Politica

Um trapalhão pertinho do Congresso

postado em 19/07/2009 08:00
São Paulo ; Ele jura que veio a Brasília na semana passada apenas para resolver problemas de artistas de circo vítimas de enchentes em Santa Catarina. Todavia, o trapalhão Dedé Santana, 73 anos, participou de mais de cinco reuniões políticas para discutir uma possível candidatura a deputado federal nas próximas eleições. O humorista conta que foi pego de surpresa com o convite, feito inicialmente pelo senador Osmar Dias (PDT-PR). Dois encontros o deixaram bastante balançados. O primeiro foi a portas fechadas no Senado, como Cristovam Buarque (PDT-DF). ;Acho uma boa idéia;, resumiu o senador. A outra reunião que deixou Dedé bem entusiasmado foi com o deputado federal Rodrigo Rollemberg (PSB-DF). ;Seria um bom nome;, ressalta o parlamentar. ;Estou lisonjeado com tantos convites, mas vou pensar com muito carinho;, podera o artista. Teve ainda convites do PMDB e de uma série de legendas que ele nem conseguiu memorizar.

A ideia inicial é que Dedé se candidate a deputado federal pelo Paraná, onde mora. Mas, no oba-oba em que se transformou a passagem do humorista pelo Planalto Central, ele recebeu convites para se candidatar ao Senado até por Brasília. ;Tenho um caso de amor antigo com essa cidade. Morei no Núcleo Bandeirante 3 anos antes da inauguração. Ganhei até terreno e um apartamento na Asa Norte;, recorda-se.

Dedé Santana admite não entender muito de política, mas diz que seria um bom deputado, apesar de não se ver nos corredores do Congresso. Ele diz que a sua prioridade número um é fazer humor pastelão ao lado do eterno companheiro, Didi. Evangélico da Igreja Quadrangular, se diz contra o casamento gay e a favor do aborto em casos especiais. No meio político, se diz fã de Luiz Inácio Lula da Silva, do senador Magno Malta (PR-ES), do governador de São Paulo José Serra (PSDB) e do senador e ex-presidente Fernando Collor (PTB-AL), a quem lhe atribui o predicativo " injustiçado".

Vislumbrando o poder, Dedé reclama do salário de R$ 16,5 mil do deputado federal. ;Pensei que fosse mais. Tenho oito filhos e oito netos para criar;, ressalta em tom de brincadeira. Quando é informado que teria direito a verba de gabinete e auxílios para morar em Brasília, faz uma ressalva: ;Não quero mexer com isso não;.

Na entrevista que concedeu ao Correio, ele aproveita para desfazer a lenda de que esteve no fundo do poço financeiramente depois que saiu da TV Globo, há 14 anos. ;Nunca estive fora do ar, nem desempregado. Assim que os Trapalhões acabaram, eu e o Didi fomos para Portugal e ficamos lá durante quatro anos, Depois passei pelo SBT e TV Record. No fundo do poço eu estive quando enfrentei um problema no coração que me deixou entre a vida a morte e quando a minha primeira mulher me abandonou;, revela. Hoje Dedé é contratado da Globo novamente. Veja a íntegra da entrevista.

De onde surgiu a idéia de você se candidatar a deputado federal?

Acho que estão fazendo uma grande confusão sobre isso.

Explique de onde surgiu essa conversa.

Minha família toda vem do circo. Para você ter ideia, tem até ciganos no meio dos meus parentes. Sou um defensor da causa circense. Teve uma enchente no município de Itajaí, em Santa Catarina, e os artistas de um circo que estava lá perderam tudo. Você acredita que o Brasil todo enviou donativos à população do município, mas a prefeitura se recusou a dar um agasalho e alimento para os artistas alegando que eles não são moradores e que só estavam lá de passagem. Eu vim a Brasília resolver esse problema.

Sim, e aí? De onde veio o convite para ser deputado?

