Patrícia Aranha
postado em 03/01/2010 17:43
Não há um PT pós-Lula. O presidente, que está no último ano de mandato, continuará dando as cartas no partido que fundou há 30 anos, mesmo que a candidata que escolheu como sua sucessora, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, não vença a eleição presidencial. Qualquer que seja o resultado, acreditam os analistas, Lula poderá estar de volta ao Planalto daqui a quatro anos. Todos os passos dados por ele em 2009 indicam que tem fôlego para tanto. O motivo é um só: não existe no partido ninguém com o carisma e a popularidade do presidente.
O partido enfrenta este ano a sua primeira eleição presidencial sem Lula como candidato, mas, se depender do Planalto, a disputa se dará como se ele ainda estivesse no páreo. É o que o governador Aécio Neves (PSDB) chamou de "armadilha da eleição plebiscitária", quando conclamou o PSDB a não cair nela. Essa seria a primeira constatação de que Lula não tem intenção de deixar o poder, depois de descer a rampa.
O sociólogo Rudda Ricci, um ex-petista que fundou o partido em São Paulo, lembra que, por colar sua imagem à da ministra-candidata, uma eventual vitória de Dilma será creditada exclusivamente a Lula. "Se Dilma ganhar, cede a vez a Lula em 2014. Se for José Serra (PSDB) o vencedor, ele terá que disputar com Lula daqui a quatro anos. O que ouvi até de alguns ministros é que, assim que deixar o governo, Lula vai chefiar um instituto para se dedicar à África, consolidando um perfil de estadista mundial de olho no retorno a Brasília. A história do PT continuará atrelada a história do Lula pelo menos nos próximos 10 anos", apostou.
Um dos signatários do manifesto de fundação do PT, o mineiro Wagner Benevides, também aposta na volta de Lula. "Se Dilma fizer um bom governo, Lula tem muitas chances de voltar, mas, se por um motivo qualquer, perdermos a eleição para o Serra, Lula é o melhor nome para recuperar a Presidência", afirma.
Trator
A decisão do presidente Lula de comandar a sua própria sucessão fez estragos na democracia interna do partido. A cientista política Sandra Starling, apesar de filiada ao PT, avisa que não vai pedir votos para Dilma. "Não faço parte desse PT submisso ao lulismo. Sou tão fundadora do partido quanto o presidente. Como se fosse um imperador, Lula indicou uma pessoa que o partido não conhece direito, que precisa ser apresentada à militância pelo país afora", criticou.
A pouca vivência partidária de candidata indicada por Lula é lembrada pelo cientista político Leonardo Avritzer, da UFMG, como um fator que poderá, num eventual governo Dilma, separar ainda mais o partido do governo. "Como lideranças históricas do partido, como o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e o ex-presidente José Genoino perderam viabilidade eleitoral depois do escândalo do mensalão, a escolha de uma candidata não identificada com o petismo parece fazer sentido. Lula, que já havia separado partido e governo no segundo mandato, parece mais interessado em preservar o lulismo. Se Dilma vencer, a separação entre estado e partido será muito maior", avalia.
Aproximação com os tucanos
O sociólogo Rudda Ricci, que está escrevendo um livro sobre o lulismo - considerado por ele como um neogetulismo, referindo-se ao potencial político eleitoral do carisma do ex-presidente Getúlio Vargas, que prevaleceu sobre o PTB - acredita que só haverá uma outra reconfiguração política, sem a volta de Lula ao Planalto, se houver aproximação entre PT e PSDB, o que já foi admitido tanto por Lula quanto pelo governador Aécio Neves (PSDB).
"Se Aécio Neves se eleger senador este ano e o Serra não vencer as eleições, há grandes chances de aproximação entre PT e PSDB no futuro. Não seria uma fusão, mas uma nova configuração política, com uma aliança entre os dois partidos que polarizam a cena há mais de 10 anos. O PSDB não paulista tem tudo para se aproximar do lulismo e teremos uma nova configuração política em que Aécio pode até ser o presidente", arrisca.
Para ele, a aproximação será facilitada se o PT mineiro não vencer as eleições para o governo. "Para que este cenário de aproximação aconteça são muitas as variáveis. O Patrus Ananias (ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome) precisa perder a disputa interna para o Fernando Pimentel (ex-prefeito de Belo Horizonte), que é mais próximo de Aécio. Depois, o PT precisa perder o governo mineiro para o PSDB ou para um PMDB ligado a Aécio, e Serra precisa perder a disputa presidencial. Pelos cenários apresentados até agora, todas as variáveis são mais do que possíveis", argumenta.
Matriz
Já a cientista política Rachel Meneguello, estudiosa do PT, não acredita em aproximação com o PSDB. "Não vejo uma junção possível. Os partidos têm matriz de formação distinta, têm projetos de poder distintos, agendas políticas de governo com diferenças importantes", argumenta.
Para Meneguello, a principal herança de Lula deverá ser avaliada pelas urnas, na capacidade dele de transferir votos para a candidata do PT. Mesmo sem ser o candidato em 2010, Lula continua como referência para os filiados que devem vestir a camisa de Dilma Rousseff.
O efeito sobre o restante do eleitorado, é difícil de prever. "Para dentro do PT, a aderência entre Lula e o candidato do governo terá um caminho natural. Para o eleitor , essa aderência é potencial, mas incerta. É o que precisamos dimensionar já na campanha", avalia. (PA)