Politica

Depois de comprar call center, Senado contrata o vendedor do serviço para fazer manutenção

postado em 03/07/2009 07:55
Negócios milionários, amigos favorecidos e dribles nas regras de licitação. No submundo do Senado, há espaço para tudo. Dois contratos atualmente em vigência, um com a Control Teleinformática e outro com a Mahvla Telecomm, são provas de que não há limites para as artimanhas de tirar dinheiro público da Casa. As duas firmas receberam no ano passado R$ 2,4 milhões para prestar serviços de manutenção da central telefônica destinada a atender o cidadão, o call center(1) . Os valores pagos terminaram na conta bancária empresarial de um mesmo favorecido: Marcelo Almeida. Ele é velho conhecido do ex-diretor Agaciel Maia e personagem de processos de investigação envolvendo o Senado e o ramo da telefonia. Almeida, um paranaense de 45 anos, foi o principal articulador do negócio firmado entre a Casa e a empresa Damovo, de onde era gerente, para a aquisição dos equipamentos de call center que, mais tarde, fora contratado para manter. Na época em que o negócio entre a Damovo e o Senado foi realizado, em 2003, a Polícia Federal e o Ministério Público questionaram os valores e investigaram denúncias de que o custo de R$ 5 milhões cobrado pelos serviços era quase 10 vezes mais alto do que os preços de mercado. As sucessões de coincidências não se limitaram ao fato de que o mesmo empresário conseguiu no Senado prestar os serviços para manter os equipamentos que ele mesmo vendeu. As formas utilizadas por Marcelo Almeida para se manter ligado à Casa passam por verdadeiros dribles às leis e às orientações do Tribunal de Contas da União (TCU). A sequencia de fatos envolvendo o empresário começou em 2003, depois que o Senado decidiu aumentar a estrutura do seu call center, desconsiderando opiniões de técnicos e alguns parlamentares, que alegaram a ausência total de necessidade para o volume da compra. Após concluir a negociação, um edital foi lançado para contratar a empresa responsável por manter os equipamentos. De acordo com funcionários do próprio Senado, a polêmica exigência de uma carta de recomendação da fabricante, no caso a Damovo, foi decisiva para definir o ganhador do certame. Por algum tempo, a própria fornecedora fez a manutenção do equipamento, mas decidiu abandonar o negócio e deixou o lucrativo contrato para a empresa Mahvla. A herdeira era uma recém-nascida prestadora de serviço, cujo nome, não por acaso, representava a fusão das iniciais de Marcelo Almeida e da sua mulher, Helen Virginia Lisboa de Almeida. Na mesma época, Marcelo deixou a gerência da Damovo e abocanhou o contrato de cerca de R$ 400 mil por mês. Em 2007, a Mavhla ganhou outro negócio no Senado, no valor de R$ 414 mil. Ela ainda constava até ontem na lista de atuais contratadas. A permanência ocorreu apesar de, em 2006, o Tribunal de Contas da União, a pedido do Ministério Público, ter iniciado investigação sobre os acordos firmados pela empresa. Em 2008, a Corte conclui as investigações e publicou um acórdão proibindo a renovação dos contratos. Na ocasião, os ministros ressaltaram a falta de justificativas para a autorização dada por Agaciel Maia a fim de que o Senado fechasse dois contratos emergenciais sem licitação. Ambos com valor mensal de R$ 284 mil. Nova e rica Para driblar a limitação e as constantes denúncias e representações, o casal de empresários colocou uma terceira empresa no jogo. Entrou em cena a Control Teleinformática, com proposta de prestação de serviços semelhante à da Mahvla. O registro constante na Junta Comercial mostra que a nova empresa foi adquirida em novembro de 2007 em nome de Helen Virginia. Dois meses depois de ganhar a sócia, a a firma da família Almeida venceu o pregão e passou a prestar serviços de manutenção dos equipamentos de telefonia da Casa, da mesma forma como fazia a antecessora. Atualmente, dois contratos entre a Control e o Senado estão em vigor: um no valor mensal de R$ 230 mil e outro de R$ 121 mil. Ambos vigoram até 2010 e foram fechados no mesmo dia, em 8 de fevereiro do ano passado. Levantamento feito pelo Correio na execução orçamentária dos órgãos públicos mostra que somente em ordens bancárias, a Control recebeu em 2008 mais de R$ 1,7 milhão. No mesmo ano, a Mahvla, apesar das irregularidades e da determinação do TCU, embolsou outros R$ 692 mil em um contrato secreto. As duas empresas do mesmo dono funcionam na mesma sede e a proximidade delas confunde até quem trabalha lá. Ao telefonar para o número fornecido pela Mahvla no contrato com o Senado, a reportagem foi atendida com um ;Control, bom-dia;. Ao ser questionada pela outra empresa, a atendente diz que é ;a mesma coisa;. Faz sentido. Ambas estão no mesmo endereço, no Setor de Rádio e TV Sul e possuíam até pouco tempo número idêntico de telefone. O empresário Marcelo Almeida e sua mulher, Helen, não retornaram os recados deixados pela reportagem na sede da(s) empresa(s). Por e-mail, a assessoria do Senado afirmou que a Casa atendeu às recomendações do TCU em 2008 e promoveu nova licitação, onde o objeto da contratação foi dividido de forma que um processo se destinou a manutenção do PABX MD-110, e outro à contratação de empresa especializada em manutenção da Central de Relacionamento do Senado. A Control então ganhou ambos os contratos. Segundo a assessoria, a Mahvla não participou da disputa e portanto atualmente não possui contratos com o Senado. Não souberam informar, no entanto, o motivo de a reportagem ter encontrado a empresa na lista de contratadas da Casa. O Correio imprimiu o documento às 10h de ontem, como mostra o fac-simile acima. Às 20h, a página já não estava no site oficial do Senado. 1 RELACIONAMENTO O Alô Senado é a central de relacionamento da Casa que funciona com serviço de 0800. Inaugurado no fim de 2004, o sistema é formado por um grupo de funcionários que recebe durante todo o dia ligações dos cidadãos com sugestões e reclamações. As mensagens são anotadas e repassadas aos parlamentares. Inicialmente, a capacidade de atendimento era de aproximadamente 6 mil chamadas por dia, com 50 postos de atendimento simultâneos. Mas, atualmente, a estrutura funciona com apenas metade da capacidade.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação