postado em 07/09/2008 21:17
No palanque das autoridades presentes à cerimônia de comemoração do Dia da Independência, o assunto predominante nas conversas entre os ministros foi hoje o episódio dos grampos telefônicos supostamente efetuados por espiões da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), ex-funcionários do Serviço Nacional de Informações (SNI) e agentes da Polícia Federal (PF). A notícia recorrente era o depoimento que ex-agente do SNI Francisco Ambrósio do Nascimento, prestou à PF ontem (06).
Mas todas as conversas ficaram só nos cochichos de palanque. Um bem montado esquema pela assessoria da Presidência da República segurou à distância os jornalistas, enquanto os ministros iam embora do evento.
Quando foram liberados, os repórteres só conseguiram alcançar os ministros da Defesa, Nelson Jobim, e do Núcleo de Assuntos Estratégicos (NAE) da Presidência, Mangabeira Unger. Afiados, Jobim e Unger trataram de não colocar lenha na fogueira do episódio.
"Essa questão vai ser resolvida pelo inquérito da Polícia Federal. É um assunto exclusivamente para o inquérito. O ministro da Defesa não tem nada a dizer sobre isso", declarou Jobim, decretando o tema como "encerrado". Ele até tentou mudar o foco, elogiando a presença da presidente da Argentina, Cristina Kirchner, no desfile, mas não obteve sucesso e continuou sendo interpelado sobre o episódio dos grampos. "Não há hipótese de nós fazermos qualquer manifestação. Quem vai resolver isso e esclarecer é o inquérito", disse.
Ontem, a revista "IstoÉ" informou que "o ex-agente da Abin" Ambrósio coordenava as atividades de cooperação da agência na Operação Satiagraha, o que foi contestado pelas autoridades. No mesmo dia, a Abin havia informado que ele nunca pertenceu aos quadros, uma vez que se aposentou em 1998, um ano antes de a Abin ser criada.
Entre os ministros, circularam também informações de que o ex-agente do SNI teria sido contratado diretamente pelo delegado Protógenes Queiroz, chefe da Operação Satiagraha, mas não para executar missões ao lado de servidores legais da Abin, que haviam sido convocados pela PF para ajudá-los. As autoridades esperam que a explicação sobre que ligação tem Ambrósio com a PF seja apresentada nos próximos dias com a divulgação do teor do depoimento prestado ontem.
No palanque, antes de a cerimônia começar, o ministro da Justiça, Tarso Genro, que comanda a PF, conversou bastante com o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Jorge Felix, a quem a Abin é subordinada. O ministro da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, teve uma longa conversa com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, que também conversou com Tarso Genro.
O desfile de 7 de Setembro transcorreu quase sem constrangimentos para os membros do governo. Apenas uma faixa carregada por populares tinha conteúdo embaraçoso e perguntava de modo jocoso: "Na Abin, tem bina?" Bina é o equipamento que identifica chamadas telefônicas. Do outro lado da rua, o aposentado Célio Cândido Alves exibia a faixa da campanha eleitoral de 2006: "Lula 13, de novo com a força do povo."
Tradicionalmente realizado em Brasília, o desfile principal de 7 de Setembro poderá tornar-se um evento itinerante, em diversas cidades. Lula, que gostou de participar da festa nacional da Colômbia, realizada fora de Bogotá, resolveu adotar a idéia. Ele afirmou que é possível que o primeiro desfile itinerante ocorra em Manaus em 2009, contando com a presença do presidente da França, Nicolas Sarkozy.
Em nota, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) se disse surpresa com "uma espectaculosa ação midiática com a finalidade preordenada de desacreditar os delegados da PF".
"Curiosamente, essa estratégia nociva coincide com a investigação daqueles criminosos que sempre se imaginaram acima da lei, protegidos pelo manto da impunidade", diz o comunicado, que também ressalta que a prática de escutas telefônicas clandestinas é crime que é combatido pela categoria.
Numa resposta direta a Mendes, os delegados também refutaram as críticas sobre o modo de atuação em conjunto com procuradores e juízes. "A afirmação de que o combate aos crimes de lavagem de dinheiro desenvolvido entre delegados, juízes e membros do Ministério Público (MP) se equipara a ação de milícias é inaceitável", diz o texto.