Correio Braziliense
postado em 20/06/2020 08:00
O tempo e as obrigações afastam-nos das pessoas que nos são muito queridas, mas as lembranças e o liame de amizade, admiração e respeito são marcas que carregamos quando nos encontramos no caminho da vida com pessoas de bem e do bem.
Foi assim com o desembargador Waldemir de Oliveiras Lins, homem, sobretudo, imensamente fidalgo, culto, incentivador, isento de paixões, mas extremamente emotivo com os sentimentos, bem intencionado, com visão de gestor público e profundamente humanista.
Esse notável jurista, formado em filosofia pela Universidade Católica e em direito pela Faculdade de Direito do Recife nos anos de 1952 e 1954, ingressou no Ministério Público de Pernambuco por concurso em 1956, no cargo de promotor de justiça. Na carreira que abraçou, chegou ao cargo máximo de procurador-geral de Justiça de 1975 a 1982.
Na trajetória profissional, atuou como auditor fiscal, chefe da Auditoria Fiscal e chefe da Assessoria Jurídica da Secretaria da Fazenda. Em 1986, ingressou no Judiciário Estadual como desembargador na vaga do quinto constitucional do Ministério Público, tendo nessa trajetória ocupado a Vice-Presidência e o cargo de presidente do TJPE em 1996 a 1998. Durante esse tempo, escreveu duas obras, artigos e contos.
Foi nesse momento que me aproximei do desembargador. Havia ele sido eleito presidente do Tribunal de Pernambuco e, no dia da posse solene, fui chamado pelo juiz então aposentado Aluiz Tenório de Brito, ex-presidente e fundador da Amepe e novel secretário-geral Judiciário, para receber a comunicação de que o novo presidente houvera assinado o ato de designação do meu nome para ser juiz assessor especial da presidência junto com o juiz Gabriel Cavalcanti.
No dia seguinte à posse, tivemos uma reunião, e o presidente informou aos assessores, diretores e secretários o seu pensamento voltado para a harmonia do grupo e traçou em linhas gerais o que gostaria de fazer, prezando o bem-estar e crescimento do Judiciário.
Confesso que, mesmo tendo assessorado dois outros presidentes e dois corregedores gerais, mesmo surpreendido, senti-me distinguido com a designação para trabalhar com uma equipe composta de renomados talentos profissionais. Entre eles, estavam nomes como Leovigildo Mota, diretor-geral e respeitável auditor e ex-secretário adjunto da Fazenda, e do seu adjunto, Francisco Granja, também auditor fiscal da Fazenda, Dr. Aluiz Tenório de Brito, ex-presidente da Amepe, Plácido de Oliveira, chefe da Assistência Policial, das procuradoras do estado Consuelo e Suely Barros, respectivamente chefe e adjunta da Consultoria Jurídica, de Flávio Queiroz Cavalcanti, à época, procurador do estado e assessor jurídico da presidência, de Reginaldo Paes Barreto, ex-procurador chefe da então Assistência Judiciária, do procurador do estado José Ventura e do então oficial de gabinete e hoje desembargador do Tribunal Waldemir Tavares de Albuquerque, entre tantos outros que a memória não ajuda devido ao tempo.
Foi uma gestão empreendedora e o presidente mantinha excelente interlocução com o então governador Miguel Arraes e, no contexto político do estado, tudo fluía sem dificuldade, exceto uma ou outra dificuldade interna. Durante a gestão, Waldemir Oliveira Lins deixou um legado de avanços para o Judiciário. Redigiu e aprovou a nova Lei de Custas e Emolumentos, vigente até hoje. Criou o Fundo de compensação do Registro Civil (Ferc), que serve para indenizar os atos gratuitos de cidadania criados pela Constituição sem previsão de pagamento, o que acarretava a inviabilidade da continuação do serviço prestado pelos cartórios do Registro Civil.
Aprovou a lei estadual que resolvia a situação indefinida dos serventuários concursados e nomeados por ato governamental que exerciam funções nos cartórios sem remuneração ou aposentadoria pelo sistema público quando ficaram à deriva após a lei que regulamentou a atividade notarial e registral. Estruturou a Secretaria de Tecnologia da Informação e abriu o primeiro concurso público para analistas e técnicos feito em parceria com o Centro de Formação e Aperfeiçoamento da Polícia Militar para desenvolver o que hoje é a maior conquista de modernidade do Judiciário, a Setic, responsável pelo sucesso da administração de TI do Tribunal que está dando, com os servidores recrutados, o maior exemplo de competência profissional especialmente neste período da pandemia.
Criou e instalou o Juizado Criminal e o Juizado das Relações de Consumo. Estruturou o Colégio Recursal dos Juizados. Criou e instalou a Coordenação de Juizados e expandiu esse sistema de justiça rápida para Petrolina. Aprovou a lei estadual que reestruturou a presidência e os cargos de carreira trazendo a administração da receita judiciária da taxa sobre o serviço notarial e registral para a gestão da presidência do Poder Judiciário, fazendo extinguir dois orçamentos dentro de uma mesma instituição.
Organizou e profissionalizou o sistema de controle e pagamento de precatórios, antes trabalhado de forma artesanal; reformou e construiu prédios de fóruns no interior do estado; promoveu o concurso e o detalhamento do projeto do novo Fórum do Recife, na Joana Bezerra; aproximou o TJPE do Projeto Companheiros das Américas e retomou o intercâmbio com o estado irmão da Geórgia, nos Estados Unidos; realizou mutirões de processos parados em comarcas do sertão que estavam havia anos sem juiz titular; assumiu o governo do estado por mais de uma vez, entre tantas outras realizações que a memória não traz neste momento.
Mas o que mais sobressaía em Waldemir Lins era o bom humor, o lado humanista, sentimental e o amor que dedicava à família e aos amigos. Todas as vezes que viajávamos ao interior do estado, a parada em Pesqueira, sua terra natal, e a visita ao Colégio Cristo Rei, onde estudou, era obrigatória. Lá realizamos encontros de juízes e conhecemos a família e amigos de infância do presidente. Marcou uma época pelo exemplo como todo grande estadista. Combateu o bom combate, Cumpriu a missão e se recolheu à casa de Deus com os méritos de ter feito o bem.
*Presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco
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