postado em 16/11/2009 08:14
Se nos corredores do Congresso os políticos dizem que as circunstâncias moldam as opiniões, o PT e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva são a prova disso. Nem de longe os atuais críticos das decisões do Tribunal de Contas da União (TCU) de paralisar obras com indícios de irregularidades lembram os combativos defensores de regras de fiscalização e controle do passado, quando eram oposição. Os petistas foram decisivos para a aprovação da Lei de Licitações, que serve de base para as recomendações do TCU de interrupção temporária de obras superfaturadas e com falhas nos processos licitatórios. Também atuaram a favor da proposta que criava a Lei Orgânica do TCU, concedendo-lhe os poderes fiscalizatórios que agora tanto incomodam. ;Em ambas as ocasiões, o PT não era apenas um defensor das propostas. Era um fanático. Queria a qualquer custo a aprovação de uma lei que impedisse fraudes na licitação e de outra que regulamentasse a capacidade do TCU de localizar e punir falhas. De tão empenhados, elaboraram junto comigo o relatório que resultou nessas leis;, diz o relator das propostas, senador Pedro Simon (PMDB-RS).
A favor da Lei 8.666/93, conhecida como Lei de Licitações, a pequena bancada do PT na época, formada por 29 parlamentares, fazia campanha pelos corredores. ;Atuamos mesmo a favor dessa lei porque sabíamos da importância dela. Vínhamos de um tempo de CPIs e corrupções no governo Collor. Em 1993, defendemos com garra uma legislação que pudesse reduzir a corrupção;, diz o líder do PT no Senado e então comandante da oposição, Aloizio Mercadante (PT-SP). ;Queríamos a proposta do Simon porque era a mais radical, a mais completa para diminuir as fraudes nas licitações;, completa o ex-deputado federal Chico Vigilante (PT-DF).
A bancada petista de outrora hoje defende mudanças na Lei de Licitações e trabalha ao lado do governo nas articulações destinadas a impor regras mais rígidas à atuação do TCU. Como a Corte utiliza a norma para opinar sobre a necessidade de paralisação de obras, PT e Planalto alegam que a lei precisa se modernizar. ;Não deixamos de apoiar a lei. O que aconteceu é que o país cresceu e vem crescendo rapidamente. Precisamos modernizar a legislação, utilizar melhor a tecnologia da internet e permitir que obras fundamentais não parem por irregularidades que podem ser sanadas;, argumenta Mercadante, um dos articuladores de projeto que altera a Lei 8.666/93.
Brechas
Segundo técnicos do TCU ouvidos pelo Correio, o maior temor com a discussão em torno de mudanças na Lei de Licitações se deve ao fato de que a norma ainda tem brechas que possibilitam a prática de atos lesivos ao erário. Citam, como exemplo, a permissão para a administração pública fechar contratos milionários sem licitação com empresas de segurança, sob o pretexto de ameaça iminente, o que na maioria dos casos não existiria. Os governistas estudam uma proposta para que o trabalho da Corte seja ampliado na área de prevenção das irregularidades. Além disso, querem a criação de uma Câmara Técnica. O novo órgão teria a função de deliberar pela paralisação ou não de uma obra com suspeitas de irregularidades. Esse colegiado seria formado por representantes do TCU e do Poder Executivo.
Em defesa do fiscal
Enquanto a cúpula do governo tenta modificar as leis que um dia defendeu, numa tentativa de acelerar as obras que estão sob sua responsabilidade, o Tribunal de Contas da União (TCU) lembra que suas decisões se baseiam nas leis aprovadas pelo próprio Congresso. De acordo com a Corte, não é apenas a Lei de Licitações que justifica a paralisação das obras, mas as propostas de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) aprovadas todos os anos por deputados e senadores.
Para o secretário-geral de Controle Externo do TCU, Paulo Wiecher, a Corte apenas cumpre o que é determinado pela legislação e segue os conceitos sobre obras irregulares previstos nos textos da LDO. ;É preciso lembrar que a legislação aprovada todos os anos já diz o que é ou não irregular. Simplesmente auditamos, checamos a situação e encaminhamos ao Congresso nosso parecer. É o Legislativo que decide se encaminha ou não recursos para essas obras nas quais detectamos as irregularidades.;
A confusão sobre as responsabilidades pelas interrupções das obras consideradas fundamentais para o governo tem causado polêmica no Congresso. Deputados e senadores adotam posições dúbias sobre as críticas feitas ao governo. Em alguns momentos, relembram a importância da Corte. Em outros, dizem que é preciso controlar o TCU para evitar que o tribunal extrapole suas competências. A fim de discutir o tema, o Senado realizou uma audiência pública na semana passada.
Numa sessão esvaziada, couberam ao coordenador da ONG Transparência Brasil, Cláudio Abramo, as principais críticas ao empenho do governo para diminuir o poder e delimitar a atuação da Corte. ;O recente embate do presidente Lula com o TCU pode ser visto como um sinal de que alguma coisa está funcionando melhor em áreas do Estado brasileiro. Mas a razão fundamental não é dita: o TCU é visto pelo Executivo como área muito dominada pelos adeptos da oposição, que estariam promovendo uma ação partidária contra o governo", opinou.
"O recente embate do presidente com o TCU pode ser visto como um sinal de que alguma coisa está funcionando melhor em áreas do Estado"
Cláudio Abramo, coordenador da ONG Transparência Brasil