postado em 04/02/2010 08:54
Os deputados voltaram das férias dispostos a promover uma rebelião por causa das mudanças nas regras para a liberação de emendas parlamentares destinadas à promoção de eventos de ;divulgação do turismo interno;, um guarda-chuvas que abriga desde shows de artistas famosos a todo o tipo de festas ou de feiras que possam ser caracterizadas como tal dentro do orçamento do Ministério do Turismo. Muitos ficaram irritadíssimos com o fato de o governo engessar o setor depois que o Orçamento já estava aprovado. Agora, além de convocar o ministro Luiz Barreto em busca de uma solução aos recursos injetados via emendas individuais, os parlamentares querem propor uma troca: em vez de liberar a verba dessas emendas para shows, que o governo destine tudo para ;infraestrutura turística;, que os deputados comparam a um imenso guarda-sol, capaz de abrigar de calçamento de ruas a teatros.;Realmente, existe um movimento, mas as regras dificilmente serão alteradas. Entretanto, como os deputados fizeram as emendas pelas normas antigas, há essa sugestão de troca de evento por infraestrutura para não ver desperdiçados os recursos das emendas individuais;, explica o líder do PR, deputado Sandro Mabel (GO), que disse ter ouvido reclamações dos integrantes de seu partido logo no primeiro dia de funcionamento do Congresso neste ano.
As normas de liberação das emendas para shows e eventos foram mudadas no princípio de janeiro, depois de diversas reportagens que, ao longo de 2009, levantaram fraudes em prestações de contas desses eventos. Em Minas Gerais, por exemplo, o Correio e o Estado de Minas apontaram suspeitas de fraude e superfaturamento na contratação de empresas de eventos e no pagamento de cachês aos artistas escolhidos para apresentações em pequenos municípios do leste do estado, beneficiado com R$ 11 milhões em emendas desse setor. Ao longo do ano, foram dezenas de denúncias em diversos jornais e revistas, ao ponto de, em novembro, o ministério editar uma portaria que fixou um teto para os cachês: R$ 80 mil.
Emendas
Essa primeira mudança não inibiu a apresentação de emendas para o setor no ano eleitoral. Só para eventos, são R$ 798 milhões previstos no orçamento do ministério para 2010 ; cinco vezes maior do que o valor estipulado para ;apoio a obras preventivas de desastres; no Ministério da Integração Nacional, R$ 156,9 milhões. E muito mais que os R$ 212 milhões inscritos para projetos de irrigação.
Diante de um valor tão alto, o governo estava decidido a não se expor a uma avalanche de denúncias semelhantes àquelas publicadas em 2009, ainda mais em se tratando de um ano eleitoral ; quando não é incomum, durante um show, o apresentador anunciar a presença do ;querido amigo;, deputado fulano de tal, que ajudou a levar os recursos para a realização da festa.
Ira
As novas regras deixaram parte dos deputados irados porque atrelaram a quantidade de recursos para eventos custeados com emendas individuais dos deputados aos dados populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por exemplo, uma cidade com até 20 mil habitantes poderá receber, por ano, até R$ 200 mil. Ocorre que muitos deputados destinaram mais recursos a pequena cidades e não querem, como eles dizem nos bastidores, ;desperdiçar a emenda;. Além disso, haverá uma tabela de preços disponível para os mais diversos tipos de eventos e montagem de festas, que deverá servir de base para os valores praticados nessa área quando custeados com recursos públicos.
A proposta de Mabel, de transferir as emendas da área de eventos para infraestrutura turística, não é pacífica dentro do governo e nem mesmo entre técnicos do Congresso Nacional. Precisaria, por exemplo, de um crédito suplementar pedido pelo Poder Executivo para tirar recursos de uma área para outra. Isso levaria tempo, com o risco de comprometer o cronograma de liberações anterior ao calendário eleitoral(1). Além desse problema, a infraestrutura turística inscrita no Orçamento deste ano pode ser comparável à procura de passagens aéreas para Salvador, Recife e Rio de Janeiro neste carnaval. Os técnicos garantem que ;não dá para aceitar nem lista de espera;. São R$ 2,4 bilhões de recursos previstos para essa finalidade, a mais badalada do Ministério do Turismo. Não é à toa que os deputados estão ávidos para ouvir do ministro Luiz Barreto o que ele pode fazer pelos políticos num ano eleitoral.
1 - Proibição
O calendário eleitoral divulgado pelo Tribunal Superior Eleitoral estabelece que, a partir de 3 de julho, o governo está proibido de realizar transferências voluntárias de recursos da União para estados e municípios, a não ser em casos de obras já em andamento ou em casos de calamidade pública. Isso significa que os R$ 156 milhões previstos para desastres, dizem os técnicos, têm muito mais chances de liberação dos que os R$ 798 milhões reservados para eventos.
"Realmente, existe um movimento, mas as regras dificilmente serão alteradas. Entretanto, como os deputados fizeram as emendas pelas normas antigas, há essa sugestão de troca de evento por infraestrutura para não ver desperdiçados os recursos das emendas individuais"
Deputado Sandro Mabel (GO), líder do PR