o que indica ação planejada de inteligência. Tudo pensado com objetividade e precisão.
Possibilidade de erro igual a zero. O comandante da milícia do Iraque Abu Mahdi Al Muhandis morreu como consequência colateral. Ele estava no veículo objeto do ataque.
Não pretendo discutir a questão do Oriente Médio, assunto complexo que merece a reflexão de especialistas. Pretendo sublinhar essa mania norte-americana de criar problemas fora do país para reforçar a imagem interna. Donald Trump, que não é conhecido por suas sutilezas, está na disputa pela eleição no cargo de presidente dos Estados Unidos. Está no centro de um processo de impeachment, promovido pelos democratas, que deverá ser derrubado pela maioria republicana no Senado. Então, tudo é publicidade. Trump está em todas as manchetes no noticiário norte-americano. É o que ele pretende. A popularidade eleva a possibilidade de vitória na eleição presidencial do próximo novembro.
O conflito com o Irã é assunto para ser solucionado entre Washington, Teerã, lideranças ocidentais, além de China e Rússia. A guerra está logo ali na esquina. O Brasil não possui nenhuma carta para jogar nesse pôquer internacional. Melhor é se recolher à sua própria insignificância e abrir os olhos para perceber suas perdas. A loucura norte-americana ocasiona pesados prejuízos aqui. O preço do barril de petróleo disparou. A gasolina vai alcançar rapidamente o patamar de R$ 5 por litro. A Petrobras não alivia. Comporta-se como qualquer multinacional do setor. Aumenta o preço sem avaliar consequências.
O petróleo brasileiro não é nosso, no sentido de pertencer aos brasileiros. O petróleo é da Petrobras ou de quem comanda a empresa. Ao tempo dos petistas, o petróleo era deles. Enfim, a empresa não transfere para os brasileiros parte de lucro. O jogo é esse. A inflação vai se elevar e naturalmente toda a economia vai sofrer. A Bolsa de Valores, que vinha numa jornada cheia de felicidade, inverteu a tendência. E o dólar, por consequência, disparou. Os índices enlouqueceram.
A economia brasileira é assim. Depende de tantas variáveis não controladas internamente que se torna impossível antever resultados. As previsões dos economistas feitas todas as semanas são dolorosamente superadas pelos fatos. Economistas nem mais enrubescem diante dos sucessivos fracassos. É normal errar. Quem pegar as previsões de janeiro do ano passado e comparar com os resultados de dezembro vai se constranger. Tudo errado. Quase igual ao índice de desacerto das pesquisas de opinião nas vésperas das eleições.
Este é um ano eleitoral. O Congresso, portanto, só deve funcionar efetivamente no primeiro semestre. O segundo será dedicado ao pleito municipal, que prepara a eleição nacional. Etapa importante da política. O governo Bolsonaro prometeu muito e entregou pouco: não houve a privatização de estatais, não ocorreu a abertura da economia, nem a redução dos preços do gás de cozinha. As reformas estão empacadas no Congresso. Sobre a tributária ninguém mais ousa dar uma palavra. O tempo, portanto, será muito curto para que o governo apresente resultados. A vantagem do presidente da República é que ele governa sem partidos. Ninguém poderá dizer que ele ganhou ou perdeu a eleição. Também nesse setor não há previsão. Tudo é nebuloso.
*Jornalista
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