postado em 29/11/2009 09:00
A Hemobrás ainda não saiu do papel, cinco anos após a sua criação. Mas já rendeu muitas viagens internacionais aos seus diretores, a maioria delas a Paris. Num período de dois anos, em 2007 e 2008, foram feitas 40 viagens ao exterior, sendo 26 à capital francesa. Somados todos os diretores, foram 173 dias no exterior. A despesa com diárias alcançou R$ 129 mil. E ainda falta contar o preço das passagens, todas na classe executiva. O então presidente, João Baccara, e o diretor-técnico, Luiz Amorim Filho, foram sete vezes a Paris. Estiveram ainda em Madri, Bruxelas, Caracas, Kyoto, Hilden e Washington, percorrendo quatro continentes.Oficialmente, as viagens à França tiveram por objetivo a negociação do contrato de transferência de tecnologia para fracionamento de plasma fechado com o Laboratório Francês de Biotecnologia (LFB), no valor de R$ 16 milhões. Mas o procurador do Ministério Público do Tribunal de Contas da União (TCU) Marinus Marsico contesta a real necessidade dos deslocamentos: ;Acho despropositado. O que nos chama a atenção é que são justamente as pessoas que ocupam as funções de confiança. Não observo viagens de técnicos. Vejo viagens de dirigentes, o que não me parece muito lógico numa viagem com o objetivo de se fazer uma transferência de tecnologia;. Ele disse que vai requisitar a documentação à estatal para verificar exatamente o motivo das viagens e quais os resultados. ;Vamos verificar o mérito disso;, completou.
No Diário Oficial da União, está expresso o ;objetivo; das viagens autorizadas pelo ministro da Saúde, José Gomes Temporão. Os temas são recorrentes: avaliação do projeto básico da planta, discussão e conclusão da planta, avaliação final do projeto básico, discutir projeto executivo. Depois de toda essa discussão, o TCU apontou sobrepreço e fraude em licitação no projeto da fábrica da Hemobrás, em Goiana (PE), e paralisou a obra. O objetivo do empreendimento é tornar o Brasil autossuficiente na produção de albumina, imunoglobulina e dos fatores de coagulação 8 e 9. (Leia mais na página 3).
Seminários
As viagens dos diretores da Hemobrás tinham várias motivações. Além de participar das negociações em Paris, eles visitaram fábricas em Bruxelas e Ieper, na Bélgica, e em Chitose, no Japão. Também estiveram em congressos em Madri e Kyoto, no Japão. Baccara acompanhou ainda uma comitiva do governo de Pernambuco a Washington, para ;buscar parceiros; para o polo farmacoquímico do estado. Esteve também em Caracas, duas vezes, discutindo parcerias com o governo da Venezuela. A diária para viagens à Europa fica em R$ 788. Para os demais países, em R$ 553. Ele deixou a presidência da estatal em agosto deste ano.
[SAIBAMAIS]Questionado se parte das negociações com os franceses não poderia ser feita por e-mails ou videoconferências, respondeu que as negociações presenciais eram fundamentais. ;Na maior parte das viagens, nós tínhamos que discutir os projetos. Eram mil planilhas. Não dava para fazer isso por via eletrônica, ou por e-mail, como se fazia em muitas ocasiões. Quando nós discutíamos lá, trazíamos as discussões para a empresa. A partir das discussões com a nossa equipe, nós discutíamos por e-mails com eles, várias vezes, por telefone. Mas chegavam certos momentos;;
Baccara defendeu a necessidade das viagens. ;Nós estamos trabalhando em cima de um processo de alta complexidade, de transferência de uma tecnologia que o Brasil não detém;. E acrescentou que todos os membros da diretoria eram ;especialistas;, seja em medicina, na área de engenharia ou na administrativa. ;A transferência independe de ter um terreno ou um prédio. Ao contrário, estávamos lá exatamente para discutir que prédio nós colocaríamos naquele terreno e, dentro daquele prédio, qual a tecnologia, quais os produtos que estaríamos fracionando dentro da fábrica;, argumentou. Lembrou que os quatro diretores eram, ainda, ;os integrantes do comitê gestor do processo de transmissão de tecnologia;.
Também participaram das viagens o diretor técnico, Luiz Amorim Filho, o gerente de engenharia, Jorge Batista Cavalcanti, o gerente de fracionamento, Dario Pinto Miranda, e a gerente de biotecnologia, Eva de Almeida Fontes. A atual diretoria da Hemobrás afirmou que as reuniões precisavam ser frequentes e presenciais porque, a cada etapa do projeto, houve inúmeras decisões a serem tomadas, muitas das quais requeriam longas discussões com a equipe de técnicos do Laboratório Francês. ;A análise de plantas e de alternativas tecnológicas por reuniões virtuais são muito mais difíceis e muito menos eficazes do que as reuniões presenciais;, diz nota da estatal.