Politica

Ao suprimir o termo de decreto, Lula apazigua ânimo de militares sem causar mal-estar em ativistas

Mas, nos bastidores, membros do próprio governo acreditam que programa não sairá do papel

postado em 14/01/2010 07:06
Diante das divergências públicas entre ministros em torno do texto do decreto que institui o Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pensou e repensou mudanças, ameaçou modificar a posição governista sobre temas polêmicos e fez reuniões secretas para analisar e ouvir as posições de setores da sociedade. Apesar da encenação, decidiu pelo caminho mais simples e mudou apenas três palavras do texto.

Surpreendentemente, Lula conseguiu acalmar os ânimos de integrantes da cúpula governista que chegaram até a anunciar pedidos de demissão. Na prática, membros do próprio governo acreditam que o presidente fez quase nada para acabar com as divergências porque, nos bastidores, todos admitem que as propostas possuem chances quase nulas de avançar, já que a maioria deve emperrar no Congresso.

Apesar da consciência de que o plano não deve ter resultados práticos, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e o secretário de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, passaram dias sustentando posições divergentes em torno das propostas. Jobim e os comandantes das Forças Armadas ameaçaram pedir demissão diante da ideia de criação de uma Comissão Nacional da Verdade para apurar casos de violação de direitos humanos no ;contexto da repressão política;. Já Vannuchi preparava-se para reagir caso o texto do qual é mentor fosse modificado para beneficiar os militares. E se irritou com a possibilidade de Lula retirar o trecho do programa que descriminaliza o aborto e permite o casamento homossexual.

Para acabar a batalha sem declarar vencedores, Lula assinou um novo decreto ontem, suprimindo a expressão ;contexto da repressão política;, que motivou a discórdia, e também criou um grupo de trabalho para elaborar um projeto de lei que instituirá a Comissão da Verdade. Segundo o documento, o grupo deverá ;examinar as violações de direitos humanos (...) a fim de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional;.

Nenhum ministro reclamou. Jobim disse que estava satisfeito e representantes dos direitos humanos não viram na nova redação qualquer ameaça ao teor do programa. ;O importante é que a ideia de apurar amplamente a violação aos direitos humanos irá permanecer;, avalia o presidente da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos, Marco Antonio Barbosa.

Repercussão
Apesar de o imbróglio estar aparentemente resolvido, alguns setores da sociedade se manifestaram contrários ao plano. O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, afirmou que a mudança no processo de reintegração de posse de terras invadidas, prevista no documento, cria ;insegurança jurídica;. Já a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) criticou algumas diretrizes do programa, como o apoio a projetos de lei que tratam da descriminalização do aborto e da proibição de símbolos religiosos em espaços públicos.

Lula até anunciou que poderia rever os textos que tratavam desses temas polêmicos, mas manteve tudo como antes. Tudo porque o PNDH é apenas um aglomerado de intenções. Caberá ao Congresso editar leis para normatizar os temas. Algo difícil de acontecer, ainda mais em ano eleitoral.

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