postado em 31/01/2010 10:21
O diretor-executivo da Escola Judiciária Eleitoral, José do Carmo Veiga de Oliveira, pergunta às 40 adolescentes que cumprem medidas socioeducativas no Centro de Reeducação Social São Jerônimo, em Belo Horizonte. "Alguma de vocês teria coragem de vender o voto?" As garotas se entreolham. Inquietam-se nas cadeiras. Uma dispara: "Eu tenho. Deus compreende, porque a gente está precisando do dinheiro". Na sequência, outra retruca: "Vendo e voto em quem quiser". Uma terceira emenda: "Que dia vai ter um político que não rouba, para dar futuro pra gente?".
O debate se acalora à medida que o palestrante e juiz José do Carmo argumenta em defesa da importância do voto, "maior expressão da cidadania", para a construção do "país que queremos". A maioria das meninas com mais de 16 anos já tem o título, desde que a Justiça Eleitoral mineira, no ano passado, fez o cadastramento das internas que manifestaram intenção de votar. "A expressão do voto é um caminho para que essas adolescentes passem a se perceber como integrantes da sociedade", acredita Luciana Cândido, diretora-geral da unidade.
A expectativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é de que, por trás dos muros, em todo o país, 149.514 presos provisórios e 15,5 mil adolescentes sob regime de internação, em idade para votar, manifestem o direito de ir às urnas nestas eleições gerais. Em portaria conjunta, o TSE e o CNJ constituíram uma comissão para viabilizar a logística.
Uma audiência pública no TSE vai debater o tema esta semana. As diversas entidades envolvidas na causa aguardam resolução do TSE regulamentando a instalação das urnas eletrônicas nas unidades carcerárias. Entretanto, dificilmente os tribunais regionais eleitorais conseguirão levar toda a população de presos provisórios às urnas neste pleito. Os projetos-piloto em curso ainda avançam a passos lentos.
Onze estados brasileiros já implantaram experiências de urnas bem-sucedidas em unidades carcerárias provisórias. O primeiro foi Sergipe, em 2000. "Além do estado, em 2002 tivemos urnas eletrônicas em presídios no Acre, no Pará e em Pernambuco", afirma a juíza da 16ª Vara Criminal de São Paulo, cofundadora e ex-presidente da Associação Juízes para a Democracia, Kenarik Boujikian Felippe. "Em 2008, foram 11 estados. A experiência foi levada também para Amapá, Ceará, Maranhão, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Rio de Janeiro. Em todos, a votação ocorreu sem incidentes", acrescenta a juíza.
Entraves
A implantação do voto do preso provisório e do adolescente em medida socioeducativa apresenta, contudo, dificuldades. A principal é a alta rotatividade de presos. Entre a data do encerramento do cadastro eleitoral - seja para o alistamento ou transferência do título - e o pleito, muitos presos podem ter sido liberados ou transferidos. Aqueles que tiverem sido presos depois do alistamento, previsto para 5 de maio, também não poderão votar porque estarão impedidos de se deslocar até a seção eleitoral.
DIREITOS SUSPENSOS
A perda dos direitos políticos do cidadão se dá em hipóteses específicas, descritas no artigo 15 da Constituição de 1988, entre elas, a condenação criminal, com trânsito em julgado, enquanto perdurarem os seus efeitos. Não há na Constituição a hipótese de suspensão do direito ao voto em razão de prisão provisória. Na prática, o que a prisão provisória faz é impedir o deslocamento da pessoa até a sua seção eleitoral.