Politica

CPI dos Cemitérios constata que máfia reutiliza caixões

Técnicos da CPI foram à marcenaria em Santa Maria após receberem uma denúncia na semana passada

postado em 27/05/2008 08:46
Um galpão repleto de caixões usados à espera de reparos é mais um indício grave de que no Distrito Federal anda difícil descansar em paz depois da morte. Trinta e duas urnas foram encontradas na tarde de ontem numa marcenaria em Santa Maria prontas para serem restauradas. As marcas de sangue, a serragem, as sobras de algodões indicam que as mesmas foram usadas. Restos de cimento, de tinta e de terra apontam que esses caixões podem ter sido retirados de dentro dos túmulos. A Polícia Civil isolou o lugar e vai abrir um inquérito para investigar o caso.

Os caixões estão no depósito em Santa Maria desde a última sexta-feira. Já era noite, quando duas pessoas chegaram à marcenaria com o carregamento. O material foi deixado na oficina de Jurandir Alves Feitosa, que abriu o estabelecimento com o único objetivo de receber a entrega. Uma denúncia levou integrantes da CPI dos Cemitérios a fazerem uma inspeção na loja. Por volta das 15h, os técnicos chegaram ao local. Cada urna desempilhada tinha um vestígio de suposta irregularidade. Quase todas estavam sujas de sangue. Em algumas delas havia serragem e algodões, produtos usados para a conservação dos corpos. Era possível sentir o cheiro de flores da ornamentação misturado ainda ao formol.

A primeira impressão motivou a CPI a chamar a Polícia Civil. Pouco depois das 16h, três funcionários da 33; Delegacia de Polícia e o delegado de plantão Carlos Augusto Machado Carneiro vistoriaram o lugar. Dali mesmo, o policial decretou a abertura de um inquérito. ;Tudo indica que esses caixões chegaram a ser enterrados e seriam recuperados;, disse Carlos Augusto. Alguns indícios eram aparentes. Determinadas urnas estavam sujas de terra, cimento e tinham gotas de tinta. De acordo com os investigadores, os elementos sugerem que elas já estiveram debaixo da terra. Entre os crimes possíveis, a Polícia Civil trabalha com a hipótese de furto
e de interceptação ilegal.

Proprietário
O dono da marcenaria afirmou aos policiais e técnicos da Câmara Legislativa que na semana passada um representante da funerária Alvorada ; a loja funcionava na 413 Sul e agora atende em Taguatinga ; o procurou para propor o negócio da restauração. A indicação foi feita pelo dono de uma marmoraria vizinha à loja dele. Segundo Jurandir Feitosa, a pessoa que o abordou foi Isnair Moraes Simões Rosa. ;Ele disse que tinha umas urnas para restaurar e eu concordei. Mas não fazia a menor idéia que urna fosse caixão. Se soubesse, não teria aceitado;, alegou o marceneiro.

Um dia depois do carregamento ser deixado na marcenaria de Jurandir, os caixões foram selecionados pelos próprios contratantes entre os reaproveitáveis e os que não tinham mais recuperação. Esses estavam bastante sujos de um líquido marrom escuro e foram colocados no quintal da casa do marceneiro, ao lado da oficina. Uma das preocupações já demonstrada pela Vigilância Sanitária do Distrito Federal é o destino impróprio do lixo orgânico produzido por funerárias e clínicas de tanatopraxia ; técnica usada para a conservação de cadáveres. Se a perícia confirmar que as marcas são referentes a resíduos humanos em decomposição, o material exposto
tem o perigo de contaminação.

A reportagem entrou em contato com Isnair por telefone, mas ele afirmou que não tem nenhum vínculo com a funerária Alvorada. ;Não tenho nada a ver com essa história porque já vendi a empresa;, resumiu. O Correio então procurou a pessoa indicada por Isnair como responsável pela firma, Cléber dos Santos. O empresário confirmou ser o dono da Alvorada e também dos caixões deixados na marcenaria para a reforma. Negou, no entanto, que as urnas tenham sido furtadas. E explicou que as mesmas foram usadas para transporte de cadáveres. ;O pessoal faz muito burburinho onde não tem nada demais. Esses caixões são do meu estoque e tinham pequenas avarias. Como não dá para vender estragado, mandei consertar, mas tenho todas as notas para comprovar que são meus;, garantiu.

A versão do empresário não convenceu o presidente da CPI dos Cemitérios, Rogério Ulysses (PSB). Para o parlamentar é pouco provável que um dono de funerária tenha usado caixões caros para fazer o transporte temporário de cadáveres. ;Quanto mais aprofundamos as apurações, mais descobrimos que neste mercado da morte a mais importante variável é o lucro em detrimento do respeito às pessoas;, avaliou.

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