Opinião

Artigo: Para as vítimas de Auschwitz

''É inadmissível que cidadãos de uma nação que se julga democrática, ainda mais autoridades, adotem discursos de nazistas para tentarem legitimar suas próprias políticas''

Gábor Hirsch, Halina Birenbaum, Eva Mozes Kor (in menorian) e tantos outros judeus submetidos ao pior dos pesadelos. Esse artigo é uma humilde homenagem a vocês. Que o apito dos trens apinhados de seres humanos transportados como animais nunca mais volte a soar. Que o desembarque em Auschwitz e a separação permanente de pais e filhos não se repita. Que os “banhos quentes” na câmara de gás fiquem relegados a um passado que jamais deveria ter existido. Que as pilhas de corpos esqueléticos, prontos a serem incinerados, permaneçam na memória coletiva da humanidade como um sinal de alerta sobre os perigos do fanatismo e das ideologias totalitárias.

A Gábor, Birenbaum, Kor e milhões de judeus dizimados nas décadas de 1930 e 1940, o meu profundo lamento e minha solidariedade. Mas, também, a minha absoluta vergonha. É inadmissível que cidadãos de uma nação que se julga democrática, ainda mais autoridades, adotem discursos de nazistas para tentarem legitimar suas próprias políticas. É inconcebível que qualquer pessoa, ainda mais uma com status de ministro, encene o pronunciamento de Paul Joseph Goebbels, arquiteto da ideologia nazista e braço-direito de Adolf Hitler. E transmita esse material por meio das redes sociais como se fosse algo natural.

Conversei com Gábor, com Halina e com Eva em 2015. Na condição de jornalista, é importante manter um certo distanciamento psicológico do tema abordado. Confesso que, ao receber os testemunhos dos sobreviventes do campo de extermínio de Auschwitz, me emocionei e tentei divisar o que aquelas pessoas enfrentaram nas mãos de carrascos que tentavam impor uma raça superior e branca. Um deles me contou que os prisioneiros disputaram um pedaço de maçã boiando no esgoto como se fosse uma tábua de sobrevivência. Outro disse que os pais foram enviados à câmara de gás assim que desembarcaram em Auschwitz.

Os horrores de Auschwitz e do nazismo precisam servir de alerta à humanidade. Qualquer tentativa de justificar ou de minimizar o gesto do agora ex-secretário especial de Cultura é absolutamente deplorável, assim como a remissão a Goebbels se revela indefensável. Não há espaço para ideias totalitárias, supremacistas e racistas na sociedade moderna. Devemos isso à nossa própria sanidade e à memória daqueles que foram exterminados por serem quem um regime assassino não queria que fossem. Que a tolerância, o respeito e o amor se sobreponham ao racismo, ao descarte da vida e ao ódio. Que Adolf Hitler, Joseph Goebbels e seus asseclas carrascos pereçam eternamente no desprezo da humanidade. E a democracia não seja contaminada pelo projeto ideológico ou religioso disfarçado em líderes que se julgam acima do bem e do mal.