Politica

Esquenta a briga interna para comandar a Abin

Pelo menos dois grupos ligados à área de inteligência se enfrentam com o objetivo de emplacar o substituto de Paulo Lacerda na agência

postado em 02/01/2009 10:00
A queda do diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Paulo Lacerda, vai trazer à tona uma disputa que já ocorre há pelo menos um mês nos bastidores da corporação: quem substituirá Lacerda? Pelo menos dois grupos articulam politicamente a primazia da escolha que será submetida ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De um lado, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Jorge Félix, a quem a agência é funcionalmente subordinada, e o recém-empossado presidente da Associação dos Servidores da Abin (Asbin), Robson Vignoli. Do outro, pessoas ligadas ao ex-presidente da Asbin Nery Kluwe. O nome escolhido pelo presidente terá se ser aprovado em sabatina no Senado, o que deve ocorrer somente a partir de fevereiro, na volta do recesso parlamentar. Mas as negociações políticas já correm solta. Nos próximos dias, o atual presidente da Asbin tentará marcar um encontro com o ministro Jorge Félix para reforçar o anseio da categoria em escolher alguém ligado diretamente à agência. ;O desejo é de que a cadeira seja ocupada por um oficial de inteligência;, afirma Robson Vignolli. No governo Lula, a Abin já foi comandada pelos delegados Paulo Lacerda, aposentado da Polícia Federal, e Mauro Marcelo, da Polícia Civil paulista. No cargo desde o início do primeiro mandato de Lula, o ministro do GSI, que teve sob seu comando dois dos três chefes ;estrangeiros; da Abin, já apresentou ao Palácio do Planalto três nomes, dos quais duas soluções caseiras. A primeira é Ronaldo Belham, atual chefe da Divisão de Pessoal da Abin. O pai de Belham, José Antonio Nogueira Belham, um dos formuladores da lei que criou a agência, é um general ligado a Jorge Félix. O segundo é Luiz Alberto Salaberry, diretor de Inteligência Estratégica da agência. Ele é próximo a Márcio Buzzanelli, único ex-chefe da Abin no governo Lula oriundo dos próprios quadros, e é bem-visto por Paulo Lacerda. ;Qualquer um dos nomes será uma boa escolha;, avalia Vignolli. Jorge Félix ainda tem um terceiro candidato, que é o atual subchefe de Assuntos Estratégicos do GSI, Macedo Soares. Embaixador de formação, mas que não ocupa há 10 anos um cargo na chancelaria, Soares busca fortalecer seu nome dentro da agência. Ele esteve até na posse de Robson Vignoli no início do mês passado. Satiagraha A indicação de pessoas ligadas à Abin é também compartilhada pelo grupo de Kluwe, derrotado nas eleições internas para a associação, mas fortalecido com a saída de Lacerda ; de quem pediu a cabeça várias vezes nos últimos meses por conta da participação da agência na Operação Satiagraha, da Polícia Federal. Mas as semelhanças param por aí. ;Esses nomes não duram três meses na agência por conta de problemas profissionais e hereditários;, ameaça Kluwe, sem revelar o motivo das restrições desses nomes. Ele agora é diretor de base do Sindicato dos Servidores Públicos Federais do DF. O grupo ligado a Kluwe é simpático à candidatura de Christian Scheneider, atual diretor da Secretaria de Desenvolvimento do Centro-Oeste do Ministério da Integração Nacional. O próprio Schneider, nome já rejeitado pelo ministro do GSI, costura sua candidatura pelo Congresso e pelo Executivo. Em 2006, ele candidatou-se a deputado federal em Brasília pelo PTB e tem o apoio do ministro de Relações Institucionais, o correligionário José Múcio Monteiro. A aposta deles é que a falta de prestígio político de Jorge Félix faça com que o nome de Christian Scheneider emplaque. Ainda há o chefe interino da Abin, Wilson Trezza, com chances remotas de ser efetivado. Os currículos com os cinco nomes já chegaram a ser analisados pelo chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho. Mas o presidente, depois de demorar quatro meses para demitir Lacerda, dando-lhe como prêmio de consolação o cargo de adido policial em Portugal, deve fazer a indicação em breve. Crise de identidade é o problema Além de resolver o impasse político sobre quem vai comandar a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) este ano, o serviço secreto tem o desafio de recuperar sua imagem desgastada com a participação de seus servidores na Operação Satiagraha, deflagrada em julho do ano passado pela Polícia Federal. Acima disso está o tipo de área de inteligência que se pretende desenvolver no país, passados 20 anos de redemocratização e 80 anos da criação do primeiro serviço secreto no país. O esforço é grande para um efetivo de 1,5 mil servidores e um orçamento total de cerca de R$ 350 milhões para 2009 ; igual ao da TV Brasil, a televisão estatal inaugurada pelo governo federal ano passado (veja quadro). Três pilares devem sustentar as discussões sobre o futuro do serviço: 1) sua concepção, se mais ofensiva, como é a da CIA (serviço secreto americano) e com a qual a Abin se simpatiza, ou mais defensiva, como sustentam alguns setores da agência, haja vista a crescente penetração de ONGs estrangeiras em território brasileiro, especialmente na Amazônia, sem o devido monitoramento; 2) a manutenção da ;militarização; do serviço; 3) e, por fim, a permissão legal para poder grampear conversas de suspeitos. Criados pela primeira vez no país em 1927, no governo Washington Luís, os órgãos de inteligência sempre estiveram sob a alçada de militares nos sucessivos governos. Mesmo em 1990, com a extinção pelo presidente Fernando Collor de Mello do Serviço Nacional de Informações (SNI), criado pela ditadura militar, a influência se manteve, seja por vinculação direta seja por laços de parentesco. No governo Lula, o convite ao general Jorge Armando Félix para ser ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), a qual a agência é funcionalmente vinculada, manteve o mesmo padrão adotado anteriormente. Hierarquia Agentes ouvidos nos últimos dias pelo Correio apontam que, com os novos concursos realizados nos últimos 10 anos, e em especial na gestão Lula, o paradigma militar do serviço de inteligência está sendo colocado em xeque. ;Há uma oxigenação e um novo pensamento na comunidade de inteligência surgindo;, afirma um agente com mais de 30 anos de serviço. ;E eles não compactuam com essa mentalidade hierarquizada;, completa. Uma outra discussão permanente é quanto à possibilidade de a agência grampear telefones, um pleito do atual ministro da pasta e de todos os chefes da Abin. Para investigar as ações do arapongas, parlamentares e servidores da agência apontam que o efetivo funcionamento da Comissão de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso (CCAI) poderia dar mais transparência ao setor de inteligência. ;Quanto mais claras forem nossas atribuições, teremos um terreno mais fácil para andar dentro da lei;, observa um outro oficial de inteligência, com 10 anos de casa. (RB) A ESTRUTURA R$ 257,3 milhões estão previstos para o orçamento da Abin na área de inteligência em 2009 47,25% é o aumento dos recursos em relação ao ano passado 1.507 é o número de funcionários efetivos na Agência Fonte: Orçamento-Geral da União

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