Correio Braziliense
postado em 25/06/2020 04:05
A pandemia acelerou mudanças consideradas distantes, frutos de amadurecimento lento e gradual. É o caso do home office, do ensino a distância, do e-commerce, da digitalização bancária, comercial e de serviços. Também impôs revisão de calendários. Eventos programados com muita antecedência precisaram curvar-se à realidade.Servem de exemplo as eleições municipais. Segundo preceito constitucional, o primeiro turno ocorre no primeiro domingo de outubro; o segundo, no último. Assim tem sido desde a promulgação da Carta, em 1988. Com a crise sanitária, porém, ventilou-se a necessidade de adiar o pleito. A decisão sobre a nova data, claro, cabe ao Congresso.
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, mostrou-se sensível à tese. Com uma condição: posterga-se a ida às urnas sem prorrogar mandatos. Nada mais sensato. O argumento tem dupla vantagem. De um lado, leva em conta a saúde da população. De outro, respeita a vontade do eleitor.
Em 2016, quando depositou a confiança neste ou naquele candidato, o cidadão o fez por tempo determinado. Seriam quatro anos. Ampliar o prazo tem nome — estelionato eleitoral. A proposta de emenda à Constituição (PEC) que trata do assunto levou em conta o pacto. O primeiro turno da disputa ocorrerá em 15 de novembro. O segundo, duas semanas depois, no dia 29.
O Senado aprovou a PEC com folga. Na primeira votação, recebeu o sim de 67 dos 81 parlamentares. Na segunda, 64. Com o empurrão para a frente, adia-se a eleição em seis semanas, tempo necessário para reduzir as ocorrências de covid-19. Segundo o relator, Weverton Rocha, a decisão “foi embasada no posicionamento dos especialistas e na orientação da ciência”.
Na Câmara, a situação é diferente. O presidente Rodrigo Maia afirmou que falta apoio para a mudança. Não há clima, segundo ele, nem sequer para pautar a PEC. Há siglas que defendem a manutenção da data. Outras propõem mudança radical: estender os mandatos atuais de prefeitos e vereadores por dois anos. Em 2022, haveria coincidência de eleições — municipais, estaduais e federais. A proposta, apresentada no Senado, recebeu 16 votos favoráveis e 53 contrários.
Espera-se a mesma resposta dos deputados. Oportunismos devem ser rechaçados. Aproveitar a pandemia para impor casuísmos é retrocesso. Como alertou o ministro Barroso, a medida fere cláusula pétrea da Constituição. Manda o bom senso chegar a entendimento para dar tempo de organizar o evento e definir calendários. Não é pouco.
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