Politica

Filme que não muda os votos

No primeiro dia de projeção de Lula, o filho do Brasil, espectadores entrevistados pelo Correio veem na obra sentido histórico, não eleitoreiro

postado em 02/01/2010 09:15
As 36 pessoas, numa sala que comporta 173, poderiam ser interpretadas como uma evidência clara de um fracasso estrondoso. Na primeira sessão de cinema do primeiro dia do ano, porém, o prognóstico é completamente contrário. %u201CSinceramente, nunca vi tanta gente nesse horário das 14h e depois de uma virada de réveillon, acho que a fita será um sucesso%u201D, profetiza Paulo Dayrell, gerente do Embracine. No que depender das impressões dos espectadores iniciais de Lula, o filho do Brasil, que estreou ontem em todo o país, o longa vai mesmo atrair multidões. A discussão sobre o cunho eleitoreiro do filme parece passar longe da primeira leva de pessoas que fez questão de ir ao cinema logo na estreia da produção, orçada em 12 milhões, uma das mais caras da indústria cinematográfica brasileira. %u201CÉ um registro de uma parte importante da história do Brasil tendo a vida do Lula como fundo. Não considero um filme com fins políticos, acho que não mudará em nada a percepção das pessoas%u201D, afirma o médico José Carlos Natal de Moraes Filho, 36 anos, ao sair do cinema com a família. Nem a pequena Jade, filha de José Carlos e Shu Yating, escapou do primeiro programa dos pais em 2010. %u201CEu queria ficar na brinquedoteca, mas estava fechada, então eu entrei com eles. Mas no final foi legal ver a história do presidente%u201D, fala a menina de 9 anos. Com a mesma simplicidade da filha, Shu Yating destaca ter se surpreendido com alguns fatos da vida do presidente. %u201CEu não sabia, por exemplo, que a primeira mulher dele tinha morrido no parto. É uma história interessante%u201D, diz. Avaliação semelhante tem o professor Antônio Villar, de 52 anos. O homem que não esconde ter votado quatro vezes em Lula define os 128 minutos da fita dirigida por Fábio Barreto(1) como uma %u201Cobra de arte%u201D. %u201CMostra coisas importantes do país, como as arbitrariedades, as prisões, a tortura. Além de detalhes da vida do Lula que eu não conhecia, apesar de ter sido seu eleitor%u201D, diz o professor. Um dos fatos que chamaram a atenção de Antônio foi o alcoolismo de Aristides Inácio da Silva, o pai do presidente, interpretado por Milhem Cortaz. Ele também desconhecia a traquinagem do irmão de Lula, Jaime, que escreve uma carta ditada por Aristides totalmente ao contrário do que lhe era falado. Enquanto o nordestino rude mandava dona Lindu ficar no sertão pernambucano, o filho dizia, na correspondência, que a ordem era vender tudo e ir encontrar Aristides em São Paulo. O que mais arrancou elogios de Antônio e de muitos outros espectadores que assistiram à primeira sessão de Lula, o filho do Brasil no Distrito Federal, ontem, foi a atuação de Glória Pires, que quase rouba a cena do protagonista, vivido pelo ator Rui Ricardo Dias, ao encarnar dona Lindu. A antropóloga Márcia Gramkow, 59 anos, também gostou da performance da global, mas chama a atenção para o talento de Felipe Falanga, que faz Lula com sete anos. Para ela, a fita nada tem de oportunista, mesmo sendo lançada em época de eleição em 320 cópias, mais que as 303, consideradas um recorde, de Dois Filhos de Francisco. A filha de Márcia, Gabriela, psicóloga de 28 anos, pensa da mesma forma. E provoca: %u201CPara quem se coloca contrário ao Lula, é claro que o filme deve incomodar, mas não vejo como propaganda política%u201D, diz. Anistia Apesar de traçar a trajetória de Lula do nascimento, em Pernambuco, até o período em que ele se torna a principal liderança dos sindicalistas no ABC paulista, uma questão bem atual é mencionada no filme. Em certo momento, quando está preso em pleno regime militar, Lula comemora a aprovação da Lei da Anistia, que livra de qualquer acusação pessoas que cometeram crimes políticos ou conexos no período ditatorial. Está em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação para definir a abrangência exata dessa legislação: se os torturadores podem ser beneficiados, ou seja, anistiados, o que enterra qualquer possibilidade de punição. O mais recente capítulo das divergências envolvendo o tema veio à tona na última semana de 2009, quando o ministro da Defesa, Nelson Jobim, ameaçou entregar o cargo caso o presidente Lula não revisse o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos, que, entre outras diretrizes, recomenda a criação de uma Comissão da Verdade para investigar a conduta de militares durante a ditadura. É um dos primeiros assuntos na lista de Lula em 2010. 1 - Melhora sensível Internado desde 19 de dezembro, após sofrer um acidente de carro e ter traumatismo craniano, Fábio Barreto apresentou melhora considerável, segundo o boletim médico mais recente divulgado no último dia 30. Com o quadro neurológico mais estável, os médicos puderam retirar o cateter de medição da pressão intracraniana do diretor, que continua sedado. O número R$ 12 milhões orçamento estimado do filme, uma das mais caras produções da indústria cinematográfica brasileira Eu acho... Márcia Gramkow, 59 anos, antropóloga Achei o filme bonito, delicado e bem feito. Não considero que tenha teor eleitoreiro, até porque em duas horas, o conteúdo político, que é a parte do sindicalismo, aparece de forma reduzida. Não tem quase nada da trajetória política do Lula. Lógico que cada um terá a sua interpretação Guilherme Santos, 28 anos, engenheiro de produção A fotografia é boa e, ao contrário do que todo mundo anda falando, acredito que não há intenção de campanha no filme, que não fala de feitos políticos do Lula, mas, sim, da história sindical de São Paulo, que é um marco no nosso país e deve ser entendida dessa forma Antônio Villar, 52 anos, professor É uma história de amor entre mãe e filho, além de retratar a situação de milhões de brasileiros que saem do sertão em busca de vida melhor. Sobre o ano ser de eleições, acho que o trabalho que o Lula vem fazendo é maior do que a eventual popularidade que um filme possa trazer

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