Opinião

Mateus e Malaquias

Correio Braziliense
postado em 11/05/2020 04:41
Claus von Stauffenberg, Henning von Treskow, Erich Fellgiebel e outros militares de alta patente são, hoje, considerados heróis do povo alemão. Em Berlim, há um memorial em homenagem àqueles que fizeram parte do fracassado levante de 1944, que pretendeu dar fim à vida de Hitler e por um ponto final no regime nazista. Quem não foi fuzilado passou por um infame julgamento conduzido por Roland Freisler, um magistrado de estilo histriônico, presidente do denominado Tribunal do Povo. Os condenados ali foram enforcados.

Num salto de 76 anos, e saindo da Europa para a América do Sul, o presidente da República recebe no Palácio do Planalto um torturador confesso, que reconheceu o assassinato de guerrilheiros rendidos no Araguaia — conforme se lê em Mata! - O Major Curió e as Guerrilhas no Araguaia, de Leonêncio Nossa —, mas mantido incólume pela Lei da Anistia. Sebastião Rodrigues de Moura esteve com Jair Bolsonaro e entrou pela porta da frente, como é praxe aos homenageados.

Poderia se dizer que foi um encontro de velhos irmãos em armas, mas, a rigor, os dois representam aquilo que o Exército brasileiro não consegue apagar da sua história: a formação policialesca, a tradição miliciana, de algumas gerações de oficiais. E alguém com mais ignorância do que o recomendado classificou Curió como “herói”.

Com símbolos não se mexe e o panteão dos grandes vultos nacionais deve ser inalcançável, sobretudo, aos acusados de terem cometido crimes contra a humanidade. A qualidade dos heróis apontados pelo atual governo revela que estamos em marcha batida para a desagregação. As domingueiras antidemocráticas e pedintes por um autogolpe não são à toa.

Somente se enganou com o atual presidente aqueles que assim preferiram. Quem exalta a tortura (caiu no esquecimento a citação a Brilhante Ustra na sessão do impeachment de Dilma Rousseff, na Câmara?) faz da humilhação método político (breve lista: Santos Cruz, Bebianno, Mandetta…) e demonstra desprezo e indiferença (“e daí?”, “gripezinha”, “vamos enfrentar o vírus como homens”) por uma legião de pessoas que pode ter lhe dado o voto, em 2018, traz no embornal apenas absurdos e desumanidades.

Sempre que pode, Bolsonaro cita João 8:32 como lema de sua permanente campanha eleitoral. Sugiro que leia Mateus 5:9, 7:2 e Malaquias 4:1.

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