O início da manhã de ontem prometia um dia de medidas radicais contra a superestrutura administrativa do Senado. O presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), chegou cedo ao trabalho e, pouco adepto de declarações de corredores, mudou de postura e se dirigiu animadamente à imprensa para anunciar que iria reduzir o número de servidores. Minutos depois, funcionários tercerizados e indicados políticos ; ambas categorias citadas no relatório da Fundação Getulio Vargas como candidatas à redução de seus quadro em cerca de 40% ; se movimentavam pelas dependências do Senado e tentavam profecias sobre onde ocorreriam essas reduções. Não foi preciso muita imaginação. No início da tarde, veio o anúncio cercado de altos números e poucos resultados efetivos: 511 cargos a menos, nenhum servidor demitido, contratações por concursos (1)públicos futuras suspensas e redução zero de despesas.
A Mesa Diretora aprovou a proposta do presidente Sarney e, pelo menos durante a reunião, se animaram com efeitos positivos que o anúncio dos cortes poderia gerar. Mas, apesar da atmosfera que se tentou criar, o pouco resultado prático ainda está distante do que propõe o relatório da FGV, encomendado depois que eclodiu a crise na Casa. Os parlamentares sabem disso. ;É preciso lembrar que este é apenas o começo de uma série de medidas administrativa que estão por vir;, argumentou o primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI).
A repercussão fraca dos cortes tem razão de ser. Nenhum dos 511 cargos estava ocupado. Essas vagas fazem parte do grupo de mil que tinham como titulares servidores efetivos que se afastaram ou se aposentaram. Ou seja, deveriam ser preenchidas por meio de concurso público que ainda seriam realizados. ;Isso representa uma medida de economia futura;, explica o presidente Sarney.
Apesar dos cortes, ainda restam outras 500 vagas vazias. O número é muito menor do que o que a Casa pretende ocupar no ano que vem. Na proposta de Orçamento para 2010, o Senado prevê a ocupação de apenas 300 cargos e funções que hoje estão vagos. Esses postos poderão ser ocupados tanto por concursados, como por indicados políticos. Essa previsão vai gerar uma despesa anual de cerca de R$ 28,1 milhões somente no primeiro ano.
Contramão
O anúncio dos cortes das vagas vazias e a redução zero nos gastos caminham na contramão das orientações elaboradas pela FGV. A instituição iniciou uma análise da estrutura do Senado em maio deste ano, depois que o presidente José Sarney tentou demonstrar que estava reagindo à crise instalada na Casa. Entre as propostas iniciais já apresentadas ao presidente pela instituição estão: o enxugamento de cargos tercerizados e comissionados, a diminuição de vagas de diretoria e a redução dos bônus salariais, chamados de FCs, para servidores. Essas gratificações variam de R$ 1,3 mil a R$ 2,4 mil. A proposta da Fundação prevê que as atuais 630 funções existentes atualmente sejam reduzidas para 443. Segundo a FGV, a economia com essas reduções poderia chegar a R$ 650 mil por mês. O ato do presidente extinguindo os cargos vazios e a proposta da FGV ainda serão votadas em plenário.
Seleção
A estrutura de servidores do Senado sempre foi motivo de críticas e alvo de representações por órgãos fiscalizadores. Todas as críticas têm como alvo as antigas contratações sem concurso público pelo que ficou chamado de ;trem da alegria;, os contratos milionários com empresas terceirizadas ou o número de funcionários comissionados na folha de pagamento. Atualmente, o Senado possui 3,4 mil servidores efetivos ; incluídos os concursados e os beneficiados pelo trem da alegria ;, 2,8 mil comissionados e três mil terceirizados. (Colaborou Tiago Pariz)
Exército de cabos eleitorais
Depois de permitir que cada um dos 81 senadores abra quantos gabinetes quiser em seus estados, a cúpula da Casa reforçou a elite que já existe na Casa. A decisão de ontem estabelece que líderes e integrantes da Mesa Diretora tenham três servidores comissionados em suas bases cuidando das tarefas e do relacionamento direto com os seus potenciais eleitores.
Os senadores da nata administrativa e política da Casa terão ao seu dispor um verdadeiro exército de funcionários bancados com dinheiro público que se soma aos funcionários já disponíveis pelos gabinetes normais. Todos com potencial de cabo eleitoral a um ano do pleito que renovará dois terços do Senado.
Os 81 parlamentares podem abastecer os escritórios políticos de acordo com seus interesses. Eles têm uma verba mensal de R$ 70 mil para fazer a composição nos gabinetes de Brasília e dos estados. Esse dinheiro dá direito a 12 funcionários, mas com o milagre da multiplicação eles conseguem contratar até 79. Isso é possível graças à divisão do valor dos salários.
Os líderes e integrantes da Mesa terão todos esses além de três ; dois assessores técnicos e um secretário parlamentar ; da estrutura privilegiada disponível aos senadores com postos de destaque. O primeiro-secretário do Senado, Heráclito Fortes (DEM-PI), disse que a decisão não vai gerar gastos. A declaração dele, de que a medida atendia a uma demanda dos próprios líderes, causou revolta no Senado. ;Não fui consultado sobre esse fato e não concordo. Não tenho nenhum (funcionário) da liderança do Democratas lotado no meu estado;, disse o líder do DEM, José Agripino (RN). ;Esse é um assunto que pode parecer que estamos dando passos atrás;, disse Renato Casagrande (PSB-ES). O líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), classificou o tema como um ;retrocesso;.
Custos
O diretor-geral do Senado, Haroldo Tajra, explicou que a medida não traz custos pois esses funcionários já fazem parte da estrutura do Senado e estão lotados nas lideranças e nos gabinetes da Mesa. Estudo da Fundação Getulio Vargas recomendou que para diminuir o custo de manutenção desses funcionários, a Casa estabeleça um teto de 25 comissionados, como ocorre na Câmara dos Deputados.
A decisão anula os efeitos de um ato de agosto que proibia lotação de funcionários das lideranças e da Mesa Diretora nos estados de origem. O Senado possui 17 postos de líderes, dos quais 13 de partidos e outros quatro que representam governo, bloco de apoio, maioria e minoria. A Mesa Diretora é composta por presidência, duas vice-presidências, quatro secretarias e quatro suplências.
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Número de servidores que os integrantes da Mesa Diretora do Senado podem dispor nos estados
CARGOS