postado em 31/12/2008 08:57
Por definição, a incerteza inspira dúvida ou gera diferentes interpretações. Em geral, é provocada por alguma mudança brusca, como uma borrasca no horizonte, por exemplo. Marcado pelo otimismo, 2008 foi um ;feliz ano velho;, para tomar emprestada a expressão cunhada pelo escritor Marcelo Rubens Paiva. Bombou a economia e a vida da maioria das pessoas melhorou.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aproveitou a oportunidade. Manteve o governo na ofensiva política e deixou a oposição à deriva. O resultado das eleições municipais revelou inequívoca vitória da base do governo. Porém, a realidade mudou do primeiro para o segundo turno das eleições. Por mais que o presidente Lula, amparado por ascendentes índices de popularidade, injetasse otimismo na sociedade, a incerteza em relação ao ano-novo tomou conta do mercado e contaminou o ambiente político. A população de baixa renda, porém, manteve a confiança no presidente da República, inabalável mesmo nos momentos dramáticos da crise do mensalão.
A seguir, três temas que ocuparão a agenda do governo em 2009, como a aposta na política do consumo, a atuação do Congresso depois das eleições das mesas diretoras e mais lances da sucessão 2010.
COLABOROU DANIEL PEREIRA
Aposta no consumo
Janeiro começa com o governo Lula implementando medidas anticrise, principalmente a liberação de créditos para bancos, montadoras e construtoras. O mercado trabalha com a expectativa de crescimento na faixa de 2%. A alguns setores mais atingidos pela crise, como a siderurgia e a mineração, chegam a prever 0,5%. Entretanto, o governo não dá bola para as projeções pessimistas. O presidente Lula aposta numa expansão do Produto Interno Bruto (PIB) de 4%. Segundo ele, tem gente que torce a favor da crise, embora o país tenha condições excepcionais para enfrentar a situação mundial, pois dispõe de US$ 207 bilhões em reservas. O Banco Central, porém, prevê 3,2% de crescimento neste ano.
A palavra de ordem de Lula é não ao catastrofismo. ;O primeiro trimestre é o mais delicado. Será o momento de um esforço imenso para não haver desaceleração das coisas. Se as coisas param, recomeçar do zero leva um tempo enorme. As decisões do governo contra a crise não têm limites;, afirma Lula. ;Nem a imprensa nem a oposição nem os especialistas falam em recessão. Não fiquem surpresos se incluirmos novas obras no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).;
O fundamental é manter o consumo das famílias. Esse discurso deu resultados no Natal, quando o povo foi às compras e o comércio se manteve aquecido, atendendo o apelo presidencial. Porém, muitas empresas , principalmente as fábricas de bens de consumo duráveis, entraram o ano em férias coletivas. O medo de Lula é que uma onda de demissões provoque queda de consumo, aumento da inadimplência e deflação, a queda contínua de preços.
As projeções para o começo do ano são sombrias. Além da divulgação de um PIB negativo no último trimestre de 2008, os dois primeiros trimestres de 2009 serão dureza, com aumento do desemprego e queda da renda. Para neutralizar esses efeitos, o governo concentra recursos do PAC nas obras que estão com bom andamento, principalmente as que geram mais empregos, na ampliação dos investimentos nos programas de Saúde e na manutenção dos programas sociais, como o Bolsa Família. Apesar da previsível queda de arrecadação, o governo prevê uma recuperação econômica espetacular no fim de 2009 e em 2010.
Congresso busca rumo
Para o Palácio do Planalto, as incertezas no Congresso serão maiores ou menores dependendo do resultado das eleições para as presidências do Senado e da Câmara. Serão menores se o petista Tião Viana (AC) assumir o comando do Senado. Aliado de primeira hora da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff , Tião é garantia de que Lula não terá surpresas na pauta do Senado. Na Câmara, a eleição do peemedebista Michel Temer (SP) consolidaria o bloco do PT-PMDB, que hoje serve de eixo para a heterogênea base de sustentação política do governo.
