Ricardo Brito
postado em 30/10/2009 09:12
O Senado quer legalizar um ato inconstitucional e permitir que servidores recebam mais do que um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o teto do funcionalismo público. Quatro palavras perdidas no meio de um projeto complexo de 125 páginas sobre a reforma administrativa, apresentado ontem, abrem brecha para a irregularidade. O texto da Mesa Diretora, que precisa ser aprovado pelo Plenário, indica que o dinheiro recebido pelos efetivos por ;exercício de função comissionada; não será levado em conta na hora de estabelecer o teto salarial. A inclusão da bondade no texto da reforma causou espanto até em quem defende a categoria.Atualmente, o limite salarial do serviço público é de R$ 25.275. Pela proposta, os efetivos poderiam extrapolar essa barreira acumulando o bônus recebido a título de ;função comissionada;. Paga a quase todos os 3,4 mil efetivos, ela varia de R$ 1,4 mil a R$ 2.4 mil. As chamadas FCs têm efeito cascata em outros ganhos indiretos, como na gratificação de representação. Para o jurista Ives Gandra Martins, a proposta é inconstitucional. ;O limite de qualquer subsídio é o teto do Supremo;, afirmou o professor emérito de Direito Constitucional da Faculdade Mackenzie (SP). ;A lei é clara;, completa.
Os servidores da Casa têm direito a receber, além do salário-base (o máximo é de R$ 6,4 mil), outros seis ganhos indiretos. Na conhecida conta de chegada, eles proporcionam um crescimento salarial que ultrapassa o teto. Embora não soubesse da inclusão do artifício, o presidente do Sindicato dos Servidores do Legislativo Federal (Sindilegis), Magno Mello, defendeu o atual sistema. ;Se duas pessoas ganham o teto e uma vira chefe, ele vai trabalhar de graça?;, questiona. Magno disse que a prática de furar a barreira ocorre em outros órgãos públicos.
Limite
A proposta apresentada deixa para 2011, quando haverá renovação de dois terços da Casa, a redução do número de comissionados por gabinete. Os parlamentares podem empregar hoje até 79 funcionários por gabinete, fatiando a verba disponível para contratações. O novo modelo da Casa, que estará aberto a modificações dos senadores nas próximas duas semanas, estabelece um limite de 25 comissionados. A intenção é economizar com direitos trabalhistas. ;A nossa ideia é reduzir funcionários. Estamos com medo de pressão dos servidores dos dois lados;, afirmou o primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI). O projeto pretende reduzir em 40% a estrutura da Casa.
O Senado decidiu ontem acabar com a permissão para que líderes e integrantes da Mesa Diretora tivessem três funcionários extras em seus gabinetes de apoio nos estados. O recuo foi decidido após pressão de parte das lideranças contrárias a proposta, que havia sido vendida pelo presidente José Sarney (PMDB-AP) como consensual.
Cassação oficializada
O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), determinou ontem a publicação da cassação do mandato do senador Expedito Junior (PSDB-RO) no Diário Oficial da Casa. Acir Gurgacz (PDT), segundo colocado nas eleições de 2006 para senador por Rondônia, deve tomar posse na terça. A decisão foi comunicada a Expedito pelo próprio Sarney, após a chegada do acórdão da Suprema Corte, no início da tarde de ontem. O mandato de Expedito foi cassado sob acusação de compra de votos e abuso de poder econômico nas eleições de 2006. Pela decisão da Justiça Eleitoral, ele ficará inelegível por três anos, período que começou a ser contado em 2006. Ele poderá concorrer a governador em 2010.
Zoghbi demitido
Depois de ser acusado de desmandos em atos secretos, utilização indevida de um apartamento funcional e de suspeitas de fraude com crédito consignado, acabou a história de João Carlos Zoghbi no Senado. A Mesa Diretora decidiu demitir o servidor que já ocupou a toda poderosa Secretaria de Recursos Humanos e sonhou ser diretor-geral. A cúpula política entendeu que, para o bem do serviço público, precisava expurgá-lo de seus quadros. O advogado de Zoghbi, Getúlio Humberto Barbosa de Sá, disse que recorrerá à Justiça Federal da decisão. Segundo ele, o processo administrativo é nulo.
Antes de cair em declínio, Zoghbi foi responsável por uma folha de pagamento de R$ 2,1 bilhões anuais. A carreira começou a ruir depois que o Correio divulgou que um luxuoso apartamento funcional estava sendo usado por um dos filhos dele, sem pagar aluguel, irregularmente. Essa revelação foi o estopim para uma série de denúncias. Ao lado do ex-diretor-geral Agaciel Maia, Zoghbi foi acusado de estar por trás dos atos secretos, decisões que escondiam aumentos salariais, nomeações e exonerações de funcionários. Ele envolveu-se, ainda, em supostas fraudes em convênios de crédito consignado no Senado realizados por uma empresa de fachada que tinha como ;laranja; sua ex-babá.