Ivan Iunes
postado em 22/03/2010 09:10
O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) e parlamentares favoráveis ao projeto que exige ficha limpa para candidatos a cargos eletivos pretende intensificar a pressão sobre o colégio de líderes da Câmara durante a semana. A intenção do grupo é colocar a proposta em votação logo depois do feriado de páscoa, na segunda semana de abril. Os líderes dos partidos têm reunião marcada com o presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP), amanhã. A ideia é definir um calendário de discussões sobre o projeto. A proposta foi sugerida por iniciativa popular e agrega 1,6 milhão de assinaturas. O forte apoio da sociedade esbarra em um Congresso Nacional pouco simpático a alterar as regras para inelegibilidade.Pouco mais de um mês desde a criação do grupo de trabalho para analisar o Projeto de Lei n; 518/09, o relator da proposta, deputado federal Índio da Costa (DEM-RJ), entregou o documento final a Temer na semana passada. O presidente da Câmara participou do ato público, com várias entidades sociais, mas mostrou reticências em conseguir votar o projeto no tempo solicitado pelo MCCE. ;Quero levar o projeto ao plenário para aprová-lo e não para desaprová-lo;, explicou Temer. Vários deputados no Congresso já se declararam oficialmente contrários à proposta que será encaminhada.
O projeto prevê a inelegibilidade de políticos condenados por órgãos colegiados em crimes graves, que vão de homicídio e tráfico até os delitos contra a administração pública. Veta, por oito anos, candidaturas de parlamentares que renunciarem ao cargo para fugir de processos de cassação. O relator do projeto admite que somente com o apoio dos dois maiores partidos da bancada governista, PT e PMDB, a proposta tem alguma chance de aprovação no plenário. ;Os dois são maioria na Casa e precisam se envolver. Se PT e PMDB não quiserem votar, é mais complicado;, reconhece Índio.
"Os dois são maioria na Casa e precisam se envolver. Se os dois principais partidos da bancada não quiserem votar, é mais complicado aprovar no plenário. O trabalho tem de ser, principalmente, com eles."
Índio da Costa, relator do projeto
Índio da Costa, relator do projeto
Entrevista - Índio da Costa
;Eu fiz minha parte, mas cada um fala por si;
A Presidência da Câmara não demonstrou otimismo em votar o projeto no início de abril, por conta de divergências dentro do colégio de líderes. Hoje, o projeto reúne apoio suficiente para ser votado em plenário?
Isso está nas mãos do PMDB e do governo. Os dois são maioria na Casa e precisam se envolver. Se os dois principais partidos da bancada não quiserem votar, é mais complicado aprovar no plenário. O trabalho tem de ser, principalmente, com eles. Eu fiz a minha parte, que foi oferecer um projeto moralizador, mas cada partido fala por si. Eu não vi reticências do presidente em votar a proposta. Há cautela, apenas. Acredito que ele (Temer) tenha intenção de votar o ficha limpa.
Alguns deputados com força na Casa, como o líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP), acreditam que o projeto afronta a Constituição. O grupo tem uma estratégia para dobrar essas resistências?
Como é que o Vaccarezza diz que é contra se nunca nem leu o projeto? Ao José Genoíno (PT-SP) se aplica o mesmo raciocínio. Ser contra sem ao menos ler na íntegra é adotar uma linha sem qualquer embasamento. A intenção desses parlamentares era de que o político só ficasse inelegível se fosse condenado por trânsito em julgado, mas isso acaba com o projeto, ele fica inócuo. Votarei contra o projeto, caso seja feita essa modificação.
Como votar uma proposta que atinge os interesses dos próprios deputados?
A única coisa que vai fazer esse projeto passar é a mobilização popular. A estratégia que nós vamos adotar é trazer os movimentos sociais para dentro do Congresso, especialmente depois do feriado da Páscoa. Primeiro, estamos esperando a manifestação do colégio de líderes, para depois organizarmos as mobilizações. A pressão joga a nosso favor.
Do projeto que chegou à Câmara, os deputados preferiram desconsiderar condenações em primeira instância como fator de inelegibilidade. Por quê?
É uma aberração uma pessoa denunciar a outra sem causa alguma e a consequência disso ser o denunciado não poder concorrer em uma campanha eleitoral. Bastaria Dilma Rousseff e José Serra denunciarem um ao outro e nenhum dos dois poderia ser candidato a presidente. Não é coerente. Já a modificação referente à primeira instância tem como intenção não deixar nas mãos de um juiz singular, com interesses políticos, o futuro do país. É preciso um colegiado para tomar uma decisão firme, embasada nos fatos, nas provas e na lei, e não com critérios políticos. Se mais tarde o interesse político se configurar no colegiado, pode-se processar os magistrados até por formação de quadrilha. O projeto é amplo e, por isso, é mais prudente que seja aplicado com base em decisões colegiadas. O órgão colegiado é, inclusive, a primeira instância em muitos casos. Deputado federal, senador, prefeito, governador, presidente, todos são julgados de forma colegiada já na primeira instância.
O projeto não discute o foro privilegiado, mas para deputados e senadores o órgão colegiado é o STF, que jamais condenou um político. O foro também não precisa ser discutido?
Os tribunais precisam acelerar os julgamentos. Eu posso fazer a lei, mas o Supremo precisa acelerar seus procedimentos. Quanto ao foro privilegiado, antes de discutir o tema, precisamos melhorar a qualidade do Congresso. Em um parlamento abarrotado de políticos com processos, como aprovar uma modificação nos limites do foro privilegiado? É impossível. O ideal é que ele só se aplicasse em casos de discursos, opinião, palavra, voz e ideias. Na prática, não é assim que ele funciona hoje.