Opinião

Descaso com a vida

Correio Braziliense
postado em 06/02/2020 04:13
Percorrer as estradas brasileiras é participar, involuntariamente, de uma roleta-russa. Rodovias simples, mal sinalizadas, esburacadas e sem acostamento exigem do condutor mais do que habilidade e responsabilidade para dirigir o veículo. É preciso contar com a sorte em fatores imprevisíveis: não pode furar um pneu; chuva e neblina fortes? Nem pensar! O motorista também não tem o direito à fadiga, pois não há pontos de acolhimento onde possa descansar em segurança.

A BR-381, por exemplo, que liga Belo Horizonte ao Espírito Santo e também conduz, até certo ponto, os viajantes com destino à Bahia, é uma aberração! Há um quarto de século, quando passei por lá a caminho de Vitória (ES), fiquei impressionada com a quantidade de acidentes com carros de passeio, ônibus e caminhões. Recentemente refiz parte do trecho. Só não continua tudo igual porque, em alguns pontos, a rodovia está em fase de duplicação.

O relato de um grupo de mineiros que vive em Teófilo Otoni e depende da rodovia para chegar à capital mineira é desolador. “Todo dia tem acidente, com ou sem morte. Quem conhece não pega aquela rodovia sem um estoque de água e comida. A gente sabe a hora que sai, mas quando chega, só Deus! Perdi inúmeros amigos ali”, relatou um deles ao ver o meu espanto com o perigo do trajeto.

Os túneis inaugurados no ano passado na região de Antônio Dias têm faixa única e uma pequena área de recuo no meio. É desafiador imaginar como o socorro chegaria ali em caso de acidente. A promessa é de modernização e duplicação dos demais trechos da  BR-381 por processo a ser realizado por meio do programa de concessão do Governo Federal, capitaneado pelo Ministério da Infraestrutura.

Como essa rodovia, existem inúmeras outras que, diariamente, roubam vidas, sonhos, semeiam dor e solidão. Levantamento da Confederação Nacional dos Transportes de 2019 revelou aumento de 75% dos pontos críticos das estradas brasileiras. De 454, em 2018, para 797 em 2019.

Para além disso, o Estado contabiliza os gastos com mortos, feridos e sequelados que caem no Sistema Único de Saúde (SUS) ou necessitam de amparo da previdência social. Mas se mostra incapaz de gerenciar as rodovias que cortam o país tornando-as seguras para a circulação de gente e de carga.
 
 



Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Tags