postado em 26/11/2009 08:07
Na guerra travada pela Câmara dos Deputados para tentar reaver nove dos imóveis funcionais (1)da reserva técnica da Casa, nem mesmo decisões liminares da Justiça Federal têm sido suficientes para fazer com que servidores que insistem em usufruir de moradia à custa da União desocupem os apartamentos. No fim de outubro, quatro varas federais do DF concederam cinco liminares a pedido da Advocacia-Geral da União determinando a saída dos funcionários e a devolução dos imóveis para a administração da Câmara. Ninguém cumpriu a decisão até o momento. O Correio visitou os apartamentos e conversou com síndicos e porteiros. Todos confirmam a permanência dos servidores e avisam que, apesar de a decisão judicial ser comentada nos prédios, ninguém demonstrou intenção de deixar os imóveis. Os moradores apresentaram recursos e, de acordo com a tramitação dos processos, pretendem aguardar até o julgamento final do mérito, o que pode levar anos. Além dos cinco processos já analisados, outros quatro aguardam decisão dos juízes. ;Ficamos otimistas com essas decisões judiciais. Tentamos acordos e não teve jeito. Partimos para a briga jurídica, mas confesso que não tenho acompanhado passo a passo essa história para saber se eles estão ou não desocupando os apartamentos. Tudo está nas mãos da advocacia-geral;, comenta o quarto-secretário da Câmara, Nelson Marquezelli (PTB-SP). Ele é responsável por implementar o ato assinado pela Mesa Diretora que antecedeu sua gestão e determinou a devolução dos imóveis da reserva técnica (leia memória).
Apesar da primeira vitória da Câmara, o processo de julgamento poderia ter sido mais ágil. Em abril, o quarto-secretário anunciou que entraria com ações de despejo, mas só em 17 de junho a AGU recebeu o pedido. Como a Câmara enviou documentação incompleta, a advocacia requereu mais dados e recebeu as respostas em 9 de outubro. As ações foram preparadas e ajuizadas em 16 de outubro e no dia 22 saiu a primeira liminar.
Entre os cinco servidores contra os quais há liminar a favor da ordem de despejo estão quatro apadrinhados políticos e um servidor efetivo. Carmélia dos Santos é comissionada na liderança do DEM e há quase 10 anos cedida para o gabinete do deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA). Ela ainda não deixou o apartamento no Cruzeiro que ocupa, apesar da decisão judicial de 21 de outubro. Renato Diniz, que mora na 114 Sul, é secretário parlamentar de Ciro Nogueira (PP-PI) e a liminar determinando sua saída foi deferida em 23 de outubro. Indicadas pelo ex-deputado João Caldas para ocupar imóveis funcionais estão duas assessoras da liderança do PR, Maria Tereza Buaiz e Rosana Rodrigues. A favor da saída da primeira foi concedida liminar em 22 de outubro, enquanto a decisão determinando o despejo de Rosana foi publicada no último dia 6.
Silvio Pereira é funcionário da coordenação de engenharia e integra o quadro efetivo. Ele é um dos articuladores das negociações malsucedidas para a permanência dos servidores. Em 22 de outubro, a 3; Vara Federal do DF determinou de forma liminar a desocupação do apartamento na 308 Norte onde ele vive com a família. A reportagem esteve nos imóveis ocupados pelos cinco funcionários. Nenhum morador foi encontrado.
1 - Padrinho é pré-requisito
Os imóveis funcionais são pertencentes à União e servem, em teoria, para custear a moradia de servidores e políticos de outras cidades que se mudam para a capital a trabalho. Com o tempo, passaram a ser objetos de barganha, a ponto de apenas funcionários com ;padrinhos; conseguirem ocupá-los. No caso dos imóveis da Câmara, os moradores pagam despesas de luz, condomínio e uma taxa de ocupação de R$ 79 a R$ 600. Bem abaixo do que gastariam pelo aluguel de apartamentos com cerca de 140m; em áreas valorizadas do Plano, onde o metro quadrado supera os R$ 6 mil.
Memória
Daqui eu não saio
A guerra entre a Câmara e os ocupantes dos imóveis funcionais da reserva técnica ganhou os primeiros contornos em 22 de março deste ano, quando terminou o prazo concedido pela Mesa Diretora para que os funcionários desocupassem os apartamentos pertencentes à Casa. Apesar de um ato aprovado pelos deputados pedir a devolução, 18 dos 24 moradores não arredaram pé das moradias.
Na época, foi apresentado um ofício assinado por 24 funcionários alegando que o Ato n; 31/2008, assinado pelo então presidente Arlindo Chinaglia (PT-SP), teve caráter sumário. O mesmo documento trazia o argumento de que o prazo de 90 dias concedido para a desocupação era curto. Os servidores afirmavam, ainda, que a justificativa apresentada pela antiga Mesa, de que a devolução dos imóveis representaria economia de gastos, não fazia sentido, visto que seis apartamentos da Câmara estavam desocupados, acumulando custos de condomínios e taxas extras pagas pela Casa.
Levantamento do Correio feito na época encontrou diversas irregularidades na ocupação de casas e apartamentos funcionais. Havia moradores demitidos da Câmara havia meses e que insistiam em morar à custa da União, e até filho e amigos de ex-parlamentares ocupando apartamentos de três quartos, mesmo sem vínculo com o parlamento. Depois das denúncias, a maioria dos irregulares saiu dos imóveis. Ainda assim, a Advocacia-Geral da União precisou apresentar nove ações de despejo. (IT)