Politica

Audiência pública discutirá polêmica em torno da PEC dos Cartórios na terça

postado em 04/10/2009 08:00

Uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, terça-feira à tarde, será a última oportunidade para um acordo em torno da Proposta de Emenda Constitucional n; 471/2005, a PEC dos Cartórios. A matéria deverá ser votada na quarta-feira, em sessão noturna extraordinária. A PEC efetiva, sem concurso público, substitutos e responsáveis designados para cartórios até novembro de 1994. Uma proposta do deputado Júlio Delgado (PSB-MG) prevê a efetivação apenas daqueles que são responsáveis por cartórios de municípios com até 10 mil habitantes. O deputado afirma que a sugestão partiu do grupo contrário à emenda constitucional.

;O que nós estamos fazendo é reconhecer que aqueles que fazem o concurso têm razão no mérito da matéria. Mas, ao fazer isso, a gente vai estar fazendo uma injustiça com relação aos cartórios dos pequenos municípios. Aqueles que fazem concurso têm interesse em ir para as cidades onde o cartório é financeiramente rentável. Temos municípios com menos de 5 mil habitantes. Num município desses, a renda do cartório é baixíssima. Muito pouca gente tem interesse em assumir;, argumenta Delgado. Neri Antonio Demétrio, diretor da Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg) de Santa Catarina, critica a proposta: ;Vejo apenas um absurdo e uma confissão dos concurseiros que realmente se interessam só por grandes cartórios. Só isso;.

Os dirigentes da Associação Nacional em Defesa dos Concursos para Cartório (Andec) negam que defendam a proposta de Delgado e afirmam ter confiança na derrubada da PEC n; 471 na quarta-feira. Na audiência de amanhã, eles pretendem apresentar jurisprudências do Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar comprovar que os concursos para cartórios se tornaram obrigatórios desde 1982. ;É mais uma invenção dos defensores do trem da alegria dos cartórios dizer que a Lei n; 8.935/1994 regulamentou os concursos para cartórios. O Supremo já decidiu centenas de vezes que o artigo 236, parágrafo 3;, da Constituição Federal, nunca precisou de regulamentação, é autoaplicável;, afirma Naurican Lacerda, fundador da Andec.

Participam da audiência pública amanhã o corregedor Nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp, e representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da Anoreg e da Andec. O ministro da Justiça, Tarso Genro, foi convidado, mas ainda não confirmou presença.

Limites

Pelo substitutivo do relator da PEC, deputado João Matos (PMDB-SC), seriam efetivados aqueles que estivessem respondendo interinamente pelas funções nos últimos cinco anos antes da promulgação da emenda constitucional. Uma emenda apresentada pelos deputados Tarcísio Zimmermann (PT-RS) e José Genoino (PT-SP) na comissão especial limitou o benefício aos substitutos e responsáveis designados no período entre a promulgação da Constituição de 1988 e a edição da Lei n; 8.935/94.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) entende que a Constituição Federal é clara: após a sua promulgação, em outubro de 1988, a titularidade de cartórios só pode ser definida por concurso público. A Andecc entende que o texto final da PEC vai efetivar, inclusive, substitutos que ingressaram na carreira até 1994 e, atualmente, ocupam interinamente o cargo de responsáveis pelos estabelecimentos.

O presidente da OAB, Cezar Brito, condena a aprovação da emenda. ;Cartório não é capitania hereditária. A Constituição Federal estabeleceu essa atividade como atividade pública, com acesso por concurso público. Só ressalvou os casos existentes antes de 1988. A emenda que altera o limite de acesso para 1994 não retira a flagrante inconstitucionalidade da proposta.;

Depoimentos

Oswaldo Hoffmann, a favor da PEC

;Eu fiz concurso em 1988, para a comarca de Paranavaí, no interior do Paraná. Fiquei lá pouco tempo. Quando abriu uma vaga num cartório grande de Curitiba, em 1989, eu pedi a remoção, tudo dentro da lei. Eu estive 20 anos legal, até junho passado, quando o CNJ baixou a Resolução n; 80, dizendo que eu não era mais legal. Ou seja, durante 20 anos os meus atos não foram questionados. Mas aí veio essa resolução autoritária. Só a partir de 1994 houve uma regulamentação federal para as transferências, e as remoções foram proibidas. Mas, antes disso, o estado do Paraná fazia a remoção e a considerava legal. No Paraná, 98% dos tabeliães estão numa situação semelhante à minha. São duzentos e poucos.;

Ouça os depoimentos de Sérgio Cupolilo e Fernanda Wissel:

Sérgio Cupolilo, contra a PEC

;Assumi um cartório na cidade de Campo Largo (PR), no distrito de Bateas, que é um distrito rural, com 4 mil habitantes. Lá, antes de eu assumir, o cartório só funcionava às segundas, quartas e sextas-feiras. Eu assumi, como concursado, com o compromisso de reestruturar o cartório. Abro todos os dias e informatizei o cartório. Antes, muitas coisas eram feitas à máquina, à mão. Essa história de que o concursado não quer assumir cartório pequeno é uma mentira. A renda bruta chega a R$ 4 mil por mês. A renda líquida fica por volta de R$ 1,2 mil. Vale a pena pela experiência que tenho.;

Marcelino de Oliveira, a favor da PEC

;Eu sou substituto desde 1983. Em Mato Grosso do Sul, a legislação estadual permitia que o substituto com mais de 10 nos no cargo assumisse a titularidade. E, lá na frente, através do CNJ, falam que nada está valendo. Eles contestam essa efetivação. Venho de uma família de notários e registradores. O meu avô foi o primeiro tabelião da cidade de Dourados, quanto o cartório ficava apenas em um quartinho, e ele estava lá dentro, trabalhando. Depois, o meu pai foi titular.;

Priscila de Paula, contra a PEC

;Encontrei (em Campo Largo, no Paraná) um cartório cheio de aberrações jurídicas. O antigo oficial e a filha dele, que assumiu quando ele faleceu, formada em educação física, não permitiam que as testemunhas de um casamento fossem casadas entre si. Porque para eles, quando as pessoas se casavam, viravam uma só. Então, valia como só um testemunho. Outra aberração: diversas associações que mascaravam parcelamentos irregulares do solo, registrados em pessoa jurídica, contratos registrados sob a forma de minuta. Constava assim: associação, traço, com sede na rua, traço. Cada dia que eu abro um documento é uma surpresa. O intuito lá era ganhar dinheiro, era colocar selo. Hoje, as bombas estão estourando na minha mão.;

Leia reportagem completa na edição deste domingo do Correio Braziliense

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