Acusado judicialmente de promover demissões sumárias de advogados do Banco do Brasil, o chefe do departamento jurídico da instituição, Joaquim Portes de Cerqueira César, sustenta-se no cargo por causa do padrinho forte: o presidente do PT, deputado federal Ricardo Berzoini (SP). É ele quem mantém um veto à decisão do Conselho Administrativo do BB, do início do mês, de demitir Cerqueira devido às denúncias de assédio moral (1)aos advogados. O presidente do banco, Aldemir Bendine, queixou-se recentemente a Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do indicado de Berzoini. Carvalho é avalista da nomeação de Bendine, no cargo desde abril passado.
Na quarta-feira, o Correio mostrou que o diretor jurídico é citado em ação do Sindicato dos Bancários de Brasília por supostamente perseguir profissionais e rebaixá-los de suas funções. Há casos de demissões sem que advogados tenham respondido a inquéritos administrativos, uma pré-condição para saída de funcionários do banco. No processo que corre na Justiça trabalhista da capital, Cerqueira é apontado como o responsável por nomear apadrinhados para altos postos jurídicos do banco sem levar em conta normas internas de ascensão na carreira. A coincidência é que parte dos advogados de carreira indicados por ele fez doações eleitorais em 2006 a Berzoini. O presidente do PT é funcionário de carreira do Banco do Brasil.
Dez funcionários da instituição doaram R$ 83 mil dos R$ 2 milhões arrecadados na última campanha do atual presidente do PT. Seis deles são da área jurídica e tiveram ascensão funcional na gestão de Cerqueira. Um dos principais exemplos foi Paulo César Guerche, com subida meteórica em dois anos: de advogado a gerente-geral do núcleo jurídico de Ribeirão Preto (SP) e, por último, gerente-executivo jurídico de Unidade Estratégica em Brasília. Doou R$ 9 mil. ;Todos os que doaram (para Berzoini) estão em altos postos do jurídico. Algum privilégio há;, afirmou o vice-presidente da Associação Nacional dos Advogados do BB (Asabb), Gilberto Eifler.
Só este ano, representantes dos advogados afirmaram ao Correio terem agendado três encontros com o presidente do PT para conversar sobre a situação de Cerqueira. Em vão. Numa das ocasiões, segundo o relato de um dos presentes, Berzoini disse que não poderia fazer nada sobre o caso. No último deles, na sede do partido em Brasília, há cerca de dois meses, o deputado nem sequer recebeu os advogados. Entre eles, o presidente da associação da Asabb, Cláudio Lamachia, que veio do Rio Grande do Sul para conversar com Berzoini. O presidente do PT não compareceu ao encontro.
Milhões
Os dois anos de gestão de Cerqueira já renderam até uma condenação milionária ao banco. Estima-se que existam 30 ações movidas país afora envolvendo assédio moral na área jurídica da instituição. O setor tem cerca de 750 advogados. Além do DF, há processos em São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Maranhão, em vários casos com as seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil como assistente jurídico. O advogado Francisco de Sales Felipe, 53 anos, é um dos que já tiveram vitórias judiciais. Juntamente com quatro colegas do jurídico em Natal (RN), Sales foi demitido, segundo ele, sem qualquer processo administrativo de perda de cargo, pré-requisito previsto em lei. Foi informado pessoalmente em 7 de junho do ano passado da decisão por Paulo César Guerche, homem de confiança de Cerqueira.
Uma semana depois, Sales entrou com ação na Justiça trabalhista para voltar ao cargo. ;Foi um ato ilegal, truculento e imoral;, afirmou. Sales obteve decisão favorável para ser reintegrado imediatamente. Mas sem plenos poderes: o banco, diz, não lhe deu procuração para advogar. Teve que ir novamente à Justiça e, apenas em setembro passado, conseguiu direito a atuar para a instituição. ;Espero que se faça Justiça;, disse o advogado potiguar, 27 anos de banco, 10 deles na área de advocacia. Por descumprimento da decisão, a Justiça determinou o pagamento de R$ 1,5 milhão a Sales.
1 - Dois pesos
Segundo a ação do Sindicato dos Bancários de Brasília, 17 advogados perderam suas funções ou foram demitidos sem processos internos. Desses, 10 voltaram aos cargos pela via judicial e os demais esperam decisão. Quatro advogados foram promovidos pelo diretor-jurídico, Joaquim Portes Cerqueira César, sem que fossem atendidos os critérios internos de ascensão.
Influência rechaçada
O presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), afirmou ontem que não tem responsabilidade ou ingerência na gestão do diretor jurídico do Banco do Brasil, Joaquim Portes de Cerqueira César. O chefe dos advogados é acusado em ações na Justiça de assediar moralmente seus subordinados. ;Eu seria uma pessoa muito poderosa se tivesse esse grau de influência para manter alguém que tivesse motivos para sair do cargo;, disse Berzoini.
O petista negou também ser o padrinho da indicação de Cerqueira. ;Não indiquei, embora saiba que ele tem uma carreira de grande respeito no banco;, completou o deputado, segundo quem a própria instituição tem critérios para tratar de nomeações de profissionais. Embora negue ser padrinho de Cerqueira, Berzoini admitiu ter conversado, desde as eleições municipais de 2008, com representantes dos advogados sobre a gestão do atual diretor jurídico. Contudo, o presidente do PT disse-lhes que não poderia fazer nada.
Berzoini disse que é amigo do presidente do BB, Aldemir Bendine, e do chefe de gabinete do presidente Lula, Gilberto Carvalho, mas nenhum deles teria se queixado da atuação de Cerqueira. ;Por razões de maledicência, essa história já vem abundando. Querem apontar vínculos indevidos por causa das relações de amizade que tenho com as pessoas e problemas de competência do próprio banco;, frisou. O presidente do PT não quis comentar a relação entre a ascensão funcional de advogados que contribuíram para sua campanha.
;Não vou comentar declarações de terceiros;, disse. A assessoria de imprensa do Banco do Brasil limitou-se a dizer que o diretor jurídico ficará no cargo, sem confirmar a decisão do Conselho de Administração de retirar Cerqueira do cargo. Procurado há dois dias pelo telefone no gabinete, Cerqueira não retornou os pedidos de entrevista.