Politica

Eleições 2010: Viagem de Lula ao Rio reforça preocupação dos petistas

Parlamentares do partido dizem que gritos de ;Fica, Lula; são resultado da insistência peemedebista sobre o 3º mandato. Mas Jackson Barreto recomeça coleta de assinaturas

postado em 30/05/2009 07:50
Os gritos da comunidade de Manguinhos, no Rio de Janeiro, a favor da permanência do presidente Lula no cargo mostraram o que os petistas já desconfiavam: o debate sobre a possibilidade de abrir uma brecha para o terceiro mandato tem confundido a população sobre o candidato do PT e dificultado a decolagem da candidatura da ministra Dilma Rousseff. Para tentar evitar futuros estragos, os petistas vão articular uma verdadeira ofensiva para que a base aliada enterre de vez a questão. Terão dificuldades. O peemedebista Jackson Barreto (SE), que teve sua Proposta de Emenda Constitucional devolvida depois que a oposição retirou as 15 assinaturas, promete fazer uma nova coleta e reapresentar a matéria. Barreto é incentivado pelo líder da legenda, Henrique Eduardo Alves (RN), que em várias ocasiões já afirmou ser um defensor da tese, apesar de publicamente dizer que o debate somente pode prosseguir se tiver o aval do atual presidente. Barreto insiste que o tema deve ser discutido mesmo contra a vontade de Lula porque diz respeito também à possibilidade de governadores e prefeitos terem direito a duas reeleições consecutivas. ;Não é um caso isolado. Se o presidente não quer, que não seja o candidato. O que não podemos é ignorar a necessidade de debater esse assunto. Nosso objetivo não tem nada a ver com ajudar ou enfraquecer a Dilma;, diz. O PT, por sua vez, argumenta que o debate é uma pauta da oposição e interessa apenas aos que tentam atrapalhar a candidatura da ministra Dilma. ;Acho que isso é um absurdo. Integrantes da base não deveriam insistir nisso porque só atrapalha os planos do nosso partido. Acho que é pura pirotecnia de ambos os lados. Quem apresenta a matéria quer aparecer. A oposição, por sua vez, insiste que somos a favor da tese para confundir as pessoas;, comenta o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), um dos vice-líderes do seu partido. Ofensiva A pedido do diretório, os parlamentares petistas ; principalmente os 54 que na semana passada assinaram o manifesto reafirmando a candidatura da ministra Dilma ; vão receber a missão de convencer os colegas a trabalharem para abortar as manifestações a favor do terceiro mandato. A ideia é tentar convencer integrantes da base que ensaiam alianças com o PT para 2010 de que não há tempo para aprovar a matéria. Além disso, devem ressaltar as poucas chances de a proposta ser aprovada no Senado e dizer que o partido, atendendo ao presidente Lula, não deve mesmo estudar um plano alternativo à candidatura da ministra Dilma. Das 183 assinaturas de apoio ao projeto de Barreto, 31 eram de petistas. A esmagadora maioria, 46, era de integrantes do PMDB. Em reuniões reservadas, os peemedebistas convergem na ideia de que é preciso garantir a possibilidade do presidente Lula se re-reeleger para o caso de a ministra Dilma não ter saúde para enfrentar uma campanha eleitoral. Ao PMDB não interessa correr o risco de deixar o poder e entrar em uma aliança sem chances de vitória. As assinaturas de apoio à PEC do terceiro mandato incluíram também oposicionistas: cinco tucanos e dez democratas. Treze deles desistiram de apoiar a matéria depois das pressões das lideranças. As justificativas para tentar explicar o porquê de apoiarem a matéria foram as mais diversas. A maioria disse que assinou sem saber qual era o verdadeiro conteúdo da PEC. Walter Ihoshi (DEM-SP) foi além e disse que não sabe como seu nome foi parar na lista de apoiadores. ;Fiquei perplexo ao ver meu nome na lista. Nunca assinaria tal documento em sã consciência;, disse. Para a próxima semana, Jackson Barreto precisa de mais cinco assinaturas.
Críticas no Supremo Mirella D;Elia Na cúpula do Poder Judiciário, a possibilidade de o Congresso aprovar uma mudança na Constituição para proporcionar um terceiro mandato ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva não é vista com bons olhos por alguns ministros e suscita polêmica. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, já se posicionou publicamente contra a ideia. ;É notório que essa proposta está sendo colocada num quadro de casuísmo;, reafirmou Mendes ao Correio (leia ponto crítico na página ao lado). Outro magistrado que já atacou abertamente a tese é o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Carlos Ayres Britto, também integrante do Supremo. Recentemente, o ministro chegou a declarar que o terceiro mandato fragiliza o sistema republicano e reaproxima o Brasil da monarquia. Ainda que pareça remota no atual cenário, a mudança, se concretizada, pode ser anulada pelo próprio STF. Uma das hipóteses é de que a oposição questione, em uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin), princípios constitucionais como o da isonomia no processo eleitoral. Esse foi um dos argumentos usados pelo PT, pelo PDT, pelo PCdoB e pelo então PL (hoje PR) para pedir a anulação da emenda constitucional da reeleição, aprovada em 1997, na gestão do então presidente Fernando Henrique Cardoso. Em março de 1998, o tribunal negou uma liminar pedida pelas legendas. Mas a ação não foi julgada em definitivo até hoje. De lá para cá, o perfil do STF mudou radicalmente. Dos 11 ministros da atual composição, apenas dois permanecem na Corte: Marco Aurélio Mello e Celso de Mello.
