Correio Braziliense
postado em 01/05/2020 04:05
Não podia ser mais triste este Dia do Trabalho para quem vem dedicando uma vida ao estudo desse tema. Analisei várias crises de desemprego em nosso país. Na década de setenta, tivemos problemas graves com o choque do petróleo. Nos anos oitenta, amargamos taxas de desocupação assustadoras. Na recessão recente, o desemprego atingiu 14% da força de trabalho.
Nos últimos doze meses houve um recuo. Achei que sairíamos dessa crise com a retomada do crescimento econômico em decorrência das reformas previdenciária e trabalhista e de inúmeras medidas para reequilibrar as finanças públicas e atrair os investimentos produtivos, o que é fundamental para a geração de emprego e trabalho.
Eis que de modo abrupto o mundo foi atingindo por essa terrível pandemia de consequências dramáticas para milhares de famílias. O drama seria suficientemente doloroso se ficasse só no campo da saúde. Mas, ele se torna devastador quando invade o mundo do trabalho. A paralisação de grande parte das atividades econômicas fará o desemprego explodir. Nos Estados Unidos, em três semanas, a taxa de desocupação saltou de 3% para 17%. Foi uma escalada impressionante. No Brasil, desconhecemos o quadro real por falta das principais estatísticas para analisar o mercado de trabalho: o Caged terminou em janeiro e a Pnad está suspensa. Ninguém sabe o que está acontecendo.
O governo brasileiro agiu rapidamente ao aprovar medidas importantes nas áreas econômica e trabalhista. Para os trabalhadores informais, a ajuda de R$ 600,00 mensais está contribuindo para a manutenção parcial da sua renda. No campo do emprego formal, as notícias desta semana indicam que foram assinados mais de quatro milhões de acordos de redução de jornada e salário e de suspensão do contrato de trabalho. O governo estima que tais expedientes têm potencial de salvar cerca de oito milhões de empregos formais. Assim seja. Mesmo com isso, o desemprego deve aumentar muito.
Mais importante do que conhecer a magnitude do estrago da Covid-19 no campo do trabalho é conhecer a sua duração. Será que teremos um 1º de maio normalizado em 2021?
Há sérias dúvidas. A Organização Mundial da Saúde nos diz que a pandemia está longe de acabar. A Organização Panamericana de Saúde (OPAS) adverte que os países terão de conviver com o isolamento por mais dois anos. São prognósticos apavorantes porque exigem o fechamento de grande parte das empresas e a contração do emprego.
Além disso, as duas entidades recomendam que a volta ao trabalho deve ser bem planejada e bem executada para que não seja de curta duração. Isso faz sentido. Apesar dos cuidados tomados, a Alemanha provocou um novo surto da doença ao reativar algumas atividades da economia. O governo teve de recuar. Em Blumenau, igualmente, a reabertura escalonada e gradual de algumas empresas fez dobrar em quinze dias a incidência da Covid-19.
As consequências desses fracassos para o mundo do trabalho são desastrosas. Não podemos ter novos surtos porque as medidas econômicas e trabalhistas correm o risco de perderem a potência pelo esgotamento dos recursos a elas alocados. Numa palavra: não se pode contar com atuais aportes financeiros para o ano de 2021.
Seja qual for o resultado da saída da pandemia, teremos um país superendividado, um povo mais pobre e uma sociedade mais desigual. Mas, busquemos uma luz de esperança: esse cenário poderá ser atenuado com a descoberta de uma medicação eficaz e uma vacina duradoura. Oremos!
* Professor da Universidade de São Paulo e membro da Academia Paulista de Letras. Presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomércio-SP
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