Diria o Barão de Itararé, tudo seria fácil se não fossem as dificuldades. A candidatura de Tião já foi atropelada pela resistência da bancada de senadores do PMDB. O atual presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), pleiteia a reeleição. ;Eu pensei que o jogo já estivesse definido, com o Tião e o Temer. Todos ganharíamos com isso;, lamenta Lula. Nove em cada 10 senadores acreditam que o ex-presidente José Sarney é candidatísssimo ao posto, embora tenha negado essa intenção em três conversas com o presidente da República. Sarney ainda não apóia a candidatura de Dilma Rousseff ; prefere o governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), como candidato à sucessão de Lula.
A confusão no Senado complica a eleição na Câmara, onde o deputado Michel Temer pode ser ;cristianizado; por petistas e uma ala do PMDB se não houver acordo entre esses dois partidos para eleição de Viana. ;Não podemos incorrer no mesmo erro do passado, quando o resultado da falta de bom senso foi a eleição do deputado Severino Cavalcanti (PP-PE);, adverte o presidente Lula. Os principais adversários de Temer são Ciro Nogueira (PP-PI), representante do chamado baixo clero, e Aldo Rebelo (PCdoB-SP), candidato do bloquinho de esquerda (PSB-PDT-PCdoB) que apóia a candidatura de Ciro Gomes (PSB) a presidente da República. É que a disputa pelo comando das duas casas tem por pano de fundo a sucessão de 2010.
Reformas
As eleições no Congresso envolvem também o controle das comissões técnicas e comissões especiais de projetos polêmicos. Um deles eleva o grau de incerteza em relação à sucessão de Lula em 2010. É o caso do relatório do deputado João Paulo Cunha (PT-SP), que propõe o fim da reeleição e mandatos de cinco anos para prefeitos, governadores e presidente da República. A oposição acusa o petista de abrir espaço para a emenda do terceiro mandato do presidente Lula. Nos bastidores, fala-se fala num suposto acerto entre Lula, Serra e Aécio a favor do fim da reeleição, mas ninguém confirma. ;Não penso em voltar. O coitado do Juscelino (Kubitschek) pensou que ia voltar e não voltou. Não trabalho com a hipótese absurda que alguns companheiros falam: ;Você sai agora e volta em 2014;,;garante Lula.
Debate da sucessão
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é o garoto-propaganda do governo contra a crise, mas a estrela da atuação para evitar a recessão não será nem o ministro da Fazenda, Guido Mantega, nem o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Será a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que gerencia o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) com mão-de-ferro. Caberá a ela fazer do limão uma limonada. De um lado, capitalizando cada fração de crescimento acima das previsões do mercado e da oposição que o governo conseguir obter em 2009. De outro, utilizando as obras do programa para consolidar as alianças regionais com prefeitos e governadores. Por isso, inclusive, adiar o debate eleitoral fortalece a posição de Dilma.
No campo da oposição, o governador José Serra (PSDB) segue como líder nas pesquisas para 2010. Mas a candidatura não se viabiliza apenas com o controle do PSDB. O governador de Minas, Aécio Neves, permanece na disputa pela vaga, com o argumento de que teria mais condições de atrair o PMDB.
Críticas ao "preconceito"
Ao inaugurar etapa do Parque Dona Lindu ; batizado em homenagem à mãe do presidente ;, no Recife, Lula criticou ações impetradas contra a obra, que custou até agora R$ 29 milhões. ;Se ao invés de um busto de uma retirante, houvesse um busto de uma aristocrata, não teria enfrentado processos.; Lula disse ter decidido fazer a transposição do São Francisco por já ter vivido a seca, e lembrou uma história. ;Uma vez fui buscar água numa jumenta, eu e a Maria Baixinha (a irmã). A jumenta deu uma queda e começou a morder minha barriga. O padrinho deu um corte nela. Já pensou Lulinha ser comido por uma jumenta?;