Ponto crítico Você é a favor do terceiro mandato? SIM Jackson Barreto, autor da pec da nova reeleição Permitir que os chefes dos executivos das mais diferentes esferas possam se reeleger para dois mandatos consecutivos não significa a permissão para a sucessividade indeterminada de mandatos. Não vejo motivos para tanta polêmica, visto que é o eleitor quem irá decidir se quer ou não continuar com o eleito. Acho que no momento de crise que o país está vivendo ter alguém com a credibilidade interna e externa do presidente Lula seria uma coisa boa. Traria uma segurança muito grande para atravessar esse momento e nós precisamos disso. O que não tenho entendido é a reação e as críticas a essa ideia. Não pretendo com essa proposta perpetuar ninguém no poder. O que temos de fazer é abrir a possibilidade e a opção para que os brasileiros possam escolher. Respeito tanto essa liberdade de escolha que proponho também a realização de um referendo popular. Se a minha proposta fosse aprovada, no segundo domingo de setembro estaríamos realizando uma consulta popular para saber se as pessoas querem ou não a possibilidade de haver o terceiro mandato. O que não entendo é essa reação à matéria. Não tem nada de pressões partidárias ou interesses obscuros. A iniciativa surgiu da minha cabeça e pretendo apenas permitir que o Brasil tenha opções e oportunidades de escolha. Por isso, vou insistir. NÃO Gilmar Mendes, presidente do STF É notório que essa proposta está sendo colocada num quadro de casuísmo. Ela já tem esse inequívoco inconveniente. Além disso, é evidente que a ideia de um terceiro mandato briga com o princípio republicano e com o princípio democrático. Eu tenho chamado a atenção para o fato de que democracia não se perfaz e não se consolida apenas com eleições. São eleições dentro de marcos institucionais previamente definidos. Me parece que essa proposta não atende a esses requisitos. Tenho a impressão de que, se houver uma decisão do Congresso Nacional nesse sentido, certamente haverá uma impugnação perante o Supremo Tribunal Federal (STF). Já existia essa discussão (no primeiro governo FHC, quando foi aprovada emenda permitindo a reeleição). O próprio texto constitucional, à época, tratou de fixar que se tratava de uma reeleição, tal como acontece em vários sistemas do mundo. Em alguns deles se impede até mesmo que aquele que foi reeleito eventualmente se coloque para uma nova eleição. É o que acontece no modelo americano. Essa discussão, sempre que se coloca, é intensa, o debate é candente. Mas o próprio Supremo Tribunal Federal, quando foi provocado à época, rechaçou a ideia de inconstitucionalidade de uma reeleição. Aqui nós estamos, na verdade, a discutir a reabertura para uma terceira reeleição num regime fortemente presidencialista, que é a tradição brasileira. Quiçá, daqui a pouco, por que não, a quarta, a quinta, a sexta, a sétima, a oitava reeleição? Certamente, se nós aceitarmos essa ideia vamos estar a transigir com o princípio republicano, com o princípio democrático.
Memória Proposta polêmica As discussões em torno da possibilidade de permitir um 3º mandato para o presidente Lula começaram em outubro de 2007, depois que o Correio divulgou a intenção dos deputados Devanir Ribeiro (PT-SP) e Carlos William (PTC-MG) de apresentarem projetos que possibilitassem a permanência de Lula no poder por mais quatro anos. Diante da polêmica em torno da ideia, William resolveu engavetar a proposta de sua autoria. Ribeiro insistiu na tese. Redigiu o texto da PEC, mas não chegou a apresentá-la. A desistência aconteceu depois que o próprio presidente disse a ele que não tinha interesse em permanecer no cargo. ;Eu tentei. Mas me disseram para parar e parei. Se nem o Lula quer, não há o que se fazer;, diz Devanir. No PT, a ideia chegou a tornar-se tema de discussão. Mas, a legenda fechou questão contra a proposta no fim de 2008. Depois da decisão partidária, Devanir anunciou a desistência e mudou o discurso. Na semana passada, depois de uma reunião de peemedebistas, foi a vez do deputado Jackson Barreto (SE) anunciar a mesma proposta. A diferença é que, apesar dos apelos dos petistas, o sergipano garante que vai insistir na ideia.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação