postado em 17/03/2009 08:00
Quase meio bilhão de reais na conta das empresas terceirizadas. Tratado com sigilo até hoje, esse foi o montante gasto pelo Senado na locação de mão de obra nos últimos cinco anos, segundo levantamento obtido pelo Correio. Os dados revelam que não houve qualquer preocupação com a redução deste tipo de serviço, que abre brechas para fraudes e tem sido alvo de investigações da Polícia Federal e do Ministério Público. Pelo contrário. O crescimento impressiona. O Senado aumentou em 122% os gastos na contratação de empresas terceirizadas, enquanto a inflação no período atingiu uma média de 28%. Os repasses saltaram de R$ 56 milhões em 2004 para R$ 125 milhões no ano passado. Os pagamentos liberados no período somam R$ 460 milhões.
Nem mesmo a Operação Mão-de-Obra, deflagrada pela PF em 2006 para desmontar uma quadrilha de fraudes em licitações do setor no Senado, intimidou a área administrativa. Desde aquele ano, 29 empresas do ramo fecharam contrato com a Casa. A campeã foi a Ipanema Serviços Gerais, com R$ 82 milhões recebidos no período. Logo atrás, vem a Aval Empresa de Serviços Especializados, com R$ 56 milhões. Em comum, as duas têm como dono o empresário José Carvalho de Araújo, que chegou a ser preso pela PF em 2006.
A Ipanema é acusada de fraudar as concorrências no Senado, enquanto a Aval é suspeita de empregar parentes de servidores, como alternativa para burlar a decisão judicial contra o nepotismo. Em julho do ano passado, a Aval teve um terceiro aditivo aprovado para manter até setembro um contrato de R$ 1,4 milhão mensais. Em 2008, o Senado despejou R$ 20 milhões na conta da empresa. A prorrogação foi assinada pelo então primeiro-secretário, Efraim Morais (DEM-PB). O levantamento dos gastos do Senado inclui toda a gestão de Efraim na Primeira-Secretaria, entre 2005 e 2009, e o último ano, 2004, de Romeu Tuma (PTB-SP). Ao lado do ex-diretor-geral Agaciel Maia, Efraim é suspeito de irregularidades nessas contratações. Eleito em fevereiro para o cargo, o senador Heráclito Fortes (DEM-PI) já pediu uma auditoria nos contratos do Senado. Por enquanto, não deu mais detalhes.
Vigilância
O Senado possui uma Secretaria de Polícia Legislativa, responsável por quatro subsecretarias. Mesmo assim, dobrou a despesa com vigilância terceirizada nos últimos cinco anos. Somente no ano passado, foram gastos R$ 12 milhões. No total, o repasse para esse serviço chega a R$ 40 milhões. E a despesa não vai parar. Na terça-feira passada, a empresa Brava Segurança e Vigilância Patrimonial foi declarada vencedora para fechar um contrato de R$ 2 milhões para vigiar a Secretaria de Informática (Prodasen) e o Interlegis, braço de educação legislativa.
Agora, sabe-se quanto a Casa gasta com terceirização, mas continuam em segredo a quantidade e a lista de funcionários que prestam serviço. O Senado, por exemplo, não aumentou de tamanho no período, nem o número de senadores cresceu, mas o pagamento com terceirização de ;apoio administrativo; triplicou. Os valores chegaram a R$ 95 milhões no ano passado. Está incluída nessa despesa, por exemplo, a contratação de 330 funcionários para a TV Senado. Até o ano passado, a Ipanema recebia pelo serviço. Agora, a Plansul deve assumir após vencer uma licitação com uma proposta de R$ 23,3 milhões anuais. Esse contrato, aliás, tem sido motivo de contestação judicial por parte de quem prestou concurso para 51 vagas efetivas do Senado na área de comunicação no ano passado. Quem ficou de fora reivindica postos destinados à mão-de-obra terceirizada. O Ministério Público já abriu um inquérito para investigar o caso.
Para o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Demostenes Torres (DEM-GO), os gastos com esse tipo de mão-de-obra impressionam. ;Não tinha a menor noção disso. É um negócio escandaloso. É preciso ver cada contrato para saber o que está acontecendo, se o serviço é necessário;, disse. Proporcionalmente, quem mais aumentou dentro do Senado foi a Steel Serviços Auxiliares. O repasse para a empresa cresceu em 137% desde 2004, tendo recebido R$ 5 milhões no ano passado. A reportagem perguntou à Secretaria de Comunicação do Senado sobre o aumento de despesa com terceirização, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.
