postado em 13/04/2009 08:30
O Senado pode ter despejado R$ 13 milhões irregularmente nos últimos três anos em um dos seus maiores contratos de mão de obra terceirizada. A Aval Serviços Especializados Ltda. paga um salário de R$ 884 aos 429 funcionários cedidos, mas recebe do Senado R$ 3,5 mil para manter cada um. Essa diferença de valor é bem maior do que a estabelecida pelo Tribunal de Contas da União (TCU) como limite entre o que é pago pelo órgão público e o repassado ao funcionário da empresa. Chamada de fator k, essa proporção, segundo o TCU, tem de ficar, no máximo, em 2,5. Está em 4 no Senado. ;Quando passa de 2,5, já nos chama muito a atenção, quando ultrapassa 3, indica possibilidade de sobrepreço;, avalia o procurador do TCU, Marinus Marsico.
A Aval começou a prestar serviços ao Senado em 2006 na área de informática, comandada pelo Prodasen. Os R$ 13 milhões referem-se ao que foi pago, de lá para cá, além do limite estabelecido pelo TCU. O Correio teve acesso a esse contrato e à recheada planilha de despesas da empresa no Senado. A folha de pagamento dos funcionários prevista na Casa não passa de R$ 4,5 milhões por ano, quatro vezes menos do que recebe pelo serviço prestado: R$ 18,3 milhões.
O segredo dessa diferença está no item ;insumos;, que inclui despesas alegadas pela empresa para melhorar o rendimento dos funcionários. O Senado paga por isso. O contrato, em vigência até setembro, prevê, entre outras coisas, o pagamento mensal à empresa de R$ 26 por funcionário para treinamento, R$ 57 para fiscalização e R$ 328 para ;despesas administrativas/operacionais;, conforme planilha anexada ao contrato.
Sindicância
A comissão criada pelo primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), analisa o contrato desde a semana passada e quer saber se a empresa usou esse dinheiro para o que foi determinado ou se agiu como a Ipanema Serviços Gerais Ltda. para inflar os valores recebidos do Senado. A Ipanema acabou de perder um contrato de R$ 30 milhões anuais que tinha com a Casa desde 2006 para fornecer 337 funcionários à Secretaria de Comunicação Social. Uma sindicância interna descobriu que R$ 10 reais eram pagos mensalmente por cabeça para um ;treinamento; que não teria sido realizado, além de R$ 1 mil por ano para compra de uniforme, sendo que apenas um terço dos terceirizados o teria usado. A Ipanema também ultrapassou o fator k. Recebia R$ 2,1 milhões mensais e repassava R$ 700 mil aos empregados. O contrato que a substituiu, fechado com a empresa Plansul, é de R$ 7 milhões a menos.
A suspeita sobre a Aval decorre de sua origem. É uma espécie de ;co-irmã; da Ipanema. Um dos diretores da Aval é Alexandre Augusto de Araújo, filho de José Carvalho Araújo, dono da Ipanema, preso em 2006 na Operação Mão de Obra, da Polícia Federal, que desmontou um esquema de fraudes em licitações. Seu filho assina, inclusive, algumas das prorrogações dos contratos da Aval, que tem ainda no seu comando Silvio Carvalho Araújo e Silvio Carvalho Araújo Júnior. Quem assina a primeira planilha de gastos da Aval, usada para ganhar a licitação no Senado em 2006, é Paulo Duarte, que também foi preso na ação da PF naquele mesmo ano.
Explicações são vagas
Procurada, a Aval justificou, por escrito, que o valor do contrato decorre das despesas de obrigações financeiras adicionais, como vale-transporte, auxílio-alimentação, auxílio-funeral, seguro de vida, adicional por tempo de serviço, entre outras. Mas não citou demais ;insumos; incluídos em sua planilha, como treinamentos e fiscalização. A empresa começou o contrato no Senado com 371 funcionários e hoje fornece 429, sendo 15 no período noturno. Os cinco aditivos anexados ao contrato revelam como isso ocorreu. Em 7 de maio do ano passado, por exemplo, foi feita uma correção contratual para diminuir os valores em razão do fim da CPMF meses antes. Em troca, no mesmo documento, a Aval conseguiu emplacar mais 20 funcionários. O acordo foi assinado pelo então primeiro-secretário, Efraim Morais (DEM-PB). Três meses depois, um novo aditivo: aumento dos valores repassados à empresa e também no número de terceirizados: mais 20.
O diretor-geral do Senado, José Alexandre Gazineo, evitou emitir juízo sobre essa prestação de serviço. Avalia que não pode analisar algo que foi assinado pela gestão anterior, de Agaciel Maia. ;Só posso dizer que estamos trabalhando no sentido da economicidade e da eficiência;, disse. Pelo menos 34 contratos de terceirização estão sendo analisados pela comissão instalada por Heráclito Fortes. Somente no ano passado, R$ 125 milhões foram gastos pelo Senado com esse tipo de serviço, um crescimento de 122% desde 2004. Entre os contratos suspeitos está também o da Steel Serviços Auxiliares Ltda., que recebe R$ 6,7 milhões por ano para fornecer funcionários à gráfica do Senado. O contrato acabou sendo dominado por servidores efetivos, que indicam e escolhem quem vai trabalhar na empresa.