Correio Braziliense
postado em 17/06/2020 04:04
Não é difícil de entender o motivo pelo qual as Coreias do Norte e do Sul caminham sobre o fio da navalha. Os ares da Guerra Fria ainda são respiráveis na fronteira. Soma-se a isso o imenso rancor entre os dois países, tecnicamente em guerra há mais de seis décadas. Quando se aproxima do limite entre duas nações tão díspares e tão similares, é possível perceber no ar, apesar do lugar comum, a energia muito mais densa. Foi a partir dali que uma invasão norte-coreana culminou em um conflito que deixou 2 milhões de mortos, separou famílias inteiras e mergulhou o Norte no ostracismo econômico e em um dos regimes mais herméticos do planeta.
Estive em Panmunjom exatos quatro anos atrás. Eu me recordo dos viadutos construídos no meio do nada (serviam de depósitos de explosivos, acionados para o caso de nova invasão); das pontes que não levavam a lugar algum: dos tanques de guerra que pareciam brotar à margem da estrada; das casamatas, onde soldados americanos limpavam, caprichosamente, suas metralhadoras; dos postos de vigilância montados dos dois lados do Rio Imjin. Das conversas com desertores norte-coreanos, que relataram torturas, execuções sumárias, confisco de bens.
Nas últimas horas, o fantasma da década de 1950 tornou a assombrar a Península Coreana. A decisão da ditadura de Kim Jong-un de explodir o escritório utilizado para contatos intercoreanos sugere uma mensagem de ameaça a Seul, apesar da boa vontade do governo do presidente sul-coreano, Moon Jae-in, que chegou a encontrar-se com Kim em Panmunjom, na Zona Desmilitarizada. O ato hostil de Pyongyang pode sinalizar o desejo do regime comunista, um dos únicos de pé no mundo, de implodir a diplomacia e apostar na militarização.
As duas reuniões de cúpula com o presidente americano, Donald Trump, e um terceiro encontro simbólico na DMZ não surtiram efeito prático nenhum. Pareceram mais jogada de marketing do que iniciativa capaz de conduzir a um armistício definitivo, uma desnuclearização do Norte ou um desmantelamento do programa de mísseis de Pyongyang. A reunificação das Coreias é sonho distante, talvez impossível neste momento. Às vésperas do 70º aniversário de eclosão da Guerra da Coreia, os dois vizinhos parecem mais afastados da paz e mais próximos de um novo conflito. Talvez reedição da Guerra Fria, com China e Rússia apoiando o Norte, e Estados Unidos e Europa oferecendo suporte ao Sul.
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