postado em 10/06/2008 10:02
O governo fechou a estratégia para livrar a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, da acusação de intervenção indevida no processo de venda da Varig para o fundo de investimento norte-americano Matlin Patterson. A linha de defesa é técnica, amparada na lei, sem componentes políticos. A tática foi costurada ontem em reunião, no Palácio do Planalto, com a participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do ministro de Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, além da própria Dilma.
A idéia é reprisar a tese de que a nova Lei de Falências, aprovada pelo Congresso em dezembro de 2004, amparou a operação sem que o comprador fosse obrigado a assumir as dívidas trabalhistas e tributárias da companhia aérea. A lei coube sob medida no caso da Varig.
Dilma disse ao presidente Lula que o juiz Luiz Roberto Ayoub, da 8ª Vara de Falência do Rio de Janeiro, autorizou o negócio. Afirmou ter em mãos uma declaração do magistrado na qual ele demonstraria disposição para ;fazer tudo de novo; se fosse necessário. A ministra ressaltou ainda que as instâncias superiores do Judiciário, como o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ratificaram a decisão de Ayoub. Lula mostrou-se satisfeito com as explicações.
Antes do encontro, ele já havia manifestado a auxiliares contrariedade com a denúncia feita pela ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) Denise Abreu. Tachou a acusação de ;injustiça;. ;Sobre essa injustiça com a Dilma, o governo está tranqüilo e vai prestar esclarecimentos;, declarou o presidente logo depois do término da reunião ministerial, conforme relato do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).
Caberá a Jucá apresentar essa linha de defesa amanhã durante o depoimento de Denise Abreu à Comissão de Infra-Estrutura da Casa. A ex-diretora da Anac acusa Dilma de pressionar a autorização para a venda da Varig em 2006 ao grupo norte-americano e sócios brasileiros. Segundo Denise, Dilma preferiu ignorar possíveis irregularidades na participação estrangeira no negócio e também as dívidas da Varig, que não foram repassadas ao seu novo dono.
A oposição promete concentrar as perguntas a Denise nesses dois pontos. Ciente disso, Romero Jucá pediu à Casa Civil um calhamaço de informações sobre o caso. Quer rebater de maneira técnica às acusações que a ex-diretora da Anac fará aos senadores. O líder do governo mostrará a cronologia da venda da Varig e argumentará que não houve irregularidade na transação. ;Vamos tirar a limpo essa história;, diz. ;Quero discutir em cima de dados, não de remorsos;, ressalta.
Dívida tributária
A venda da Varig, sem o repasse das dívidas ao novo dono, deve acarretar um prejuízo de, pelo menos, R$ 2 bilhões aos cofres públicos. Esse número se refere a impostos que não foram pagos pela companhia à União. Para analistas, como foi vendida apenas a parte boa da companhia, somente com um ;milagre; esse dinheiro será pago ao governo.
O repasse das dívidas para o comprador da Varig era defendido pelo então procurador-geral da Fazenda, Manoel Felipe Brandão. Ele acabou sendo substituído por Luis Inácio Adams, que aprovou o negócio tão defendido pela Casa Civil. Brandão alega que a sua situação no cargo ficou insustentável depois de ter dado um parecer favorável para que a compradora da Varig assumisse as dívidas.
Brandão disse ao Correio que, nas várias reuniões de que participou na Casa Civil, o assunto debatido foi, exclusivamente, as dívidas tributárias. ;Havia uma divergência natural de entendimento. Eu achava que o negócio estava errado e defendi a sucessão da dívida até minha saída do governo. Mantive meu pensamento;, ressaltou Brandão.
Na avaliação dele, o governo estava fazendo seu papel ao acompanhar a venda da empresa que estava praticamente quebrada. ;Não condeno a participação do governo no debate;, afirmou o ex-procurador-geral da Fazenda, acrescentando que até mesmo nos Estados Unidos haveria uma interferência política se existisse a possibilidade de quebra de uma grande empresa.
Já o presidente da Associação dos Pilotos da Varig (Apvar), Elnio Borges, afirma que a dívida trabalhista dos funcionários da companhia aérea chega a R$ 5 bilhões. Desse valor, R$ 1,5 bilhão diz respeito a débitos diretos com os empregados e ex-empregados e os R$ 3,5 bilhões restantes são referentes ao fundo de pensão dos funcionários, o Aeros. ;O objetivo de toda essa discussão é a sucessão trabalhista;, afirma Elnio. Uma decisão do ministro Ari Pargendler, do Superior Tribunal de Justiça, confirmou o entendimento de que o juiz de falências fluminense deveria arbitrar sobre as dívidas trabalhistas. ;Nesses dois anos desde a venda, o grande sucessivo trabalhista, que corria nas varas especializadas, ficou todo nas mãos do juiz Ayoub;, critica Elnio Borges.