postado em 29/09/2009 07:00
Falhou a primeira tentativa do Senado de recadastrar servidores e, assim, acabar com os fantasmas e beneficiários de nepotismo pendurados na folha de pagamento da Casa, estimada em R$ 2,3 bilhões neste ano. Um mês foi pouco para que eles informassem à administração onde e quando trabalham. Por conta disso, abriu-se uma segunda chamada para os funcionários, que terão até 16 de outubro para responder à solicitação de recadastramento da Diretoria-Geral. De 26 de agosto até ontem, apenas 64% haviam enviado os dados requisitados. Parte do pacote moralizador anunciado pelo presidente José Sarney (PMDB-AP), a medida está encontrando resistência entre os servidores. Inicialmente, todos os efetivos e comissionados deveriam ter prestado contas à administração até a última sexta-feira, dia 25. Dos 6.303 funcionários cadastrados na Casa, apenas 4.059 preencheram os formulários indicando, por exemplo, onde trabalham, além de endereços e lista de dependentes. Do total que enviou os dados, a maioria é de servidores efetivos. Entre os comissionados, apenas 59% atenderam à requisição da Diretoria-Geral. Entre os efetivos, foram 68,1%.
O recadastramento faz parte do conjunto de ações que irá dar forma à tão falada reforma administrativa. Desde a última sexta-feira, o Conselho de Administração da Casa faz reuniões para formular propostas. A intenção é apresentá-las na próxima quinta-feira à Mesa Diretora.
Para aumentar a adesão ao levantamento, o Senado decidiu ameaçar o bolso dos servidores: quem não enviar os dados até 16 de outubro vai ficar sem o salário. O Correio apurou que a decisão está criando polêmica entre os servidores, que temem perder regalias que acumularam durante mais de uma década de administração temerária da Casa ; como o emprego de parentes e o aumento das horas extras.
Há poucos dias, um embate entre os líderes do PMDB e do PSDB, Renan Calheiros (AL) e Arthur Virgílio (AM), respectivamente, mostrou o nível das irregularidades que permeiam a administração do Senado. O tucano cobrou, em plenário, o nome de um servidor que esteve preso por dois anos e continuou recebendo o salário.
A denúncia é mais uma no pacote que inclui parentes e afilhados políticos incorporados à estrutura da Casa por indicações eminentemente políticas. A desordem é tamanha que contaminou os servidores concursados ; ainda no início deste mês, um funcionário de carreira recebeu uma advertência por ;ter se ausentado do serviço durante o expediente por cinco meses, sem prévia autorização do seu chefe imediato;. Traduzindo: era mais um entre os fantasmas.
O Sindicato dos Servidores do Legislativo (Sindilegis) tem tentado apagar os incêndios que estão se formando nos corredores do Senado. ;Estamos tentando convencer os servidores de que essas medidas moralizadoras são boas para todo mundo;, afirmou o presidente do Sindilegis, Magno Mello.
Se atingir o bolso dos servidores, diminuindo o custo da folha da Casa, o recadastramento será a primeira medida a trazer resultados efetivos. Na última semana, o Senado anunciou o corte de 500 cargos. A tesourada, no entanto, não trará qualquer economia: os postos extintos já estavam vagos.
Atualização
Os servidores do Senado devem atualizar dados como endereço, número de CPF, lotação, cargo, a lista de dependentes, e até o ramal que atendem na Casa. Apenas os terceirizados estão liberados da apresentação desses dados. A justificativa é de que a responsabilidade pela gestão desses funcionário é das empresas contratadas pelo Senado para fornecer mão de obra.
Memória
Estudo da FGV
No esteio dos escândalos que revelaram a existência de atos secretos e o inchaço da máquina administrativa do Senado, em maio deste ano, o presidente José Sarney (PMDB-AP) anunciou a elaboração de um estudo feito pela Fundação Getulio Vargas (FGV). A ideia era de que ele trouxesse uma proposta capaz de gerar economia e eficiência. O estudo foi concluído, e, desde então, a Comissão de Administração do Senado tenta encontrar o equilíbrio entre os generosos cortes sugeridos pela FGV e as práticas que por anos dominaram a Casa.
No estudo, a fundação sugeriu um enxugamento de 40% da máquina administrativa e a redução do número de diretorias ; que já chegou a 181 ; para sete. Até quinta-feira, a comissão deve concluir um esboço das medidas moralizadoras que serão anunciadas para dar o início efetivo à tal reforma administrativa, prometida por Sarney ainda em fevereiro, na data de sua posse. Ele será apresentado à Mesa Diretora, e debatido pelos parlamentares.
Mas Sarney já enumera alguns feitos como parte da reforma administrativa que ainda não emplacou. Em sua coluna semanal na TV Senado, no último dia 24, ele citou a extinção de 511 cargos vagos como fruto desse esforço pela moralização, ainda que o corte não traga economia para os cofres públicos. Sarney também ressaltou a ordem que deu a todos os setores de que economizassem 10%.
Processo no fim
Aproxima-se da reta final o processo administrativo contra o ex-diretor de Recursos Humanos do Senado João Carlos Zoghbi, acusado de criar um esquema fraudulento para liberação de empréstimos consignados aos servidores da Casa. Zoghbi, que teria usado sua ex-babá como laranja para criar três empresas que intermediavam créditos pessoais para funcionários do Senado, foi indiciado no último dia 21. Agora, ele terá 20 dias para apresentar a defesa por escrito. Depois disso, o caso irá para julgamento na Direção do Senado.
Zoghbi teria atuado para beneficiar as empresas, autorizando operações de crédito com valores superiores aos limites de comprometimento de salários permitidos. A margem era de até 30% do vencimento do servidor, mas, em alguns casos, foram identificados comprometimentos de até 70%.
Segundo a Lei n; 8.112, que trata do funcionalismo público, após a apresentação da defesa de Zoghbi, deverá ser elaborado, pela Comissão de Sindicância do Senado, um relatório minucioso, contendo as provas que pesam contra o homem que já foi o número 2 na administração da Casa. Segundo a norma, o relatório deve ser conclusivo, apontando a culpa ou inocência do acusado.
Ainda há divergência sobre quem deverá chancelar ou não o trabalho da comissão que investigou o ex-diretor de Recursos Humanos. O processo de Zoghbi pode parar tanto nas mãos do primeiro-secretário da Casa, Heráclito Fortes (DEM-PI), quanto nas de José Sarney (PMDB-AP), presidente do Senado. Se Zoghbi alegar a necessidade de diligências indispensáveis para sua defesa, o prazo de 20 dias pode ser dobrado. Por conta dos empréstimos consignados, Zoghbi também foi indiciado pela Polícia Federal, em agosto deste ano. (DL)