Opinião

Labirinto

Correio Braziliense
postado em 04/02/2020 04:08


A crise que alcançou o deputado Onyx Lorenzoni é exemplo perfeito e acabado da maneira de agir do presidente Jair Bolsonaro. Sua ação não guarda apenas orientações extremadas no campo das relações internacionais, das questões de gênero e no assunto do meio ambiente. Ele governa com o sólido apoio de seus filhos. Eles determinam as ações, fazem a ponte com o guru da Virgínia, Olavo de Carvalho, e mobilizam as redes sociais. Não há um projeto de governo. Há uma busca incessante e determinada de conseguir chegar às eleições de 2022 em posição de vencer. Se possível, no primeiro turno.

Esse é o plano de governo. O resto é circunstância, improviso da mão para a boca. Nesta situação os militares estão aproveitando bem a janela de oportunidade. Foi o setor que recebeu do governo a maior fatia dos investimentos governamentais. Até uma pequena empresa da Marinha, chamada Engepron, recebeu recursos para construir as novas fragatas de patrulha das costas brasileiras. Aliás, o plano de vender estatais está quase parado. É uma quimera. Somente subsidiárias da Petrobras foram vendidas. O dinheiro obtido com essas operações foi para o caixa da petroleira brasileira. Além disso, foram leiloadas duas residências oficiais em Brasília.

A maneira de agir do presidente Bolsonaro encontrou uma dificuldade inesperada. O garoto João Vicente Sabatini fez arte. Utilizou avião da FAB para viajar de Davos a Índia. Foi demitido. E ato continuo, nomeado para outro posto na Casa Civil. Tudo feito à revelia de Onyx Lorenzoni, um veterinário gaúcho, com cinco mandatos na Câmara dos Deputados, que estava de férias nos Estados Unidos. Ele, no entanto, apostou em Bolsonaro quando o candidato não impunha nenhum respeito. Comprou ações na baixa e lucrou na alta. Virou chefe da Casa Civil, mas não demonstrou capacitação adequada para negociar com parlamentares. Perdeu prestigio e se aquietou num canto do poder.

Na realidade, os filhos de Bolsonaro mandam na Casa Civil e na área de comunicação do governo federal. O demite-não-demite do ministro voador resultou do confronto entre dois conceitos. Os filhos queriam manter o amigo dentro do governo. O pai, pressionado pelas redes sociais, precisou dar uma resposta efetiva. Confrontos deste quilate são dolorosos. O poder familiar está sob fogo cerrado. Os militares não gostam do governo familiar. Os políticos também não. E o presidente foi obrigado pelas circunstâncias a entronizar Regina Duarte no cargo de secretária de Cultura. E, mais: entregar ao vice-presidente Hamilton Mourão a presidência de um Conselho da Amazônia, cuja abrangência ainda não foi determinada.

Mourão, que possui largo conhecimento da Amazônia e boas relações no mundo diplomático, além de falar inglês e espanhol com naturalidade, vai dominar área importante do governo. O ministro Ricardo Salles deve perder protagonismo. Mourão é indemissível. Regina Duarte, é quase indemissível, por ser figura ilustre, que chega ao governo blindada pelo apoio da classe cultural. Mexer nela será sempre meter a mão em vespeiro. Essa modificação na equipe de governo já demonstrava uma rearrumação no poder. Os mais recentes acontecimentos na Esplanada dos Ministérios são autoexplicativos.

Abraham Weintraub, que trabalhava com Onyx Lorenzoni, é o ministro da Educação mais atrapalhado dentre os muitos que já ocuparam aquela pasta. Seus erros, de português e de gestão, são tão escandalosos que, como diria Nelson Rodrigues, têm o poder de fazer corar frade de pedra. Ele perturba a normalidade do governo, cria turbulência e tumultua sua própria administração. O presidente da Câmara Rodrigo Maia afirmou que ele compromete o futuro da juventude brasileira. Acusação pesada. E, pior, verdadeira. Ele vai cair, cedo ou tarde.

A questão é saber se Onyx Lorenzoni será seu sucessor. Não é a especialidade do deputado gaúcho. A bancada ligada ao pessoal da educação no Congresso prefere o senador Izalci Lucas, que é do ramo e trabalha para criar a legenda Aliança pelo Brasil no Distrito Federal. Seu suplente é um dos poderosos no novo partido. Bolsonaro está preso por suas circunstâncias: os filhos, os religiosos, as redes sociais e o combate aos potenciais candidatos à Presidência da República nas próximas eleições. Esse é o labirinto que envolve o presidente. As circunstâncias são mais fortes do que sua vontade. Empurram o governo para direções inesperadas. Viver é muito perigoso. E na política brasileira, ainda mais.

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