postado em 14/05/2008 09:01
Seringueira, amiga de Chico Mendes, reconhecida mundialmente pela defesa da Floresta Amazônica, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, pediu demissão ontem de manhã. Tomou a decisão depois de agüentar seis anos de embates sistemáticos e dezenas de derrotas dentro do governo. O último estresse para ela foi a escolha de Mangabeira Unger, ministro da Secretaria Especial de Planejamento de Longo Prazo, para coordenar o Plano Amazônia Sustentável (PAS). Marina reassumirá nos próximos dias o mandato de senadora, conquistado em 2002 pelo PT do Acre, no lugar do suplente Sibá Machado. Toda a cúpula da pasta entregou o cargo em solidariedade à chefe.
A opção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva por Mangabeira Unger como coordenador do PAS veio a público na semana passada. Marina ficou possessa. Tanto pelo fato em si quanto por terem sido omitidas, na cerimônia de lançamento do programa, realizada na quinta-feira, no palácio, as metas ambientais com que ela e sua equipe haviam equipado o PAS. Fiel ao temperamento ameno, Marina conteve a ira. No fim de semana, porém, resolveu jogar a toalha.
Para o governo, o fato foi consumado de forma surpreendente. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva costuma manter em constante fritura, por longos períodos, os ministros que deseja demitir. Marina, no entanto, montou ela própria o calendário de sua saída. Entregou uma carta ao chefe, listando os motivos que a levaram para fora do governo, e difundiu a informação que pedira demissão em caráter irrevogável. Lula nada podia fazer e não gostou nem um pouco da situação. Tanto que só leu a missiva quando a noite já tinha caído.
Auxiliares próximos da ex-ministra contam que ela tornou-se especialmente irritadiça a partir do embate com o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, em setembro do ano passado. No fim daquele mês, o ministro convocou entrevista coletiva e informou que o zoneamento previsto para a cultura de cana-de-açúcar no ano de 2008 incluiria partes já degradadas da Região Amazônica. ;Ao leste de Roraima há uma área de savana, que hoje é pastagem. Nada impede que se plante cana ali, não está se derrubando mata. A idéia-força é utilizar áreas já desmatadas;, anunciou.
Marina, em seguida, teria procurado a ministra Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil, para buscar apoio contra a medida anunciada por Stephanes. Embora não se tenha informações oficiais a respeito, o que se comenta nos bastidores do governo é que num primeiro momento Dilma se negou a combater ao lado de Marina, baque de que esta jamais se recuperou. O fato, porém, é que em outubro do ano passado, dias depois da entrevista do ministro da Agricultura, as duas defenderam juntas e publicamente a proibição do cultivo de cana na Região Amazônica. Mas Marina começou ali a perder a paciência.
Carta de demissão
A decisão tomada no fim de semana foi comunicada à equipe do Ministério do Meio Ambiente numa reunião logo pela manhã, antes de Bazileu Margarido, presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis(Ibama), ser incumbido de levar a carta de demissão ao Palácio do Planalto. Marina foi direto para o apartamento funcional onde mora, na quadra 309 Sul, e recolheu-se. Não falou com Lula por todo o dia. À noite, ela permaneceu reunida com o secretário-executivo, João Paulo Capobianco, Bazileu Margarido e outros assessores mais próximos.
Junto com Marina, Bazileu Margarido também pediu demissão. Antigo assessor do senador Eduardo Suplicy (PT-SP), ele esteve no centro da polêmica sobre a emissão de licença para a construção das hidrelétricas do Rio Madeira. A saída de Marina implicará mudança de toda a equipe mantida por ela. Outro que deve sair é Capobianco, que acumula o cargo com a presidência do Instituto Chico Mendes. O programa de concessão de florestas, outro projeto de Marina, tocado pelo chefe do Serviço Florestal Brasileiro, Tasso Azevedo, também deve sofrer mudanças com o provável pedido de demissão do assessor.
Além de revelar as entranhas da crise da política ambiental do governo, o pedido de demissão de Marina é um recado ao movimento ambientalista internacional. Em duas semanas, ela seria a principal representante do Brasil na 9ª Conferência das Partes da Convenção da Biodiversidade, em Bonn, Alemanha. Idealizado na Rio 92, o encontro tem um peso significativo de países do Primeiro Mundo e a substituição da ministra-símbolo do movimento ambientalista brasileiro é um claro sinal de que mais importante para o governo são as grandes obras de infra-estrutura do Programa de Aceleração do Crescimento(PAC).