Correio Braziliense
postado em 14/03/2020 04:14
Acompanhei, durante a semana, muitos comentários sobre a trans que causou comoção no país porque não recebia visitas na prisão, nem mesmo da família, havia oito anos. Creditava-se a solidão dela ao preconceito, pela identidade de gênero. Internautas, então, organizaram vaquinhas virtuais e enviaram cartas às centenas para a detenta. Até que veio à tona o motivo de ela estar atrás das grades: estuprou e matou um menino de 9 anos, em São Paulo. Também tentou estuprar um sobrinho, de 5.
Após a revelação, a revolta tomou conta das redes sociais. A empatia deu lugar à repulsa. Uma reação natural, totalmente pertinente. Mas o impressionante é que essas pessoas foram criticadas. Anônimos e famosos citaram falta de humanidade, de compaixão, de piedade. Houve quem conclamasse os indignados a evoluírem.
Um grupo numa rede social postou que a condenada está cumprindo sua pena “sem necessidade de linchamento ou julgamento virtual”. A preocupação é com o linchamento virtual de alguém que trucidou uma criança na vida real? Vi também um tuíte afirmando ter ficado “evidente” que o problema não era o crime, mas o fato de a detenta ser uma travesti. Meu Deus. Isso, sim, é falta de humanidade. Como é que alguém pode usar um argumento desse? Não vou negar o óbvio sobre o preconceito, porém a grita geral foi, sim, por causa da barbárie. Não podemos perder de vista quem é realmente a vítima nesse caso hediondo. É de uma torpeza sem limites minimizar atrocidades, sob que bandeira for.
A própria detenta tentou amenizar a crueldade que cometeu. “Eu sei que errei e muito”, escreveu numa carta. Errou? A gente erra um caminho, um ônibus, uma conta. Há palavras que chegam perto de definir o que ela fez: barbárie, selvageria, monstruosidade, perversidade, abominação, mas “erro” jamais será uma delas. Em outro trecho surreal da carta, disse: “Desde aquele dia, me arrependi e hoje estou aqui pagando tudo que cometi”. Pagando tudo? Nunca pagará, não há como. Não nesta vida.
A cadeia é a única forma de se obter alguma justiça, mas aqui no Brasil nenhum condenado cumpre a totalidade da sentença, tantas são as benesses da nossa legislação “penal”. Em breve, a pedófila e homicida estará nas ruas novamente. E só podemos lamentar nossas leis frouxas.
Ela e todos os algozes de crianças deveriam apodrecer na prisão, como os assassinos de Rhuan Maycon, da menina de Planaltina de Goiás, dos bebês do Plano Piloto e de Vicente Pires — só para citar casos recentes no DF e Entorno. Quem é capaz de atrocidades contra inocentes vulneráveis jamais deveria voltar ao convívio da sociedade. Jamais.
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