Opinião

A gestão compartilhada dos espaços culturais

Correio Braziliense
postado em 11/05/2020 04:41
Durante 15 meses, o Instituto Bem Cultural (IBC) foi responsável por dar nova vida ao espaço cultural que foi berço da produção artística da cidade. O Espaço Cultural Renato Russo 508 Sul, construção com 12 mil metros quadrados, passou por três grandes reformas. A última terminou em junho de 2018 e, em dezembro, o IBC assumiu após ser selecionado por meio de edital público para a gestão e programação compartilhada com a Secretaria de Cultura e Economia Criativa do DF (Secec), recebendo R$ 800 mil para a missão. O chamamento foi realizado a partir do novo Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (Mrosc), Lei Federal nº 13.019. Os novos espaços — Complexo Cultural de Samambaia e o Complexo Cultural de Planaltina — também tiveram chamamentos no mesmo modelo.

Nesse período, foram realizados 192 espetáculos, 26 eventos e 225 ensaios dos 14 grupos residentes. No total, foram 506 apresentações para mais de 32 mil espectadores. Aproximadamente 80 mil pessoas visitaram nossas 34 exposições. Foram 332 atividades formativas para 3.764 alunos. No total, 123.518 pessoas interagiram intensamente com o Espaço. Realizamos pesquisas todos os meses entrevistando 502 pessoas após os espetáculos. E 77,6% do público ficaram “totalmente satisfeitos”, enquanto 17,2%, “muito satisfeitos”. Ou seja, 94,8% do público aprovaram nossa programação.

A parceria na gestão de espaços culturais entre o terceiro setor e os governos é realidade em diversas cidades do país. Em São Paulo, é utilizada desde 2005 e, atualmente, praticamente todos os espaços são geridos por meio do Contrato de Gestão. As vantagens do Mrosc sob o Contrato de Gestão é a redução da burocracia, que gera elevados custos administrativos, e a forma de relação entre a sociedade civil e o governo. No novo normativo, as entidades são selecionadas por meio de edital e não são meros prestadores de serviços, mas contribuintes efetivos na política cultural.

Em Brasília, as parcerias são utilizadas no Memorial JK e no Clube do Choro, que são espaços de referência de qualidade cultural. Nos demais, a capital enfrenta sérios problemas tanto na manutenção quanto na oferta de programação consistente. O orçamento não está à altura da responsabilidade, e a burocracia dificulta oferecer bons serviços. Falta não só pessoal em quantidade e qualificação adequadas, como capacidade para garantir boa experiência ao público frequentador. Um exemplo simples: o Cine Brasília não dispõe, até hoje, de máquina de cartão para a venda de ingressos.

A nossa gestão frente ao Espaço permitiu não só a utilização do cartão, como a venda antecipada on-line. Os recursos advindos das taxas de uso, mesmo bastante baixas frente ao mercado, viabilizaram compras de equipamentos, manutenção e pequenos reparos. Isso nunca aconteceu antes. Todas as taxas cobradas pela Seec no uso dos equipamentos culturais são depositadas na conta geral do GDF.

Para o caixa do governo, é uma gota no oceano. O espaço cultural opera milagres e evita a deterioração, que acaba gerando o fechamento, reformas que levam anos e milhões de reais. Em um equipamento cultural não é possível desassociar a gestão da programação. Para que bom serviço seja prestado, tudo precisa estar perfeito, dos banheiros limpos à qualidade do que é apresentado.

Após o período da quarentena, a produção cultural exigirá da cidade plena capacidade das instituições, políticas e equipamentos culturais. Agora, devemos aproveitar para planejar e preparar a retomada, utilizando as boas experiências como insumos para estabelecer política de parcerias na gestão cultural do DF.

Voltaremos aos teatros. Afinal, isso também passará.

*Ator e gestor de politícas públicas, é vice-presidente do Instituto Bem Cultural (IBC). Foi coordenador-geral da gestão do Espaço Cultural Renato Russo na 508 Sul 

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