Correio Braziliense
postado em 20/05/2020 04:05
Imagine se 149 aviões Airbus A-318 completamente lotados caíssem em um prazo de dois meses. Em um único dia, duas aeronaves se espatifando. Ou as Torres Gêmeas do World Trade Center desabando seis vezes no mesmo período. Até o momento em que escrevo este texto, em meio a outras mortes, 17.971 brasileiros perderam suas vidas nos últimos 60 dias. Foram arrancados para sempre de seus lares, cônjuges e filhos por um inimigo invisível e poderoso. A pandemia da covid-19 roubou sonhos, planos, amores.
Até agora, a máxima autoridade do país não emitiu nenhuma palavra sincera de luto, de empatia e de comiseração pelo sofrimento e pelo vazio experimentados por milhares de famílias brasileiras. Pelo contrário. De seu séquito, vieram deboche, senso de desconexão com a realidade, fanatismo. Chegaram ao cúmulo de levar caixões reais a protestos no coração do poder, em Brasília. Poucas horas antes de começar a redigir essas linhas, uma rede de TV estampava, como manchete principal em seu site, as manifestações contrárias ao isolamento social e abordavam a participação do presidente, no momento em que os hospitais de algumas regiões do Brasil estão à beira do colapso.
Não bastassem as mortes provocadas pela pandemia e o desrespeito flagrante à Constituição, com gritos contra a separação dos Três Poderes e pela implantação de um “regime militar democrático” no Brasil, parte da claque do presidente elegeu um bode expiatório: a imprensa. Para muitos, que acreditam em fake news vomitadas pelo WhatsApp a torto e a direito, jornalista se transformou em escória. Muitos dos que desejam transformar o País numa teocracia – e basta ver o fervor religioso às portas do Palácio da Alvorada – se satisfazem em ofender a imprensa e a liberdade de expressão.
Como a racionalidade foi engolida pelo fanatismo e pela cegueira ideológica, temo pela integridade física e pela vida de colegas jornalistas. Alguns brasileiros consideram absurda a divulgação de estatísticas sobre a pandemia. Os números elevados de casos e de mortes escancaram a incompetência de um governo que até hoje não anunciou um plano eficaz de prevenção ao novo coronavírus e que prefere apregoar aos quatro cantos que 70% da população brasileira contrairá covid-19.
Em meio à resposta desastrosa contra a pandemia, a uma crise política profunda e de consequências incertas, à recessão econômica inevitável e à falta de empatia de governante e de seus asseclas, o Brasil se transforma em ator pária na comunidade internacional. Vivemos tempos sombrios. O navio não pode ir a pique.
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