Jornal Correio Braziliense

Politica

Entrevista: para Caiado trapalhadas na operação da polícia estimulam debate do financiamento público

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A Operação Castelo de Areia, deflagrada pela Polícia Federal no mês passado, acendeu a luz amarela no Congresso. Ao verem integrantes do DEM, PSDB e PPS citados como recebedores de doações ilegais e tendo de dar explicações até sobre quantias justificadas com notas e comprovantes, parlamentares de diferentes partidos começaram a demonstrar mais boa vontade de buscar um consenso entre algumas das propostas que constam no bolo da reforma política. Encabeçando o grupo, o líder do democratas, Ronaldo Caiado (GO), tem peregrinado pelos corredores do Congresso defendendo a aprovação do financiamento público de campanha e da lista fechada de candidatos. Para ele, somente aprovando os dois itens até setembro deste ano, quando acaba o prazo constitucional para mudar regras eleitorais, será possível afastar do legislativo a onda de denúncias referentes aos gastos de campanha e reduzir o poder da máquina pública na disputa por mandatos eletivos em 2010. Nesta entrevista ao Correio, ele prega com insistência a importância de aprovar essas mudanças e garante que passará os próximos meses fazendo corpo a corpo para tentar conscientizar os relutantes colegas de que as propostas são a saída para a desacreditada política brasileira. A reforma política está há anos na pauta do Congresso. Por que agora é que o senhor encabeçou com tanta dedicação a ideia de aprovar o financiamento público? Primeiro porque nós estamos chegando às vésperas de uma nova eleição e é preciso rever o que não está indo bem. Segundo porque a prática que vem sendo feita em termos de legislação eleitoral se exauriu. Os parlamentares que defendiam o atual sistema perceberam que até quando você cumpre as leis e presta contas corretamente, pode ser atingindo por algo que nada tem a ver com você. Creio que os parlamentares perceberam que mesmo que você entregue o recibo e preste contas do dinheiro que recebeu durante a campanha, seu nome pode, de repente, aparecer em meio a um escândalo, caso a empresa que financiou sua candidatura ou colaborou com o partido ao qual você pertence esteja envolvida em qualquer problema. O senhor se refere à Operação Castelo de Areia, que listou parlamentares que teriam recebido doações da empreiteira Camargo Correia? O que eu acho é que hoje ninguém sabe o que fazer. O que é legal, é cumprir a lei? Mas se você cumpre a lei e é rotulado como se a estivesse descumprido? Se você mostra as notas fiscais e recibos e mesmo assim é listado numa operação que pode ter a visão ideológica e selecionar nomes e partidos em detrimento das provas? Acho que da forma como está sempre pode pairar dúvidas sobre a origem do dinheiro, mesmo quando você acha que está fazendo tudo certo. Como é que você vai perguntar a uma empresa, disposta a financiar sua candidatura, se o dinheiro dela é lícito ou não é lícito? Como é que você vai ter acesso a todas as informações sobre ela? Mas esse problema sempre existiu. O que mudou agora para o senhor acreditar que a proposta que já sofreu tanta resistência pode ser aprovada? O atual sistema é uma coisa que todos já viram. Agora, há um clima mais favorável para que o Congresso tenha coragem de defender o financiamento público e exclusivo das campanhas eleitorais. Agora as pessoas perceberam que mesmo quando você cumpre a lei pode ficar exposto a operações eleitoreiras. A Castelo de Areia, por exemplo, foi feita para atingir parlamentares que cumpriram o que determina a legislação. Então o senhor acha que a proposta de financiamento público ganhou força depois que a operação da Polícia Federal colocou em dúvida a origem dos recursos que financiaram as campanhas? Eu não diria que foi só isso. Mas há outros fatores que se somam para servir de argumento a favor dessa proposta. Eu citaria também o custo de uma campanha e a judicialização da política e dos resultados eleitorais. Outra coisa, qual é o controle de um candidato sobre as denúncias de seus opositores? Não podemos negar a influencia política que sofrem os tribunais regionais eleitorais. Vale lembrar também que os problemas maiores existentes nessas últimas legislaturas foram ligados a financiamento de campanhas eleitorais. Em vez de o Congresso se posicionar para legislar e cumprir seu papel, ficou como uma delegacia, tendo que investigar e se posicionar sobre todas as irregularidades que apareceram. Acho que o financiamento público poderia acabar com isso. Principalmente porque viria junto com a lista fechada de candidatos do partido. Mas como enfrentar as críticas de que a lista fechada daria ainda mais poder e evidência ao caciquismo e à perpetuação no poder de figuras conhecidas e poderosas regionalmente? Não seria a brecha para que o legislativo não se renove nunca? De forma alguma. Essa é a crítica que os opositores à ideia fazem para tentar desestimular a lista. Mas é bom lembrar que os caciques já existem há anos e hoje não há lista fechada. Eles não deixaram de se perpetuar no poder. É lógico que você tem críticas. Mas os países que têm lista não têm menos liberdade de candidaturas. Os países mais desenvolvidos fazem eleições com base nesse sistema e caminham bem. A lista pré-ordenada terá critérios claros sobre as convenções, sobre os votos dos delegados dos partidos. Há regras para definir a ocupação das vagas. O ponto principal é o seguinte: tem alguém que defende o atual sistema e que acha que ele faz bem à democracia e à política brasileira? Há como aprovar essas mudanças até setembro? Creio que sim. Espero que dê. Afinal, isso é lei ordinária. Não estamos tratando aqui de Propostas de Emendas Constitucionais, mas de uma lei ordinária que precisa apenas de maioria simples. Acho que esse é o momento ideal para discutir esse assunto. A lista pré-ordenada e o financiamento público podem ser a solução para os problemas enfrentados na política do país atualmente. O DEM é contra algumas matérias referentes à reforma política como, por exemplo, a janela que pode ser aberta para possibilitar a troca de partidos às vésperas das convenções. Não há riscos para vocês de que o assunto entre na pauta junto com o financiamento público e a lista fechada? Não quero acreditar nesse tipo de oportunismo.
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