Opinião

Visão do Correio: Solidariedade é a ordem

Correio Braziliense
postado em 24/03/2020 04:04
 
Nenhuma corrente é mais forte do que seu elo mais fraco. A regra, ditada pela sabedoria popular, aplica-se a pessoas e sociedades. Em época de novo coronavírus, a lição por ela ensinada deve ser levada às últimas consequências. Quem pode mais ajuda quem pode menos.
 
No plano individual, a pessoa que pode ficar em casa, fique. Trata-se de luxo só acessível à parte da população. Trabalhadores de diferentes áreas precisam deslocar-se para manter o funcionamento de setores indispensáveis à vida urbana. É o caso de profissionais da saúde, segurança, informação, limpeza, transporte público, comércio essencial.
 
Servidores domésticos, como diaristas, quase sempre moram na periferia. Para chegar ao local de trabalho, precisam de ônibus ou metrô — em geral lotados, impossibilitando o distanciamento social. É hora de solidariedade. Por que não dispensá-los temporariamente mantendo a remuneração?
 
Muitos abrem mão dos profissionais e do pagamento. É injusto e cruel. Elos fracos da corrente, eles trabalham num dia para comer no dia seguinte. Não raro no mesmo dia. Sem vínculo empregatício, não contam com as garantias da legislação trabalhista. O ato lembra a abolição da escravatura.
 
Historiadores contam que os senhores das casas grandes expulsaram os moradores das senzalas sem compaixão. Jogaram-nos na rua, deixando-os sem teto, sem roupa e sem comida. Reproduzir o gesto quase um século e meio depois é prova de ignorância das conquistas civilizatórias.
 
O mesmo ocorre com cidadãos cuja renda depende da circulação de pessoas e mercadorias. Protegê-los é proteger a todos. Estado, empresários, famílias e indivíduos têm de colaborar para frear a disseminação do vírus. Se muitos ficarem doentes ao mesmo tempo, o pior dos cenários se concretizará.
Os sistemas de saúde público e privado entrarão em colapso e, como alertou o ministro da Saúde Luis Henrique Mandetta, nem dinheiro, nem seguros, nem ordens judiciais poderão abrir vagas. A catástrofe, ao contrário da Lei Áurea, ceifará a vida de pobres e ricos.

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