Politica

Ex-ministros transitam com desenvoltura em gabinetes para fazer lobby

postado em 20/07/2009 08:17
No jogo de interesses que circula pelos corredores da Esplanada diariamente, ganha a partida quem consegue transitar melhor e conhece os melindres dos bastidores do poder. Nessa disputa, o capital pessoal e a rede de relacionamentos adquiridos ao longo dos anos fazem com que ex-ministros de diferentes governos tenham larga vantagem. Ocupantes de cargos do primeiro escalão, eles fazem parte do seleto grupo de representantes de setores produtivos. Conseguem ser bem recebidos em gabinetes e agendam com facilidade reuniões e encontros para fazer lobby e defender os interesses dos que hoje os remuneram.

O ex-ministro da Agricultura Francisco Turra é um desses casos. Ocupante do cargo ministerial durante 15 meses no governo do ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, o advogado é hoje um assíduo frequentador de diferentes ministérios e trabalha por vantagens para os produtores de frango do país. Com o prestígio de quem conhece o funcionamento da máquina estatal, Turra assumiu a remunerada função de presidente da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frango (Abef). É dele a responsabilidade, por exemplo, de articular a redução de tributos cobrados do setor e de monitorar as barreiras tarifárias impostas pelos países importadores. Como a própria associação define em seu site, a principal função da entidade é ;trabalhar em conjunto com as empresas associadas e interligá-las aos poderes públicos;. Uma missão fácil para quem conhece bem os corredores da Esplanada.

Ministro da Agricultura entre 1999 e 2002, no segundo governo de FHC, o economista Marcus Vinícius Pratini de Moraes é um nome disputado no mercado de carne bovina. Conhecedor do setor e bem relacionado com diretores e funcionários dos ministérios, o ex-integrante do primeiro escalão está hoje a serviço do grupo JBS-Friboi. Como presidente do Comitê de Estratégia Empresarial do grupo, Pratini de Moaraes tem trabalhado pela internacionalização da empresa, que é o maior frigorífico do país. Antes de assumir o posto, Pratini ficou até o ano passado à frente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec).

Agronegócio
Também usufruindo do prestígio e do capital pessoal que adquiriu ao longo da carreira, o engenheiro agrônomo Roberto Rodrigues, que foi ministro da Agricultura no inicio do governo Lula, é o grande atrativo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) nos contratos de consultorias de agronegócios. Desde 2006, o ex-ministro coordena o Centro de Agronegócio da FGV, cujo carro-chefe é prestar serviços sobre licenças para plantios e estudo de solos. Consultorias caras e atrativas, que emplacaram graças ao nome e à influência de Rodrigues.

Ministro das Comunicações por menos de um ano, no final do mandato de FHC, Juarez Martinho Quadros do Nascimento também atua prestando serviços ao setor no qual ganhou notoriedade. Quadros é visto com frequencia pelos ministérios trabalhando em prol do setor de telecomunicações. Atualmente, ele presta consultoria para a empresa Orion e é membro do conselho de administração da Associação Brasileira de Telecomunicações.

Atuação
O diretor executivo da Abef, Ricardo Santin, disse que a atuação de Francisco Turra junto aos ministérios não é uma demonstração de lobby, visto que o ex-ministro representa uma entidade que hoje é responsável pela posição em que o Brasil se encontra de maior exportador de carne de frango do mundo. ;O trabalho empreendido pela entidade faz com que ele realize viagens mais para o exterior e regiões produtoras de frango no Sul do país do que para Brasília;, afirmou. O diretor lembra, ainda, que logo depois de deixar o ministério, em 1999, Turra foi vice-presidente da Diretoria de Operações do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE).

As demais assessorias não retornaram ao contato da reportagem.

Interesses
A palavra lobby tem origem inglesa e significa salão, corredor. A expressão começou a ser utilizada para designar a atuação de pessoas junto ao poder público, pelo fato de várias articulações políticas acontecerem nas antessalas de hotéis e do Congresso. Dessa forma, denomina-se lobista qualquer pessoa ou organização que tenha como função trabalhar para influenciar decisões do poder público em favor de determinados interesses.

Regras nos EUA e Europa

O lobby no Poder Público é prática antiga, existe há anos, mas o Legislativo brasileiro nunca conseguiu regulamentar a atividade. Três projetos de lei dormem atualmente nas gavetas da Câmara dos Deputados à espera de apreciação. Um deles, de número 203/89, foi apresentado pelo senador Marco Maciel (DEM-PE) em 1989 e aprovado pelo Senado no ano seguinte. Desde então espera por votação na outra Casa. A proposta de Maciel prevê o credenciamento dos lobistas e uma série de regras éticas para o exercício de pressões junto ao poder público.

Com teor semelhante, outras duas propostas tramitam na Casa. Uma delas é de autoria do ex-deputado e ex-vice prefeito de Belo Horizonte Ronaldo Vasconcelos (PV). Apresentada em 2000, somente em maio deste ano o projeto ganhou um relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Outra proposta que regulamenta a prática de lobby é do deputado Carlos Zarattini (PT-SP). O projeto de lei 1202 de 2007 prevê até curso de noções éticas para os lobistas credenciados. A proposta também aguarda parecer da CCJ.

Países
A morosidade do Brasil na regulamentação do lobby está na contramão de outros países. Várias nações já possuem regras definidas para quem ganha a vida pressionando instituições públicas em defesa de interesses de empresas e setores da sociedade. Os Estados Unidos, por exemplo, regulamentaram a atividade em 1946. Como as regras editadas à época apenas exigiam o registro das pessoas que exercessem pressões no legislativo pela aprovação de alguma proposta, em 1995, nova regulamentação foi editada. Dessa vez, englobando um cadastro dos que praticavam o lobby também junto ao Executivo. A nova legislação obrigou os lobistas a se registrarem no Congresso e a especificar anualmente para quais empresas ou setor prestam serviços.

Na Comunidade Européia também há um código de conduta para ser seguido pelos lobistas. Para fazer lobby no Parlamento Europeu, é preciso obter uma autorização do parlamento que vale apenas por um ano. Ao requerer essa autorização, o lobista precisa declarar quais interesses defende e de quanto é sua remuneração pelo serviço. Na Inglaterra, houve regulamentação da atividade em 2002.

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