O apelo de Sarney O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), enviou ontem um e-mail aos servidores pedindo apoio deles para mudanças a serem implantadas na Casa. Em meio a uma crise interna, por causa de denúncias de irregularidades administrativas, Sarney buscou valorizar os funcionários. ;Sempre valorizei os servidores públicos;, disse o senador. ;Para valorizar ainda mais a todos e cada um dos servidores, iniciaremos uma reforma que nos preparará para as novas tecnologias que estão surgindo e modernizará nossa estrutura administrativa;, ressaltou. Sarney refere-se à decisão de controlar eletronicamente a presença dos servidores, após a polêmica do pagamento de hora extra em janeiro, em pleno recesso parlamentar. Ontem, o primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), anunciou a primeira medida em relação a esse assunto. Segundo ele, o controle das horas extras será feito por meio de um registro diário na Secretaria de Recursos Humanos. De acordo com o senador, serão consideradas horas extras as que forem prestadas após as 18h30. No e-mail aos servidores, Sarney ainda ressalta as medidas legislativas tomadas quando assumiu o cargo em fevereiro. ;O mundo é ameaçado no momento por uma gigantesca crise, que também atinge o Brasil. Criei a Comissão Especial para Acompanhamento da Crise Financeira e da Empregabilidade, que já começou a trabalhar;, afirmou. ;Aceitei a Presidência para servir à Casa e tenho absoluta consciência das minhas responsabilidades;, disse. No fim de semana passado, Sarney reuniu-se com assessores para discutir uma reação à crise administrativa, depois da queda de Agaciel Maia da Diretoria-Geral e João Carlos Zoghbi do comando dos Recursos Humanos. O primeiro deixou o cargo depois das denúncias de que teria ocultado uma mansão no Lago Sul avaliada em R$ 5 milhões, enquanto o segundo pediu exoneração após a revelação de que repassou aos filhos um apartamento funcional do Senado. Sarney quer acelerar o acordo para que a Fundação Getúlio Vargas (FGV) faça um estudo sobre a Casa e avalia outras medidas, como criar regras para o uso de apartamentos funcionais. Senadores aconselham Sarney a trocar todos os diretores da Casa, numa estratégia para dar um choque de gestão ao Senado. Leia a carta de Sarney aos servidores Volto à Presidência do Senado Federal com 50 anos de vida pública. Não a desejei, mas atendi ao pedido da maioria dos Senadores. Aceitei a Presidência para servir à Casa e tenho absoluta consciência das minhas responsabilidades. Com minha experiência, e desapegado de ambições futuras, encontro-me pronto para dedicar minhas energias à solução dos principais problemas que vejo na política brasileira. O mais premente deles é a questão da tramitação das Medidas Provisórias, assunto que, em companhia do Presidente da Câmara dos Deputados, já tratei com o Presidente da República e espero que possamos resolver em breve. Também com o Presidente Temer vamos criar uma Comissão Mista para enfrentar e tentar decidir de vez a Reforma Política. Finalmente, faremos tramitar com urgência a Reforma Tributária. O mundo é ameaçado no momento por uma gigantesca crise, que também atinge o Brasil. Criei uma Comissão Especial para Acompanhamento da Crise Financeira e da Empregabilidade, que já começou a trabalhar, e dela esperamos contribuição importante para o País. Essa é, portanto, uma hora de austeridade, e ao Senado cabe dar seu exemplo. Sempre valorizei os servidores públicos. No Senado Federal, acompanho há 38 anos a formação e a evolução de um quadro funcional que reputo dos mais capazes e qualificados do Brasil. Para valorizar ainda mais a todos e cada um dos servidores, iniciaremos uma reforma que nos preparará para as novas tecnologias que estão surgindo e modernizará nossa estrutura administrativa. Confio em que receberei o seu apoio, no esforço que deve ser de todos nós, para enfrentar esses desafios e trabalhar para que o Senado Federal mereça sempre o respeito de todos os brasileiros. Conto, como sempre contei, com o funcionalismo do Senado Federal, a que muito admiro e estimo. José Sarney (PMDB-AP)