postado em 10/02/2010 08:26
O governo usará os transtornos provocados pelas chuvas como trunfo na campanha eleitoral. Por decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, será incluída no chamado PAC 2, a ser lançado em março, uma previsão de novos investimentos na prevenção de enchentes. A ideia é usar o palanque oficial a fim de minar a pré-candidatura presidencial do governador de São Paulo, José Serra (PSDB). Fustigá-lo ao sugerir a seguinte comparação: enquanto os tucanos não conseguem solucionar o problema, apesar de estarem há 15 anos à frente da administração paulista, Lula e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), têm projetos e recursos para acabar com o calvário enfrentado pela população do maior colégio eleitoral do país.;Será uma ofensiva subliminar;, diz um líder petista que trabalha na campanha da ministra. Em sintonia com a cartilha do Palácio do Planalto, Dilma manterá a linha ;paz e amor;. Insistirá na apresentação de propostas e na tentativa de reforçar sua suposta capacidade de gestora. Não fará críticas aos adversários ao lançar o PAC 2. O trabalho de bater em Serra será realizado pelos petistas de São Paulo. Caberá a eles atacá-lo até a eleição. Para tanto, lançarão mão, por exemplo, das imagens do caos que tomou conta da capital no início deste ano. Além disso, ironizarão a propaganda oficial sobre a obra de rebaixamento da calha do rio Tietê. Orçada em R$ 1 bilhão, a obra reduziria, segundo os tucanos, de 50% para 1% o risco de inundação.
;Quem é oposição ao Serra(1) no estado fará uma campanha forte em cima das enchentes. Ele será chamado a se explicar;, diz um dos ministros mais próximos a Dilma. ;Esse assunto terá repercussão eleitoral e pode contaminar a previsão inicial deles;, acrescenta. O ministro se refere à esperança do PSDB de que Serra consiga uma larga vantagem de votos sobre Dilma em São Paulo. Se isso ocorrer, alegam os tucanos, o governador neutralizará a desvantagem que possivelmente terá nas regiões Norte e Nordeste. No sábado passado, Dilma apresentou uma prévia do discurso a ser entoado na queda de braço com o PSDB. Foi numa palestra na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, para cerca de 600 pessoas ; a maioria políticos.
;Nós temos clareza de que, no PAC 2(2), uma das linhas de investimento mais fortes é a questão da drenagem, porque não dá mais para as pessoas viverem com medo toda vez que chove, por causa dos alagamentos e daquelas cenas tristes e horríveis que vemos, como desabamentos, queda de encostas, água entrando nas casas. Não dá mais;, afirmou a ministra. O presidente Lula decidiu reforçar a promessa de investimentos para a prevenção de enchentes na virada do ano. Deu a ordem depois dos problemas registrados em Angra dos Reis (RJ), Santa Catarina e São Paulo.
Realidade
Há pelo menos um risco na estratégia do governo: a versão dos investimentos ser confrontada pelos fatos. Ou pelos números. No ano passado, Lula e Dilma lançaram um ;PAC da Drenagem;. Uma parte dos investimentos seria custeada com recursos do Orçamento Geral da União. O restante, via financiamentos da Caixa Econômica Federal. Foram selecionados 161 empreendimentos. Até agora, nenhuma obra saiu do papel, e R$ 4,2 bilhões estão parados à espera da conclusão de projetos e de licitações.
Segundo o último balanço apresentado pelo Comitê Gestor do PAC, 77% das ações que seriam feitas com recursos do Orçamento da União estão em fase preparatória ; ou seja, em desenvolvimento de projetos. O restante, 23%, está em fase de licitação. Todos os empreendimentos que serão viabilizados via financiamento ainda estão em fase de desenvolvimento de projetos. Por meio da assessoria de imprensa, o Ministério das Cidades afirmou que, como o PAC da Drenagem foi lançado no segundo semestre de 2009, é natural que os projetos não tenham saído da esfera burocrática.
A assessoria ressaltou que a elaboração de projetos demanda tempo e que, após a apresentação por estados e municípios, eles serão avaliados pelo governo federal antes de receber recursos. A responsabilidade pela paralisia, portanto, seria de governadores e prefeitos.
1 - Reação tucana
O governador José Serra ficou irritado ontem ao ser questionado sobre os problemas de falta de água na capital paulista. A pergunta foi feita por uma repórter da TV Brasil, criada pelo governo Lula. ;Espero que a TV Brasil tenha o mesmo interesse com cada estado e cada município.; Serra disse que não se sentia perseguido pela emissora, mas reclamou da atenção excessiva dada aos transtornos em São Paulo.
2 - Clima de despedida
Mantido o roteiro original, o PAC 2 será a última cerimônia de porte estrelada por Dilma Rousseff antes de trocar o ministério pela campanha presidencial. Uma das metas do programa será melhorar a qualidade de vida em bairros da periferia por meio de ações integradas de diversos ministérios. Também receberá atenção especial o transporte urbano.
Mínimo de R$ 560
>>Ullisses Campbell
São Paulo ; O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), resolveu vitaminar o salário mínimo em seu estado. Mudou os critérios para reajuste do valor regional em proposta enviada à Assembleia Legislativa. Levou em conta a variação do Produto Interno Bruto (PIB) paulista de 2007 a 2008, no lugar dos dados do PIB nacional. A economia paulista cresceu 6,9% no período; a brasileira, 4,7%. Assim, enquanto o governo federal elevou o salário de R$ 465 para R$ 510 (aumento de 9,6%), Serra expandiu de R$ 505 para R$ 560 (10,89%). O piso vale para 1,4 milhão de trabalhadores.
Para não dar margem de celebração ao governador, deputados estaduais da oposição já estão tirando uma lasquinha das tragédias naturais que assolam São Paulo. O deputado estadual André Diogo (PT), geólogo especializado em recursos hídricos, é o primeiro a apontar o dedo para Serra. ;Ele tem total responsabilidade porque foi ele quem trouxe de Brasília a atual secretária de Recursos Hídricos, Dilma Pena, uma burocrata e incompetente. Ela nunca viu uma bacia hidrográfica na vida;, critica.
Apesar de o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), ser aliado de Serra, ele é pouco citado nos debates da Assembleia Legislativa de São Paulo. ;As políticas de recursos hídricos são de responsabilidade do governo;, lembra a deputada petista Beth Sahão. Ela também aponta para Dilma Pena a maior parcela de culpa quando se fala em enchentes. O deputado Fernando Capez (PSDB) defende Serra com argumentos bíblicos. ;Choveu em São Paulo durante 47 dias seguidos. No Livro Sagrado, isso é tratado como dilúvio. Pôr a culpa no Serra é de um oportunismo barato sem precedentes;, dispara. O deputado diz ainda que, se o governo tem parcela de responsabilidade pelas tragédias naturais, o presidente do Egito tem culpa pela seca no deserto do Saara.
Para o geólogo Artur Tavares, da Universidade de Campinas, o excesso de chuva é de responsabilidade de governos, prefeituras e da população, que joga lixo pelas ruas. Mas também é culpa da natureza. ;Nunca choveu tanto em São Paulo como agora. Não dá para pôr a culpa em apenas uma pessoa;, ressalta. Ele explica que o solo de São Paulo continua encharcado e que as previsões apontam para mais chuvas pelo menos até março.