Então... Eu vim a Brasília conversar com deputados sobre a situação dos artistas circenses porque recebi ligações do Brasil todo, sabe? Os artistas me ligam de todo canto porque eles sabem que eu posso conversar com deputados, senadores e até com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Andando pelos corredores do Congresso, encontrei o senador Osmar Dias (PDT-PR), que é meu amigo. Contei a ele o que vim fazer em Brasília e ele me fez o convite.

Ele fez o convite do nada?

Primeiro eu detalhei que estava lutando pelos artistas circenses de Santa Catarina que perderam tudo numa enchente. Aí ele disse que eu poderia fazer muito mais pelo povo do circo e de todo Brasil se me candidatasse a deputado federal nas eleições do ano que vem. Aí fizeram a maior festa.

Já tinha passado pela sua cabeça ser deputado?

Nunca pensei nisso. Mas confesso que vou pensar com carinho no convite.

Será que vamos ter um trapalhão no Congresso em 2011?

[Risos] Se me perguntarem hoje, como você está fazendo, direi que não. Tenho um contrato com a Rede Globo e preciso ver se é possível conciliar um mandato de deputado com a gravação do programa A Turma do Didi, que é a prioridade da minha vida.

Muitos artistas bons se candidatam e continuam tocando a carreira. Uns, como a Bete Mendes, conseguiram ser bons parlamentares e excelentes atores.

É verdade. Mas preciso pensar sobre isso. Tenho que conversar muito com meus amigos, principalmente com o Didi. Tenho outras atividades, além da televisão. Apresento espetáculos de circo por todo o país. Tenho 10 filhos. Confesso que nem sei bem quanto ganha um deputado federal.

Um deputado ganha R$ 16,5 mil brutos. O senhor acha suficiente para o seu orçamento pessoal?

Só isso? Eu pensei que ganhasse bem mais. Tenho oito filhos e oito netos para criar.

Mas tem uma série de auxílios financeiros que ajudariam nas suas despesas pessoais, como o pagamento da sua moradia, do seu celular, das passagens aéreas. O senhor não vai precisar pagar nada disso. O que acha?

Eu acho muito pouco.

Tem uma verba de gabinete de R$ 60 mil para o senhor contratar até 25 assessores para ocupar cargos de confiança. Já ouviu falar?

Já ouvi falar, sim. Mas não quero mexer com isso não. Olha aí o José Sarney, que sempre foi um homem sério. Ele está todo enrolado com esse negócio de atos secretos. Toda semana surge uma história nova sobre ele.

Honestamente, o senhor acha compatível um artista exercer humor pastelão na televisão e, ao mesmo tempo, legislar seriamente na Câmara?


Claro que sim. Sempre fui envolvido nas causas das crianças e da cultura. Além disso, tem exemplos de bons deputados que passaram pelo Congresso e que são artistas, como o Clodovil e o Frank Aguiar.

Existe alguma preocupação que fez com que o senhor não aceitasse o convite de imediato para a candidatura?


Existe, sim. Tenho muito respeito pela minha carreira artística. Tenho uma trajetória de sucesso e fracasso. Hoje estou bem comigo mesmo, tenho uma família linda e estou à Rede Globo novamente, depois de quase 20 anos fora. Por onde ando, sou aplaudido. Aqui mesmo em Brasília fui reverenciado várias vezes e isso me emociona. Tenho receio que a minha biografia seja manchada com uma carreira política desastrosa. Comecei a pensar nisso hoje. Minha imagem junto ao público é muito boa e de muita honestidade. Tenho medo de arranhá-la no meio político.

Andando pelos corredores do Congresso, o senhor se imagina deputado?

Honestamente, não. Me realizo no palco e nos estúdios da televisão. Fico pensando na campanha eleitoral, que é complicada. Acho que eu teria que vir com uma causa muito forte.

Quais políticos o senhor admira?

Gosto do senador Magno Malta (PR-ES), que é muito meu amigo, do Fernando Collor (PTB-AL), que foi um grande injustiçado, e do Lula, em quem sempre votei desde que o Collor foi deposto da presidência, do José Serra (PSDB), e do senador Cristovam Buarque (PDT-DF). Gosto também de deputado Zequinha Marinho (PMDB-PA). Ele me prometeu me ajudar, caso eu me candidate.

O senhor acha que os deputados-artistas Clodovil e Frank Aguiar foram atuantes?


O Clodovil foi atuante porque falava o que pensava. Não tinha papa na língua. Quando eu estava bem mal, para baixo, reclamando da vida, ele me deu um puxão de orelha em público e eu sacudi com a sua bronca. Já o Frank Aguiar não acompanhei muito.

De modo geral, o senhor seria capaz de fazer uma avaliação da Câmara dos Deputados?

Não me pergunte isso agora. Depois desses convites para ser deputado, vou estudar, me informar mais e depois poderei responder a esse tipo de pergunta.

E o problema dos artistas de circo que estão sem donativos em Santa Catarina? O senhor resolveu?

Claro que resolvi. Fui lá no Ministério da Cultura, falei com o Alfredo [Alfredo Manevy, secretário-executivo], e ele me prometeu umas lonas. Também aproveitei para reclamar da verba que o governo solta para o circo, que é muito pequena e não dá para nada. Também vim falar do problema dos animais do circo.

O senhor é a favor de uso de animais em apresentações circenses?

Não se pode proibir a participação de animais em circos. Eles também são artistas e gostam de se apresentar. Acho que é preciso regulamentar a lei para dizer qual bicho pode e qual não pode. Cavalo deveria poder e girafa não.

Não entendi. Qual o critério para definir qual pode e qual não pode? Do jeito que o senhor falou fica parecendo que o cavalo é especial.

Não, não. Não é isso. Os dois animais são especiais no circo. O problema é que a girafa é um animal frágil e o cavalo é mais resistente. Ao tirarem o cavalo do circo, só o Beto Carreiro perdeu 10 espetáculos. Acho que o governo deveria impor regras severas para cuidarem dos animais de circo e não simplesmente excluí-los dos espetáculos.

O senhor gosta de Brasília?

Adoro. Tenho uma história de amor antiga com essa cidade. Morei aqui, no Núcleo Bandeirante, três anos antes de Juscelino Kubitschek inaugurar Brasília. Não sei se você sabe, mas eu inaugurei a primeira transmissão de televisão aqui em Brasília. Você não tem ideia da importância disso. A primeira cara que apareceu na televisão aqui em Brasília foi a minha. Tive uma boate-show no Núcleo Bandeirante.

O senhor era amigo do Juscelino?


Era tão amigo dele que ganhei de presente uma quadra inteira em Brasília para construir uma área de lazer com teatro e cinema. Como não tinha recursos, não consegui construir e acabei vendendo a preço de banana. Também ganhei do governo um apartamento na Asa Norte quando era funcionário da Rádio Nacional, mas vendi. Nessa época ninguém acreditava que Brasília seria o que é hoje.

Qual avaliação o senhor faz do governo Lula?

Sou suspeito para avaliar, pois sou um grande admirador do presidente. Voto nele desde que o Collor foi expulso do Palácio do Planalto.

O senhor acha mesmo que o Collor foi um injustiçado?

Não vou citar nomes, mas ele foi injustiçado porque quase todos os políticos que o acusaram se envolveram em escândalos, inclusive de merenda escolar. O Collor foi o único presidente que tentou por um terreno fixo em casa cidade para receber o circo. Os prefeitos não gostam de espetáculos circenses e impõem uma série de impedimentos para a montagem dos espetáculos. O Collor tava quase conseguindo aprovar uma lei que obrigaria os prefeitos a receberem os circos, mas aí veio o impeachment e acabou não saindo.

Em quem o senhor votaria para presidente? Dilma Rousseff ou José Serra?

Eu admiro muito os dois. Seria uma grande dúvida. A Dilma representa a continuação do governo Lula, que é muito bom. Mas sou um grande fã do Serra. Não vou fazer a opção agora.

Qual real possibilidade de o senhor se candidatar a um cargo político?

Agora, agora, essa realidade não existe.

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